MP-SP anuncia: é iminente a derrota da facção PCC

O eficiente cerco à facção Primeiro Comando da Capital, por parte do Ministério Público de São Paulo e do GAECO, abalou as estruturas e a liderança da facção paulista.

Se quiser assumir meu lugar, toma que o filho é teu!

E no princípio eram trevas, no início do início, e é para lá que eu te levarei, para que você possa me entender, não só a mim, mas também a Aline, e a Lincoln Gakya e seus colegas do MP-SP.

Você deve saber de onde nós viemos e o que já superamos, para só então decidir o que você vai fazer. E se você ou o Lincoln e seus colegas quiserem pegar meu lugar, boa sorte, vai firme e vamos ver se vão aguentar.

Não adianta se esconder ou tapar os ouvidos, pois os espíritos das trevas não se calarão até que eu, agora, ou alguém, algum dia, lhe conte essa história. E se já for tarde, e se eu já tiver me juntado a eles nas trevas, só lamento por você e por Lincoln e seus colegas.

Você acha que sabe o que é sofrer, mas poucos viveram nas quebradas trabalhando, de sol a sol, para chegar ao dia do pagamento e virem todo seu suor roubado, ao entrar na favela ou no bairro, pelo moleque da rua de baixo, para pagar o arrego para o policial do tático…

… ou para ser vendido assim que ia para dentro da muralha, para ser usado por um outro preso ou carcereiro como achassem melhor — geralmente sendo estuprados, ou obrigando seus familiares a se arriscarem para levar drogas e objetos para dentro das trancas, ou terem que entregar suas mães e irmãs para o prazer sexual de outros presos, ou servindo de garagem (não vou explicar)…

O site eb.mil.br replica uma reportagem de Aline Ribeiro para O Globo e me obriga a vir até você para lhe levar a esse passado, para que você, por si mesmo, possa vislumbrar o futuro que, assim como eu, Aline e Lincoln e seus colegas já estamos vislumbrando.

Onde citei neste site a pacificação → ۞

Alguém pode temer o fim do PCC?

Meu pai vivia me advertindo: “tome cuidado com o que você deseja. Você pode acabar por conseguir” .

Os pais de Lincoln e de seus colegas do MP-SP deveriam ter dado o mesmo conselho a eles, pois agora que estão perto de realizar o sonho impossível de acabar com o PCC, parece que começam a ver que talvez tivesse sido melhor ter tido outro desejo. Agora é tarde:

“A ruptura é inevitável. É o início do fim de uma era – diz o promotor Lincoln Gakiya, do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado de Presidente Prudente.” Quatrocentos integrantes da facção fora da cadeia, farão o possível para “tirar o câncer da nossa família” que “não pensa no coletivo e só quer ostentar enquanto os irmãos passam fome em outros estados”.

Lincoln e seus colegas derrotaram a Hidra de Lerna, cortando sua cabeça Uh, Uh!!!

O titular da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, Lourival Gomes, lembra que sempre “vão surgir” outras pessoas para assumirem as funções, mas ressalta: “Estaremos aqui para combater“...

… e Martinho Luthero na véspera de sua morte, tomou em sua mão um giz e escreveu na parede, “em vida fui tua peste, morto, serei tua morte” referindo-se ao Primeiro Comando da Capital, ou não.

Aline, eu, Lincoln e seus colegas nos lembramos de como eram as trevas antes que Marcos Willians Herbas Camacho e sua equipe assumissem o patriarcado da Família 1533. Se você não se lembra, vou pedir para Deiziane lhe contar um pouco de como era…

Onde citei neste site o promotor de Justiça Lincoln Gakiya → ۞

A pacificação do PCC na Modernidade Líquida

E no princípio eram trevas, no início do início, antes que a paz chegasse à comunidade do Serviluz em Fortaleza com os acordos firmados entre as gangues de jovens locais, como ela narra após dezenas de entrevistas com moradores e pessoas que atuam na região.

Deiziane Pinheiro Aguiar apresentou suas conclusões ao Programa de Pós-graduação em Sociologia da Universidade Federal do Ceará: Marcado para Morrer: moralidades e socialidades das crianças na comunidade do Serviluz.

Se você realmente quer a paz, deve saber de onde nós viemos e o que nós já superamos, para só então decidir o caminho que deve tomar, e não fazer como o Governo cearense, que creditou a baixa da taxa de homicídios a suas políticas de segurança pública.

Você pode concordar ou não com a realidade, mas ela continuará prevalecendo sobre sua opinião, e Deiziane a analisou e previu o fim desse equilíbrio e da pacificação. muito antes que os governantes cearenses, Aline, eu e Lincoln e seus colegas o fizéssemos.

Onde citei outras produções das universidades federais neste site → ۞

O amigo e o inimigo moram ao lado

O deputado Ferreira Aragão concorda com Deiziane quanto à influência que as organizações criminosas têm dentro da comunidade:

“No bairro de Serviluz, quando alguém é morto, não se recorre mais à Polícia ou à Justiça.’É o chefe da gang que é buscado para resolver o crime. E vão lá fazer justiça com as próprias mãos’”.

Poucos garotos que vivem naquela comunidade ouviram falar em Zygmunt Bauman, mas Deiziane afirma que o sociólogo e filósofo polonês descreveu com perfeição o que se passa pela mente dos meninos do mundo do crime:

“Existem amigos e inimigos. […] Amigos e inimigos colocam-se em oposição uns aos outros. Os primeiros são o que os segundos não são e vice-versa. Isso, no entanto, não é testemunho de sua igualdade. […] Os inimigos são o que os amigos não são. Os inimigos são amigos falhados; eles são a selvageria que viola a domesticidade dos amigos, a ausência que é uma negação da presença dos amigos. O avesso e assustador “lá fora” dos inimigos é, […] “aqui dentro” dos amigos. […] A oposição entre amigos e inimigos separa a verdade da falsidade, o bem do mal, a beleza da feiura […] o próprio do impróprio, o certo e o errado […].”

Os garotos podem não ter as palavras bonitas de Bauman, porém sabem que quem não corre pelo lado certo do lado errado da vida, é o inimigo. Mas quem traça esses limites, determina a pacificação e decreta a guerra?

O que falei neste site sobre o Ceará → ۞

Os limites da paz são bem definidos

Deiziane conta que dois meses após uma chacina na Estiva, a “paz” foi estabelecida com a Favela, mas antes disto algumas mortes antecederam o evento de pacificação. A execução de um jovem envolvido com o tráfico local na esquina da Favela por um grupo da Estiva levou ao “acordo de paz”:

  1. Paz da Estiva com a Favela;
  2. Paz de todos os segmentos com a Pracinha;
  3. Paz com a Rua do Bagulho; e
  4. Paz com a rua São Sebastião, a única que havia sobrado como inimiga.

Na rua São Sebastião moravam numa casa cinco jovens envolvidos com o crime que estavam confinados, não poderiam sair pois, se o fizessem, seriam executados pelas facções inimigas.

Um desses jovens estava com uma tornozeleira eletrônica. Essa situação gerava uma zona de tensionamento na vizinhança, pois, como todos outros segmentos haviam acordado a paz, a qualquer momento um confrontamento poderia emergir nessa rua, ou por parte dos jovens envolvidos no crime ou pela polícia. Após a intervenção de algumas lideranças e vizinhos, os jovens que moravam nessa casa resolveram aceitar a “paz” e um alívio foi instaurado na rua.

Deiziane descreveu com detalhes como foi feito por lá a divisão de áreas, e eu acompanhei uma situação semelhante aqui em São Paulo, no bairro Jardim Morada do Sol, só mudava os nomes das ruas e dos garotos, mas o mesmo padrão.

Então quem traçou esses limites, determinou a pacificação?

Onde citei outros sociólogos neste site → ۞

O Ceará pode ser aqui

Há poucas semanas, fui à Indaiatuba gravar uma entrevista. A cidade tem uma taxa de homicídios de 0,86 para cada cem mil habitantes – muito diferente do Ceará, com seus 52 para cada cem mil – e, se não bastasse isso, está entre as 80 com maior IDH do país.

Há alguns anos, em um dos meus primeiros estudos a respeito da facção, conheci o bairro Jardim Morada do Sol, hoje com 70 mil habitantes, e que, na época, vivia em clima de incertezas: assaltos, furtos em residências, estupros e guerra de gangues.

Haviam três biqueiras principais que disputavam entre si os limites de atuação, e os garotos, para se garantir, andavam armados em plena luz do dia. Lembre-se que não estou falando do Serviluz no Ceará, e sim do bairro da hoje pacata e progressista cidade paulista.

A ordem para a paz e os limites de cada grupo foram definidos por acordos fechados dentro das muralhas da Penitenciária de Hortolândia, que determinou, inclusive, pena para os crimes cometidos contra a população próxima às biqueiras.

Mas quem traça esses limites, determina a pacificação e decreta a guerra?

A vitória dos moderados e o controle das bases

E no princípio eram trevas, no início do início, antes que a paz chegasse às diversas cidades e estados sob a hegemonia do Primeiro Comando da Capital, que sob o controle dos moderados mantém a pacificação e o controle da base.

As mortes de Rogério Geremias Simone, o Gegê do Mangue, Edilson Borges Nogueira, o Birosca, Fabiano Alves de Souza, o Paca, Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro, entre outros, comprovam algo que ouvi há alguns anos de um faccionário:

“Eles estão mais seguros lá dentro que na rua. Se sairem morrem.”

A admiração dos garotos do grupo criminoso, pelo Marcola, não foi arranhada pela revelação do colega de Lincoln, o promotor de Justiça Marcio Sergio Christino, que acusou o líder máximo da facção de ter sido um informante da polícia e ter entregue outros PCCs .

No entanto, as rígidas regras impostas pelo grupo liderado por Marcola justificam a indignação, principalmente nos níveis intermediários da organização, que se sente tolhida ao não poder armar as biqueiras para reagir às ações policiais, entre outras limitações.

O Marcola era homicida, sequestrador, roubava banco, não tinha nada a ver com a facção, mas é um homem articulado. E quando ele foi levado para o presídio de Tremembé [no interior de SP] começa a conversar com os últimos presos políticos no sistema prisional e aprende com eles sobre como estruturar o tráfico, a gerenciar como uma empresa, ao mesmo tempo em que vende internamente para os detentos a ideia de uma irmandade revolucionária.

desembargadora Ivana David

No entanto, o lucro muitas vezes fala mais alto, um piloto de helicóptero da facção recebe 400 Reais por quilograma de pasta base de cocaína transportada e 3% do dinheiro, chegando a ganhar 200 mil Reais em um único voo.

Cabelo Duro que chefiava o esquema na Baixada Santista, chegava a lucrar 450 milhões de Reais todo o ano, mas mesmo com toda essa grana e poder, depois das mortes de Gegê e de Paca, ele percebeu que o próximo a ser morto pela facção.

Não deu outra. Integrantes sequestraram Nado que era de toda confiança de Cabelo Duro, desbloquearam o celular dele e usaram para chama-lo para o flat do Tatuapé, onde armaram uma casinha: Cabelo Duro foi metralhado e fala-se que nesse mesmo dia Nado foi decapitado e enterrado em região de favela.

O mundo dá voltas, Gegê e Paca foram mortos por Cabelo Duro, Cabelo Duro foi morto por Galo, Galo foi fuzilado na Zona Leste de São Paulo… — Luís Adorno para o R7

A vitória de Lincoln e seus colegas e o fim dos moderados

A disputa para ampliação de limites territoriais, influência ou poder acontece em todos os grupos sociais, seja entre as crianças nas creches ou nas ruas, ou entre os adultos nas igrejas, nos locais de trabalho, nas biqueiras, e até mesmo dentro das viaturas policiais.

Entre os membros de facções que disputam o mesmo território e dentro das organizações criminosas isso não poderia ser diferente, essa é uma característica humana.

Há quem prefira não se arriscar e deixar a luta para outros: esses são os cordeiros, que servem de alimento na cadeia alimentar e mantêm nossa estrutura social funcionando com certa estabilidade, como nos ensinou Étienne de La Boétie em sua obra Discurso da Servidão Voluntária.

Mas entre os faccionados não existem cordeiros. O mais pacífico é um alfa que tem seu domínio territorial garantido por sua força — não há amigos dentre os irmãos, companheiro e aliados, há o respeito pelo mais forte e pelo grupo — como acontece em qualquer alcatéia.

Lincoln e seus colegas estão agora a um passo da vitória. As ações do MP-SP e do GAECO enfraqueceram o grupo dos Catorze alfas que lideram a facção, e é por essa razão que Lincoln acredita que o PCC se desintegrará nas guerras internas.

Onde citei o GAECO neste site → ۞

E no final serão as trevas, no fim do fim

A liderança enfraquecida terá que disputar o poder dentro das muralhas de Presidente Prudente, e de lá essa guerra vai se espalhar para o restante do estado.

Enquanto isso, centenas de pequenas facções sem estrutura aterrorizarão os bairros periféricos de vários estados, que hoje já estão pacificados, e várias regiões seguirão o destino dos morros cariocas, com grupos de milicianos disputando o tráfico.

As periferias das cidades paulistas, os cortiços, as ocupações e as biqueiras próximas aos centros das cidades, sem garantias e ordem, vão se armar para garantir suas bases comerciais de tráfico de drogas.

As viaturas policiais, que hoje abordam os cidadãos com certa tranquilidade, pois quase todas as biqueiras paulistas atuam desarmadas, voltarão a enfrentar grupos armados, e a morte de policiais será liberada (hoje é necessária autorização e é quase impossível conseguir).

“Acho que elas são piores do que as facções. No caso da facção fica muito claro quem é o bandido e quem o mocinho, a milícia transita entre o Estado e o crime, o que é bem pior.”

desembargadora Ivana David

Vencemos o Crime Organizado – Uh, uh!!!

Entregaremos para aqueles que nasceram após a década de 1990 uma São Paulo e um Brasil como eles nunca viram, livre da hegemonia da facção Primeiro Comando da Capital!

Só não entendo por que não senti a empolgação que esse momento merecia por parte da repórter Aline Ribeiro e do promotor de Justiça Lincoln e seus colegas, afinal, vencemos – Uh, uh?

Se eu colocasse essa manchete estava preso

PCC a facção que não para de crescer
Isto É  → Vicente Vilardaga e Fernando Lavieri
→ São Paulo
→ Organização Criminosa
No dia seguinte que eu postasse um artigo com essa chamada seria levado para prestar depoimento e responder por apologia ao crime, então é melhor lerem a reportagem na fonte (desculpe se me rio: kkkk).

PCC e Caminhoneiros — SALVE FALSO

Não procede a mensagem onde o PCC estaria apoiando o movimento dos caminhoneiros.

Está correndo nas redes sociais um suposto Salve da facção Primeiro Comando da Capital, PCC 1533, constando a assinatura do Geral dos Estados e Países, onde estaria conclamando os membros da facção à botar terror como apoio à greve dos caminhoneiros.


A facção paulista não se envolve em questões políticas — sua luta é contra a opressão do Sistema Carcerário.

Todo ato de terrorismo e vandalismo é repudiado pela facção por prejudicar a população.

O movimento dos caminhoneiros é uma manifestação legítima de indignação contra os abusos cometido pelo governo, e está tendo apoio público.

Cabe ao governo resolver essa questão que eles mesmos criaram, no entanto aqueles que se encontram dentro do Sistema Prisional, não podem ser ainda mais sacrificados do que já são.

Se alguém quer usar o Primeiro Comando da Capital como desculpa para o uso da força contra os caminhoneiros, deve procurar outro culpado.

Bem, foi mais ou menos isso, só que com outras palavras que afirmou o Geral do MGI —em caso de dúvida o membro da facão deve sempre procurar o salveiro ou o sintonia para não ser chamado para dar explicações por infração prevista no Dicionário:

4. Atitude isolada:
Fica caracterizada quando um integrante ou companheiro age sem buscar a Sintonia ou responsável pela quebrada, sendo agressão, morto, ou algo que venha a prejudicar alguém ou denegrir a imagem do Comando.
Punição: 90 dias quando de natureza leve ou cobrança com análise da Sintonia.

33. Mau exemplo:
Fica caracterizado quando o integrante foge do que rege a nossa disciplina, não passando uma imagem nítida da organização, quando se coloca como faccionário diante da massa, desrespeitando e agindo totalmente oposto ao que é pregado pela facção.
Punição: exclusão e fica sendo analisado pela irmandade local e pela Sintonia.

O que falei sobre a cobrança neste site → ۞

Cenas de vandalismo em alguns pontos do país

O tenente-coronel Otávio Manoel Ferreira Filho informa que o setor de inteligência da Polícia Militar não encontrou indícios sobre a participação do Primeiro Comando da Capital nas ações violentas cujas imagens estão circulando pela internet.

FALSO COMICADO GERAL PCC
👇🏽. 25/05/2018
Nois da sintonia geral viemos através deste comunicado deixar claro que vamos entrar na luta pelo Brasil ,pelo povo brasileiro ,não vamos admitir esse governo corrupto brincar com a cara de nossas famílias de nosso povo ,lutamos pela igualdade ,pela paz ,mais chegou o momento de não ficar mais qeto de braços cruzados apartir de hoje o pcc primeiro comando da capital entrará nessa guerra contra o governo em apoio aos camiioneiros e a toda nação brasileira a sintonia geral dos estados e países deixa bem claro que a guerra vai começar ,nossos irmãos e compenheiros já estão sofrendo as consequências dessa grevi justa e por estar do lado do povo entraremos na guerra ,nossa luta e contra esse estado falido é corrupto ,atenção população vamos deixar bem claro para todos que qen estiver desfilando de carro na rua sofrerá as consequências ,estamos em apoio aos camiioneiros ,não é justo eles estar passando fome nas beiras de estradas ,enquanto o resto do povo fica brigando pra abastecer seus carros com gasolina cara ,outra entra na guerra a favor dos camiioneiros ou nun sai de casa o negócio é o seguinte vamos mandar taca fogo geral em tudo qe e do governo ,vamos colocar fogos em postos de gasolina ,en tudo qe não aderir nossa causa apartir de hoje será um por todos e todos por um e para quebrar geral vamos jogar o estado no chão repassem pra geral pra todos irmão e companheiros e população da rua e sistema repassem para todos os grupos vamos ajudar para o Brasil .
Ass sintonia geral dos estados e países

Rícard Wagner Rizzi

O Primeiro Comando da Capital aceita gays? LGBTPCC

A organização criminosa paulista Primeiro Comando da Capital PCC não aceitava o comportamento homossexual em suas fileiras, isso mudou, mas só um pouco.

Afinal um irmão PCC pode ou não assumir a homosexualidade?

Não passa uma semana sem que me perguntem sobre a visão de dentro da facção paulista Primeiro Comando da Capital (PCC 1533) sobre a questão dos homosexuais. Sim, homossexuais ou bichas, se bem que, talvez, o politicamente correto fosse LGBTQIA+, mas os PCCs não se preocupam com o politicamente correto.

Ao contrário do que afirmam por aí, o Estatuto do PCC não proíbe homosexuais:

“6 Item: O comando não admite entre seus integrantes, estupradores, pedófilos, caguetas, aqueles que extorquem, invejam, e caluniam, e os que não respeitam a ética do crime.”

Meninas e meninos, não joguem as purpurinas ainda.

O comportamento dos membros da facção é especificado no Dicionário do PCC 1533, que é como o Regimento Disciplinar de uma organização militar, e lá o buraco fica mais em baixo:

“33. Mau exemplo: Fica caracterizado quando o integrante foge do que rege a nossa disciplina, não passando uma imagem nítida da organização, quando não se coloca como faccionário diante da massa, desrespeitando e agindo totalmente oposto ao que é pregado pela facção.
36. Pederastia: Se caracteriza quando se pratica sexo com pessoas do mesmo sexo, difere do homossexualismo porque o praticante é ativo somente e não passivo.”

Não vou discutir sobre o que está escrito. Caso alguém discorde da redação, faz favor de reclamar com o dono da porcada: Rodovia Raposo Tavares, km 586. Chegando lá, diga para o ASPEN que quer falar com o Marcola, e, se der, ele atende.

O Marcola era homicida, sequestrador, roubava banco, não tinha nada a ver com a facção, mas é um homem articulado. E quando ele foi levado para o presídio de Tremembé [no interior de SP] começa a conversar com os últimos presos políticos no sistema prisional e aprende com eles sobre como estruturar o tráfico, a gerenciar como uma empresa, ao mesmo tempo em que vende internamente para os detentos a ideia de uma irmandade revolucionária.

desembargadora Ivana David

Em um passado não muito distante…

Gays eram hostilizados nas trancas. Humilhados, não podiam dividir colheres e copos com os demais — o que aqui fora não é nada, mas lá é um problemão — só podiam tomar banho quando não tivesse mais ninguém, e também não podiam puxar conversa no pátio.

A situação ficava cabulosa dentro das celas, pois eles não podiam coabitar com os outros — se o complexo era grande, havia celas só para as “monas”, mas, se eram poucos, o homossexual pedia transferência da unidade, e era melhor se conseguisse.

Meninas e meninos, podem jogar as purpurinas agora, uh uh!!!

Conta a lenda que, certo dia, o Primeiro Comando da Capital preparou uma fuga espetacular, daquelas que só ele tem capacidade de organizar, mas a informação vazou, e a administração e o governo iriam pegar todos enquanto tentavam fugir.

Ia se repetir o caso da Castelinho, onde um ônibus que estava indo para uma operação de resgate em um presídio recebeu mais de 700 tiros e 12 PCCs foram mortos.

Adivinha quem descobriu o vazamento e alertou os PCCs? Pois é, uma “mona”. Como agradecimento pelas vidas salvas o Primeiro emitiu um salve suavizando para as meninas. Se é verdade essa história, eu não sei. O que eu sei, e pode ser visto hoje dentro das trancas dominadas pela facção paulista, é a vigência do salve:

“Os homosexuais devem ser respeitados dentro do sistema, mas devem manter a disciplina e discrição.”

Nem todos os esforços de todas as associações de direitos individuais e de diversidade conseguiram juntas o que aquela “mona” conseguiu sozinha, o respeito em todo o Sistema, e quem descumpri a norma pode ser chamado para conversar.

“Vi com esses olhos que a terra há de comer” (eh eh, sempre quis usar essa frase):

Em um semiaberto, havia um casal de prisioneiros, e todos na unidade sabiam que eles tinham um relacionamento. Sempre andavam lado a lado, e um deles, efeminado com cabelos compridos, nunca falou com ninguém lá dentro; já o outro era o estereótipo do ladrão perigoso, e demonstrava claramente ciúmes quando alguém olhava para o companheiro dele.

Eles não se tocavam e sempre mantendo a postura.

Só conversavam, não dormiam juntos, sempre guardando a regra de discrição e respeito, mas, também, sempre foram respeitados por todos. O dia de visita é sagrado e, para não ter a mínima possibilidade de haver um constrangimento, eles ficavam conversando em um canto do pátio.

Os politicamente corretos que me perdoem… Ou melhor, não, se revoltem… E vão protestar com faixas, cartazes, e em frente a sede da Organização Criminosa ou na biqueira do seu bairro, mas a facção começou a controlar as condutas homosexuais nas prisões para acabar com a escravidão sexual dentro dos presídios, cuja prática era uma constante.

Para os ambientes dominados pelo PCC onde a masturbação e a ereção sob a calça são severamente punidas, vale a advertência de Freud: um ambiente que reprime o libido “produz uma necessidade de descarga, a fim de reduzir a tensão”.

Quanto às mulheres, sempre foi mais suave, mas aí será outra história.

A Umbanda, o Candomblé, e a facção paulista PCC

A agressão sofrida por um pai de santo e uma mãe de santo no Rio de Janeiro levanta dúvidas sobre conduta das facções criminosas quanto ao respeito às religiões afro-brasileiras.

O avanço dos grupos neopentecostais na facção PCC

O mundo do crime não está tão distante de nós como imaginamos. O avanço dos grupos neopentecostais teve força para influir na eleição presidencial, portanto, não deixaria influenciar a vida dentro dos presídios e nas quebradas.

No Rio de Janeiro, essa mudança se torna evidente aliados quando parceiros do Primeiro Comando da Capital como o Terceiro Comando Puro (TCP) e o Complexo de Israel:

Pouco tempo depois, o primeiro grupo narcopentecostal conhecido foi fundado como uma subfacção do Terceiro Comando Puro: o Bonde de Jesus. Além de controlar o tráfico no bairro do Parque Paulista no Estado de Rio de Janeiro, os Soldados de Jesus atacaram e vandalizaram vários templos de Candomblé e de Umbanda, expulsando os sacerdotes dos seus territórios. Desde então, a perseguição não só das religiões afro-brasileiras, mas também de padres católicos, tem sido relatada em várias favelas dominadas pelo Terceiro Comando Puro.

A reportagem é de Kristina Hinz, Doriam Borges, Aline Coutinho e Thiago Cury Andries, publicada por Open Democracy

Muito diferente do que acontecia há 30 ou 40 anos quando traficantes não apenas convivia pacificamente com pais e mães de santo, como participavam das sessões — o Brasil mudou muito em pouco tempo

Tanto dentro dos presídios quanto nas quebradas, a influência dos pastores é notada há muito, mas assim como o fez no governo federal, também passou a ditar regras morais e de costumes.

Abaixo, eu mantenho um texto que escrevi em tempos idos, mas que ainda vale para São Paulo, mas não sei por quanto tempo.

Família 1533 — uma organização conservadora

Talvez, você possa me entender, mesmo que não faça parte de nenhuma organização criminosa. É difícil explicar uma sensação, mas se você já esteve em um estádio lotado em uma final de campeonato, você já sentiu algo parecido com o que se sente quando se está num pátio de uma penitenciária com dezenas ou centenas de homens a gritar:

“Se Deus é por nós, quem será contra nós? Por que Ele é justo!” – a lembrança me arrepia até hoje.

A socióloga Camila Nunes Dias afirmou que a facção paulista é conservadora e homofóbica, e esse é um dos casos no qual uma verdade esconde uma acusação falsa.

A também socióloga Carla Cristina Garcia demonstrou que não é a facção que é conservadora e homofóbica, mas sim a sociedade brasileira. Isso mesmo: eu, você e as duas também estamos incluídos.

Claro que eu não sou, e nem você é; só os outros que não estão me lendo são.

Onde citei neste site Camila Nunes Dias → ۞

Destruindo o centro de Umbanda e Candomblé

Há alguns dias um vídeo circulou com a chamada “PCC destrói templo de Candomblé”, só que ele mostra membros do Terceiro Comando Puro (TCP) do Morro do Dendê, no Rio de Janeiro, e não do Primeiro Comando da Capital (PCC). As facções são aliadas, mas o grupo paulista não tem influência na conduta do grupo carioca — são independentes.

Vou explicar um pouco a ojeriza que existe hoje na Família 1533 com esse negócio de Candomblé e Umbanda, pois nem sempre a situação foi tensa:

No passado, houve uma facção criminosa chamada Seita Satânica SS. Os caras eram cabulosos e sanguinários. Para se ter uma ideia, para ser batizado, o próprio cara tinha que cortar um pedaço da ponta do dedo e tomar o sangue.

Tortura e morte de PCCs e SSs ocorreram dentro dos presídios até que, por volta de 2002, esse grupo foi eliminado.

Os restos desta disputa se somaram ao preconceito enraizado de todo brasileiro. Claro que nem eu, e nem você temos preconceito enraizado; só os outros que não estão me lendo tem.

Onde citei neste site o Terceiro Comando Puro → ۞

Uma lei dentro e outra fora das trancas

Se alguém chega dentro de uma tranca paulista com ideias das religiões afro, essa pessoa é convidada de boa a guardar sua fé para si. O Primeiro Comando tem como regra básica não se meter com a vida de ninguém, mas impõe regras para o espaço comum.

Agora, para ver o bagulho ficar louco na tranca é só encontrar um cigarro de pé, atrás da porta da cela, mas nas comunidades fora das muralhas, a ordem é a da tolerância religiosa.

A paz, próximo às biqueiras, deve imperar para que a polícia não seja chamada e o fluxo continue constante e seguro. Se um templo, seja ele qual for, começar atrair viaturas para a comunidade, ele também será convidado a se retirar, mas só depois disso ser discutido dentro da sintonia e de chegarem a um acordo, se não…

Há alguns anos, um membro do PCC que dominava um bairro fechou uma igreja evangélica que ficava perto da sua biqueira. Agora, ele descansa em paz, sem se preocupar mais com os irmãos orando, sem se preocupar com mais nada, pois agiu por conta própria, sem consentimento da hierarquia do partido, e foi cobrado: ele morreu, e a igreja voltou.

Onde citei neste site o Sistema Carcerário → ۞

Não se pode confundir os SSs com as religiões afro

A Seita Satânica e aqueles que pregam o satanismo de qualquer maneira não são aceitos pelos membros do Primeiro Comando da Capital — as seções de autoflagelação e as formas de tortura a que são levados os que vivem nas trancas dos SSs são inarráveis.

Presidiário seita satânica SS Bauru

Mas o que é certo, é que nas ruas, os os pais e mães de santos as vezes são protegidos pelos membros da facção, como me conta um babalorixá aqui da zona norte da cidade:

“… alguns até participam dos cultos, mas são poucos. Aqui, quase na esquina tem uma biqueira, eles cuidam das vidas deles e nós da nossa. É só agente não atrapalhar eles que está tudo bem — nos dias de movimento no terreiro eles não deixam ninguém mexer nos carros e com as pessoas que frequentam o Centro.”

Todos somos membros da mesma sociedade

O mesmo se daria se o disciplina ou o sintonia da cidade tivesse recebido uma reclamação por parte de um pai de santo, pastor, padre…

Talvez, você possa me entender, mesmo que não faça parte de nenhuma organização criminosa, pois fazemos parte da mesma sociedade e temos a mesma base cultural. É difícil explicar uma sensação, mas sentimos de maneira parecida.

Quando apontamos o dedo acusador para os lados, estamos apontando-o para nós mesmos — claro que nem eu, e nem você apontamos; só os outros que não estão me lendo apontam.

Quando garoto, participei certo tempo da Umbanda em Pirituba. Larguei, mas trago comigo as porradas e os esculachos dados pelos policiais, assim como o preconceito da sociedade. Agora vêm os dois grupos apontar o dedo, se arvorando como defensores das religiões afro: menos, menos, muito menos.

O Primeiro Comando da Capital representa a sociedade brasileira, só não se esconde atrás das suas máscaras, e tenho certeza de que você já sentiu algo parecido com o que eles sentem quando estão num pátio de uma penitenciária, arrepiados, a orar e gritar:

“Se Deus é por nós, quem será contra nós? Por que Ele é justo!”

Claro que eu, e você somos tudo de bom; até mesmo os outros que não estão me lendo, mas os PCCs, esses não estão nem aí com o que eu, você, e os outros pensam a respeito deles, mas tem clareza na sua conduta, pois alegam com orgulho de ser: “O lado cerdo, do lado errado da vida”.

Ah! Ia me esquecendo de dizer que Luiz Roberto me avisou que agora a mãe-de-santo que foi agredida está pedindo asilo na Suíça e quer deixar o Brasil.

Onde citei neste site o Sistema Carcerário → ۞

A imprensa e o Primer Comando de la Capital

A facção PCC nos países de língua espanhola é apresentada de quatro maneiras: reportagens especiais, bandeira política, varejo policial e citações ocasionais.

Bordoada seca em mim, que não deveria merecer

Ninguém sente mais pena que eu sinto de você, que padece lendo este artigo. Ninguém sofre mais do que eu sofro ao perceber que, por algum infortúnio, você acabou neste palavreiro tedioso. Por isso peço a você que leia apenas o próximo parágrafo e deixe este site…

É mais ou menos assim que em 1920, Rui Barbosa começa seu discurso de 37 páginas intitulado A imprensa e o dever da verdade, cuja estrutura utilizo por culpa de Valeria e de Márcio, que chamaram minha atenção para o tema: a verdade da imprensa e o PCC.

Perceba, não é de meu gosto dar canseira, escrevendo palavras vãs, quando se poderia chegar diretamente ao ponto, mas só assim posso apresentar como se deve o artigo El grupo más temido de Brasil ya aspira a controlar el narcotráfico de América Latina.

A repórter Valeria Saccone me colocou entre o cutelo e a parede com a publicação desse artigo no periódico espanhol El Confidencial. Senti como se minhas posses fossem-me retiradas de súbito por salteadores. Ela, com poucas palavras, humilhou-me e calou-me.

O que falei neste site sobre a imprensa → ۞

Uma visão clara e abalizada sobre a facção PCC

Valéria contou a história do PCC de forma que alguém que nunca ouviu falar da organização criminosa pudesse entender, e, ao mesmo tempo, fez uma análise profunda sobre sua atual situação e o seu impacto em todo o mundo.

Ela me humilhou e me calou com uma bordoada seca que eu não merecia ao mostrar como se pode fazer uma matéria jornalística de qualidade, levando não apenas a informação ao leitor, mas também lhe proporcionando prazer na leitura.

Foi por conta do artigo de Valéria, que se espalhou como fogo na palha por diversos sites latino-americanos e asiáticos, que parei para reparar nas diferenças entre as notícias transmitidas sobre o Primeiro Comando da Capital nas diversas nações.

Para isso, pedi ajuda aos universitários, e quem me socorreu foi Márcio Barbosa Norberto, com a tese Olhar para a fronteira: o fazer jornalístico em Laz Voz de Cataratas, Gazeta Diário de Foz do Iguaçu, e Vanguardia.

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Quem tem telhado de vidro…

Brasileiros viralizaram memes e comentários xenófobos quando se noticiou que refugiados sírios viriam para o país, outros, seguindo a mesma linha, exigiram que a fronteira com a Venezuela fosse fechada para evitar a entrada de integrantes das FARC (isso mesmo, das FARC!).

Márcio nos conta que o periódico paraguaio Vanguardia utilizou 21% de seu espaço falando sobre comércio, arte e cultura, saúde, cidadania, migração, infraestrutura e política, e 79% sobre controle de fronteiras, tráfico de drogas, contrabando, crime e organizações criminosas…

“… criando representações estereotipadas acerca do brasileiro de modo geral. Ao se referir ‘el extrangero’ o portal indica que o suposto membro do PCC não faz parte da nação paraguaia [… e] a imagem que se cria do brasileiro é a de traficante, criminoso, entre outras marcas que carregam este sentido.”

O preconceito alheio é tão bem fundado quanto o nosso, e não se pode culpar a facção por ter atravessado a fronteira, afinal, foi uma decisão nossa esconder o problema até que ele se tornou tão grande que não pôde mais ser oculto sob a peneira.

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A imprensa esconde o verdadeiro inimigo

Márcio conta que a imprensa paraguaia trata com naturalidade a corrupção e a ação das organizações criminosas — essa representação do discurso jornalístico reforça o imaginário popular e busca ofuscar o real inimigo, ao que Rui Barbosa resumiria mais ou menos assim:

Vede, senhores, vede se não é a clandestinidade, a hipocrisia, a mentira o que eles querem. A culpa do Primeiro Comando da Capital está mais em desnudar uma praga pública, de cuja existência todos sabem, todos se lastimam, todos se aterram, mas na qual poucos ousam pôr a boca.

Quem há de encarar aqueles que dispõe da vida e da morte, dando ou tirando a honra, erigindo ou demolindo reputações, convertendo a santidade em corrupção e a corrupção em santidade? Acusemos os estrangeiros ou acusemos os criminosos de sempre.

A imprensa acompanha o que se passa perto e o que se passa longe, enxerga os que tramam, sonegam e roubam a nação e a sociedade, mas se acautela e aponta dedos acusatórios em outra direção, sem ver o verdadeiro mal se vive, e essa é a condição em que vivemos.

Ninguém sente mais pena que eu sinto de você que, por algum infortúnio, acabou tendo que trabalhar para os grandes meios de comunicação, que são obrigados a fazer coro aos discursos dos governos, das empresas e dos políticos que ditam a linha editorial.

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A imprensa paraguaia e o Primer Comando Capital

O Paraguai é a principal base de operações da facção paulista fora do Brasil — milhares de brasileiros e paraguaios trabalham, direta ou indiretamente, para a facção nas mais diversas áreas de mercado — legal e criminoso, formal ou informal — e como agentes públicos.

Toneladas de drogas, armas, cigarros e outros produtos são comercializados, sob os olhos complacentes da administração pública, que mostram seus dentes e ocasionalmente abocanham alguns membros, mas sem matar a galinha dos ovos de ouro.

Raíssa Benevides Veloso e Francisco Paulo Jamil Marques explicam que os profissionais da imprensa compram as informações passadas pela polícia sem questioná-las, e essa prática, além de ser mais cômoda, adequa-se aos interesses das editorias e daqueles que querem manter o controle social.

Entendo as razões pelas quais a mídia local age dessa forma, difícil mesmo é entender por que o Paraguai é a única nação de língua espanhola a denominar a facção de “Primer Comando Capital” sem o “de la” — será que foi usado para pagar propina? — foi mal, preconceito meu.

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A imprensa hispânica e o Primer Comando de la Capital

Há anos acompanho diariamente as publicações sobre a facção Primeiro Comando da Capital em todo o mundo e, para mim, tornaram-se nítidas as diferenças nas formas narrativas da imprensa hispânica sobre os fatos envolvendo a organização criminosa:

  • Reportagens Especiais: Argentina, Colômbia e Espanha apresentam reportagens elaboradas, através pesquisa e com análise de especialistas, apresentando a organização criminosa como uma estrutura internacional de narcotráfico internacional e controle social nas periferias das cidades e no sistema carcerário.
  • Bandeira política: na Bolívia a facção é demonizada, e o ministro do governo Carlos Romero assume o papel de paladino da Justiça.
  • Varejo criminal: o Paraguai se detém ao noticiário policial diário, com reprodução do que é recebido dos órgãos policiais ou judiciários.
  • Citações ocasionais: as demais nações latino-americanas contentam-se em reproduzir publicações de outras nações e vez por outra há alguma reportagem especial.

Perceba, não é de meu gosto dar canseira, colocando palavras vãs, quando se poderia chegar diretamente ao ponto, mas a repórter Valeria Saccone me colocou entre o cutelo e a parede, e resolvi não me calar diante da humilhação na qual seu artigo me jogou.

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As pesquisas pelo Primer Comando Capital pelo mundo

Os gráficos abaixo estão vinculados ao site do Google Trens, portanto a informação que estiver aparecendo talvez não seja a mesma que está vindo para mim no momento em que escrevo.

O primeiro gráfico mostra um quadro que tem se mantido inalterado por muito tempo — o Paraguai é de longe a nação que mais se preocupa com a organização, seguidas pela Bolívia, nação chave na estratégia da organização, seguidas das demais.

No entanto, no último ano a Bolívia superou em muito o Paraguai no interesse pela facção. O assalto aos carros fortes por si só não justificariam o aumento brutal do interesse, mas a facção passou a ser utilizada como bandeira política pelo governo.

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Veja o PCC nos principais jornais hispânicos

O interesse pela facção no meio digital apontado pelo Google Trends se reflete nas matérias produzidas pela imprensa. O Paraguai que mais pesquisa sobre a facção, também é aquele que a imprensa mais fala sobre o assunto.

O periódico paraguaio Ultima Hora já abordou desde 2004, segundo o Google, o assunto 33.100 vezes no momento que faço essa pesquisa, quando a média dos outros meios de comunicação fora do Paraguai gira em torno de 100 artigos citando a facção.

Abaixo, organizado em ordem de número de abordagens estão postas as principais publicações em Espanhol — a imagem é um link para a busca do Google.

Paraguai — Ultima Hora

Paraguai - PCC 1533 ultima hora

Bolívia — La Razón

Bolívia - PCC 1533la razón.jpg

Argentina — La Nacion

Argentina - PCC 1533 la nacion diario

Espanha — El País

Espanha - PCC 1533 elpais

Argentina — Clarín

Argentina - PCC 1533 el clarin diario

Equador — El Comercio

Equador - PCC 1533 el comercio

Argentina — Página 12

Argentina - PCC 1533 pagina 12.jpg

México — El Periódico de México

Mexico - PCC 1533 el periódico

Peru — El Comercio

Peru - PCC 1533 el comercio

México — El Universal

Mexico - PCC 1533 el universal

México — La Prensa

Mexico - PCC 1533 la prensa

México — La Jornada

Mexico - PCC 1533 la jornada

Espanha — ABC

Espanha - PCC 1533 abc

Uruguai — El Observador

Uruguai - PCC 1533 el observador

Uruguai — Montevideo.com

Uruguai - PCC 1533 montevideo

Espanha — El Mundo

Espanha - PCC 1533 el mundo

México — Excelsior

Mexico - PCC 1533 excelsior

Chile — El Mercurio

Chile - PCC 1533 el mercurio

Colômbia — Colombiano

Colombia - PCC 1533 colombiano.jpg

México — Crónica

Mexico - PCC 1533 cronica

México — Milenio

Mexico - PCC 1533 milenio

Espanha — La Razón

Espanha - PCC 1533 la razón

Nos últimos anos, como consequência do acirramento da disputa por poder entre grupos criminosos, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), tem sido recorrente a execução de grupos rivais dentro de unidades prisionais. Nestes casos, a morte, mesmo qualificada por uma brutalidade terrível, choca ainda menos. Tornamo-nos uma sociedade sádica, despudorada que não apenas aceita estas mortes, mas vibra com elas. A morte deve entrar em casa, tomar café e almoçar todos os dias com cada um de nós e não mais assustar. Tal sadismo toma forma a partir do crescente número de programas jornalísticos sensacionalistas, sucessos de audiência, centrados no espetáculo da violência. O medo da violência não desperta indignação, mas alimenta o ódio ao “outro”, reforçando a cisão social. Neste sentido, a percepção reproduzida nos últimos anos de uma sociedade dividida entre “cidadãos de bem” e “marginais” aparece como a versão mais moderna da polarização entre a Casa Grande e a Senzala. (leia o artigo dessa citação na íntegra)

Rafael Moraes é professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Rícard Wagner Rizzi

O Governo perdeu o controle dos presídios?

A formação e o fortalecimento das facções dentro dos presídios brasileiros são consequências das práticas de negociação entre os agentes do Estado e as comunidade carcerária.


A revolta dos Guardiões do Estado (GDE 745)

É fácil ficar berrando que não se negocia com preso, mas Anália e Wellington já haviam avisado: a coisa não é bem assim.

Ceará news incêndio em Cariri GDE 745

Com doze agentes penitenciários para gerir mais de mil cativos na Penitenciária Industrial e Regional do Cariri (PIRC), o Estado deveria se colocar em seu lugar, e fazer o que tem feito desde os tempos da Colônia: garantir a governabilidade através da negociação.

No entanto, o governo preferiu pagar para ver, endureceu as regras, e os aliados do Primeiro Comando da Capital, a facção cearense Guardiões do Estado, mandaram um recado: “devagar com o andor que o santo é de barro!”, e atacaram prédios públicos no Cariri, em Juazeiro do Norte.

A polícia prendeu alguns dos integrantes do GDE 745 que participaram da ação, mas o prejuízo para os cofres públicos, a sensação de insegurança transmitida para a população, a impunidade dos líderes criminosos e a impotência do Estado ficaram.

O que você sabe sobre o controle do Estado?

Você, assim como eu, talvez se pergunte se o governo perdeu o controle sobre o que acontece dentro dos presídios. Lamento dizer, mas Analía e Welliton afirmam que nós nem temos chance de entender o que está realmente acontecendo.

Se for esse seu caso, assim como é o meu, sugiro que, assim como eu o farei, volte para sua linha do tempo e seus grupos do Facebook e WhatsApp para postar suas opiniões sobre memes, fotos e manchetes de fake news.

Os sociólogos Analía Sória Batista e Welliton Caixeta Maciel desconstroem o conceito de controle social exercido pela sociedade no artigo Prisão como gueto: a dinâmica de controle e de extermínio de jovens negros pobres, publicado pela UNESP.

Nós, pelo menos foi a impressão que tive ao ler o texto, vivemos em um mundo imaginário, acreditando no coelhinho da Páscoa, no Papai-Noel e na aplicabilidade do Positivismo e dos ideais iluministas de Rousseau.

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O sangue lusitano corre em nosso tecido social

Você se lembra de Ganga-Zumba? Eu nunca tinha ouvido falar, mas era ele quem controlava o Quilombo dos Palmares e, quando viu que a casa ia cair, fez um acordo com a Coroa Portuguesa para evitar o massacre. Não me acuse de spoiler, você já sabe que deu errado, o sobrinho dele, chamado Zumbi, recusou o acordo e o resultado foi uma carnificina.

Faz parte da cultura lusitana de base católica, herdada por nós, evitar o quanto possível a interferência armada do Estado nos conflitos. Não que os lusos tivessem uma queda nata e à frente de seu tempo para o liberalismo, mas conheciam as limitações do aparelho repressivo de seu Estado.

Enquanto as outras nações europeias começavam a discutir se o poder dos nobres adivinha do poder de Deus, Portugal já tinha um Estado constituído e contato com pessoas de todo o mundo, adquirido por meio das navegações marítimas.

Sobreviver no canto do continente europeu fez daquele povo especialista em conhecer seus limites. Negociar com o outro foi uma ferramenta de sobrevivência trazida para as terras brasileiras, algo visto nas tentativas de barganha com os revoltosos de Palmares.

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O habitus de relacionamento entre Estado e sociedade

Sei que o mundo ideal é aquele baseado no neoliberalismo, afinal, procuro ser uma pessoa politicamente correta, e hoje o correto é defender as ideias liberais, principalmente no que tange a vida dos outros.

Pressiono o governo para que me garanta aposentadoria, saúde, segurança, educação e infra-estrutura, mas defendo que o Estado deve interferir minimamente em minha vida — quanto maior for meu poder de influência, mais conquistas terei.

Os governantes nada mais fazem que gerir os interesses diferentes, pressionados pelos mais diversos grupos sociais, e nosso sangue lusitano entra em ação para manter a governabilidade, atendendo, na medida do possível, a todos.

Quanto maior é a capacidade do governante de fazer o controle social por meio da autogestão das diversas comunidades sob seu julgo, melhor será seu resultado administrativo e de manutenção da paz — foi assim na Colônia e é assim hoje.

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Evitando o ponto de ruptura

A arte de negociar chegou ao fim por decisão de Zumbi, que assumiu Palmares e resolveu que a liberdade não se negocia. Por sua vez, os portugueses mandaram Domingos Jorge Velho até lá, que arrasou a vila. À custa de muito sangue, para os dois lados, Zumbi se tornou herói e Palmares um símbolo.

A arte de negociar chegou ao fim por decisão de Fleury, que assumiu o governo e resolveu que não se negocia com presos amotinados. A história se repetiu, e o Cel. Ubiratan arrasou o Carandiru. Dessa vez, também à custa de muito sangue, nasceu o Primeiro Comando da Capital, e Marcola se tornou herói e o PCC um símbolo.

O Marcola era homicida, sequestrador, roubava banco, não tinha nada a ver com a facção, mas é um homem articulado. E quando ele foi levado para o presídio de Tremembé [no interior de SP] começa a conversar com os últimos presos políticos no sistema prisional e aprende com eles sobre como estruturar o tráfico, a gerenciar como uma empresa, ao mesmo tempo em que vende internamente para os detentos a ideia de uma irmandade revolucionária.

desembargadora Ivana David

Analía e Welliton analisam as dinâmicas de violência e de negociação entre o Estado e as facções criminosas, levando em conta os complexos processos sociais de produção, controle social e manutenção que formam os guetos — a lógica vale tanto para os atuais presídios, as regiões periféricas e as ocupações urbanas e rurais quanto para os antigos quilombos.

Todos nós estamos o tempo todo sob o julgo do Estado, que interfere de forma abstrata e generalizada em nossas vidas, impondo sua autoridade, e assim também ocorre dentro dos guetos — Zumbi e Fleury optaram quebrar o equilíbrio cada um por um lado e ao seu tempo.

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O controle do estado sobre a massa carcerária

Os meios de comunicação e os políticos defendem soluções fáceis e aceitas pelo público, e o presídio sob controle total dos agentes penitenciários faz parte dessa plataforma, alternativa que tem, no mundo real, tanta chance de se concretizar hoje como se tinha no século XVII.

Quando a facção paulista Primeiro Comando da Capital utiliza os presídios como centros de operações internacionais, fica claro que o Estado perdeu autoridade, no entanto, a pacificação do no sistema prisional prova que o Estado se mantém no controle.

O autogoverno carcerário é responsável por evitar fugas e garantir o retorno das saidinhas e a vida e a segurança de funcionários e sentenciados nos presídios — ou alguém imagina que um preso estuprado, roubado ou ferido por outro preso vai chamar o carcereiro e pedir para ir para a delegacia de polícia para fazer um boletim de ocorrência?

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Abandonando o moralismo para entender o mundo real

Analía e Welliton apresentam números que demonstram que a estrutura social vigente nos presídios, periferias e ocupações contemporâneas foram edificados a partir das décadas de 1970 e 1980, com o envio seletivo de negros pobres para o encarceramento.

Nas décadas seguintes, acrescentou-se ao ambiente prisional jovens, quase sempre pobres e negros com envolvimento com o tráfico de drogas, que traziam consigo das ruas experiência de guerra entre gangues pelo domínio de biqueiras.

A violência e a crueldade sempre existiram dentro das prisões, mas eram atos de desajustados violentos, repudiados e temidos pelos demais; agora, essas forças são organizadas, aplicadas pelos soldados do tráfico sob liderança.

A massa carcerária ganhou um autogoverno com seu próprio sistema de segurança pública, com organização, liderança e aceitação na comunidade que representa, e o Estado Constituído assistiu, depois de cinco séculos, à chegada da paz nos cárceres.

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Em um eterno movimento pendular

As chacinas dentro dos presídios do Norte e do Nordeste e a queda de braço entre os aliados Guardiões do Estado e o governo provam que nem tudo são flores nesse processo. O custo da paz pode ser muito violento, e sua estabilidade depende do uso da força e da negociação, e nunca será definitiva ou terá limites bem delineados.

Será extremamente difícil nossa sociedade sair —a construção de um círculo policial-midiático-criminoso, um pelourinho midiático ao qual expõe e criminaliza as comunidades periféricas para o deleite de uma população que se sente superior.

A mídia, em busca de espetáculo, cobra das autoridades uma maior presença do Estado no controle do dia a dia carcerário, assim como alguns políticos que visam lucro eleitoral. No entanto, a realidade é que o governo não tem condições efetivas de gerir essa questão — alguns acreditam que com a privatização dos presídios, quem sabe?

Em Portugal do Século XV, já analisava-se a capacidade real de ação do Estado. Eles agiam por pura emoção, e o mais incrível é que os antigos lusos ainda sequer tinham recebido as luzes do Iluminismo e do Racionalismo.

Por isso, sugiro que você faça como eu: volte para sua linha do tempo e seus grupos do Facebook e WhatsApp para postar suas opiniões sobre memes, fotos e manchetes de fake news, em que nossos amigos neoliberais e progressistas podem demonstrar para seus iguais que têm razão, sem se preocupar com a opinião de Analía e Welliton.

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Pedro Rodrigues da Silva, o Pedrinho Matador, conhece o sistema prisional de São Paulo como poucos. Ele ficou sem ver a rua de 1973 até 2007 e de 2011 até 2018 — viveu mais de 40 atrás das grades e por lá, ele conta que viu mais de 200 presos serem mortos enquanto esteve por lá, sendo que mais de 100 foram ele mesmo que matou.

Viveu no cárcere no tempo do Regime Militar, da redemocratização e dos governos com leve viés progressista, mas mudança mesmo, houve quando a facção paulista despontou como hegemônica, acabando com as diversas gangs e grupos dentro das cadeias e presídios.

Sobre o Primeiro Comando da Capital ele afirmou durante uma entrevista:

“Fui [convidado a entrar no PCC], mas não entrei. Ali é o seguinte: depois que surgiu o partido, você vê que a cadeia mudou. Não morre ninguém porque o partido não deixa. É paz. Paz para a Justiça ver. Se começa uma briga, eles seguram. Eles também ajudam quem sai, arrumam trabalho.”

transcrito por Willian Helal Filho para O Globo

O PCC e as ocupações de edifícios e terrenos

Os movimentos sociais estão impregnados por integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC), que utilizam siglas como MSTS, MLSM e LMD, ou não?

O PCC, o prédio do Paissandu, Sascha Facius, eu e você

Entre eu, você e Sascha, com certeza você seria a melhor pessoa para escrever sobre o envolvimento da facção paulista Primeiro Comando da Capital com os chamados movimentos sociais que ocuparam os prédios de São Paulo.

A imprensa, principalmente a televisionada, cobriu o episódio com horas de telejornalismo ao vivo e com especialistas, sobreviventes, vizinhos, policiais, bombeiros, governantes e políticos da oposição sendo entrevistados — e eu e Sascha perdemos tudo isso.

Com tanta informação que você recebeu, achei que seria inútil tentar lhe trazer algum conteúdo que tivesse o mínimo de relevância, mas ao ouvir um bate-papo entre o sociólogo Jessé de Souza e o publicitário Celso Loducca mudei de ideia.

Segundo Jessé, a nossa imprensa é pior que a norte-coreana, só que em vez de ser controlada pelo governo, ela o é pelo poder econômico. Cada emissora repete os mesmos interesses e os mesmos pontos de vista, só mudando o tom e os argumentos.

Segundo ele, a sua opinião foi direcionada pelos redatores dos grandes jornais e dos apresentadores de televisão que não disponibilizam de forma equânime todos os pontos de vista — até os repórteres que, por comodidade, se encaixam no sistema.

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A facção PCC é quem organiza as invasões urbanas

Pobre é burro e fraco e é manipulado pelo Primeiro Comando da Capital que utiliza os mais necessitados para ocultar nas ocupações drogas e armas, enquanto cobra aluguel dos ocupantes, colocando na liderança dos movimentos seus asseclas.

Jessé afirma que eu e você, como bons brasileiros, não diríamos isso com essas palavras. Seria algo como: aqueles coitados são massa de manobra para as organizações criminosas e políticas — pura hipocrisia, afirma o sociólogo.

Ao fazer isso, repetiremos a informação recebida dos órgãos de imprensa: os criminosos do PCC tentaram se impor no lugar do Estado Constituído — ignorando que o governo e seus agentes foram os que abandonaram essas pessoas a sua própria sorte.

Interessante é ver que as maiores críticas vêm dos que defendem o liberalismo, quanto essa situação nada mais é do que o mais puro capitalismo, fruto da lógica do mercado.

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Pobres urbanos do Brasil e do mundo, uni-vos

Eu prefiro não defender Jessé, o que ele pensa é problema dele, mas aí Sascha Facius, que nem é brasileiro, resolveu se meter em nossos problemas e dar sua opinião, só porque ele tem PhD em Sociologia Urbana e estudou profundamente a questão da sub-moradia.

Ele fez o levantamento comparativo sobre as estratégias que os pobres (sempre eles, coitados) desenvolveram e adotaram para lidar com o problema da sub-habitação. Sascha, assim como Jessé, apontou para a questão de mercado.

Em “Durable Housing Inequalities — How do urban poor cope with displacement (pressures)?” ele visitou as ocupações, favelas e cortiços em São Paulo e a gecekondus em Istambul.

Ele sabia que sem o aval do Primeiro Comando da Capital, em São Paulo, e dos traficantes de Tarlabaşi, em Istambul, muitas moradias teriam sido lojas fechadas, e seria até perigoso para ele prosseguir com a pesquisa:

“Claro, eu sabia que os disciplinas do PCC não me receberiam com confiança e de braços abertos. No entanto, com o tempo e com referências pessoais, consegui convencer até mesmo esses indivíduos de que eu era inofensivo — ou, pelo menos, não era um alvo apropriado.”

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A compra de uma vaga em uma sub-habitação

Nas suas incursões, conversou com líderes comunitários, moradores e até com os responsáveis pela organização criminosa PCC:

“… ao longo dos meses em que residi em cada cidade, consegui obter acesso rotineiro a várias formas habitacionais mais ou menos informais, incluindo favelas e edifícios ocupados. Através de visitas frequentes, eu não só aprendi e me familiarizei com a vida cotidiana dos moradores, mas os moradores também se familiarizaram comigo até o ponto de confiança e amizade.”

Cida, uma das moradoras de um cortiço, é prova que a facção paulista dominava o local, pois em determinado momento ela é expulsa do quartinho minúsculo que havia comprado por 800,00 Reais e onde vivia com seu filho.

“Em agosto de 2016, uma ação policial ligou os líderes do MSTS ao tráfico de drogas e ao “desvio” de aluguel, então de R$ 200.” — ESTADÃO

Em São Paulo, Cida, no cortiço de Santa Cecília, e Arlete, na ocupação no Largo da Batata, assim como Sabiha, em Tarlabaşı, não eram pobres burras padecendo com a exploração, ao contrário, estavam utilizando uma estratégia econômica.

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A lógica matemática de quem vive na pobreza

Morar onde não é necessário pagar o aluguel pode alterar o status socioeconômico, permite comprar objetos e ir a lugares que de outra forma não seria possível. É a mais pura lógica liberal utilizada sendo utilizada pelos pobres urbanos considerados burros pela classe média.

“O dinheiro está se multiplicando [risos] e estou economizando um pouco, algo que eu não estava fazendo quando pagava aluguel. […] Eu não trabalho mais no shopping, como eu costumava ser faxineira, agora vou comprar lá! […] Eu também não tenho medo do despejo no futuro. Particularmente, há um ano, fiquei com medo, mas hoje não tenho mais medo. Porque hoje eu digo, tudo o que consegui hoje, tudo o que estou conseguindo, eu possuo este lugar, sabe? Eu não vou negligenciar o lugar, sabe? Eu consegui chegar tão longe já — eu tenho esse lugar aqui ”.

Cida mudou sua posição social. Por causa de seu acúmulo de capital econômico, ela pode ir ao shopping como consumidora, em vez de só ir para lá para trabalhar, limpar o espaço para os outros. Nesses termos, a Cida não apenas adquiriu capital econômico, mas também capital cultural (por exemplo, na forma do prestígio de poder comprar no shopping e não mais limpá-lo).

Voltamos assim a Jessé, que alerta que a classe média se enfureceu com essa ascensão social dos pobres que invadiram seus espaços culturais, como as universidades e os shopping centers, e a ética cristã do povo brasileiro impede de se verbalize essa insatisfação.

“O aeroporto agora está parecendo rodoviária, e a segurança do shopping não serve mais para nada” (ou seja, permitem agora a entrada de pobres como Cida e Arlete).

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A facção PCC 1533 entra com a pacificação

Jessé arranca a máscara dos hipócritas (ele não poupa adjetivos) e demonstra que aqueles que dizem que todos devem se deixar proteger pela Lei e pela Ordem Pública, são justamente aqueles que não moram em locais de risco.

Sasha concorda, argumentando que o PCC “ajudou a estruturar e organizar alguns dos bairros em que as forças estatais não entraram” e, muitas vezes, quando a pessoa não pode pagar aluguel, acertavam “uma contribuição de acordo com seus recursos econômicos”.

A visão que a imprensa passa das ocupações e é repetida por milhões de “cidadãos de bem é que as ocupações, cortiços e favelas estão ligados ao crime, às drogas e aos moradores de rua”, mas não é bem assim — sei, pois há alguns anos cheguei a visitar o cortiço em que viria mais tarde a morar Cida.

Não havia lá dentro medo e preconceito, exceto nos momentos em que a invasão polícia entrava e descia o pau em todos, gente boa e criminosos, mas isso foi antes que o Primeiro Comando assumisse, daí a entrada da polícia rareou.

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PCC para manter a ordem e disciplina no barraco

“Eu tive que tirar da boca para pagar o aluguel, porque o aluguel que você paga hoje, amanhã você está colocando sua cabeça no travesseiro já pensando na próxima renda que você tem que pagar.”

As necessidades humanas básicas de habitação, segurança e alimentação estão economicamente interligadas, e nesses ambientes sociais, os laços comunitários e a solidariedade entre os residentes podem ser mais problemáticos.

“[…] Mas aqui todo mundo se odeia. Por exemplo, fizeram muita sacanagem comigo e consigo mesmos, como cagar e fazer xixi no chão do banheiro e atacarem uns aos outros. Quando nós moramos em um lugar, nós temos que preservar esse lugar. E aqui está algo que não existe, união. Não existe. Porque se existisse, se fôssemos parte de algo maior, de um movimento ou de alguma coisa e conseguíssemos ajuda dos outros, não estaríamos em tamanha miséria.”

O poder constituído não sobe uma dezena de andares para separar uma briga de casal, nem investiga os roubos, furtos e estupros que ocorrem dentro de uma favela ou curtiço — a ordem é mantida pela organização criminosa.

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É nesse vácuo do poder público que a facção atua

Em milhares de bairros, favelas, prisões, cortiços e ocupações, o Primeiro Comando da Capital ocupa um espaço que o Estado não vai ocupar, por puro desinteresse econômico: exceto quando a coisa pega fogo — como ocorreu no prédio no Paissandu.

Políticos e imprensa precisam de um culpado, e voilá, a facção paulista é a escolha natural — inimigo universal, fácil de se entender e odiar, com pessoas de verdade que podem ser presas de verdade em rede nacional.

“Em algumas das divisórias de madeira usadas para delimitar cômodos, lia-se PCC em pichações. Investigação policial associou outra sigla de ascensão recente, o Movimento Sem Teto de São Paulo (MSTS), à facção criminosa paulista. Em 2016, a ocupação do grupo no Cine Marrocos foi alvo de operação em que a polícia diz ter encontrado armas e drogas.

Movimento Sem-Teto de São Paulo (MSTS)
Fundado em 2012, anunciava em sua página oferecer “uma completa estrutura, com portaria 24 horas, elevadores, escadas e portarias bem iluminadas”. Ocupou o Cine Marrocos, no centro, até 2016, quando investigação policial apontou o envolvimento de 28 líderes do grupo com a facção PCC e encontrou fuzis e drogas na ocupação”
Folha de S. Paulo

As interações sociais, econômicas e culturais descritas por Sascha para a Faculdade de Letras, Ciências Sociais e Educação da Universidade Humboldt de Berlim deixam de ter importância para a formação da opinião pública e para o desenvolvimento de novas políticas públicas.

Entre mortos e feridos, todos continuam seu jogo, e a facção não é nem mais e nem menos inocente ou culpada que emissoras de televisão, jornais, políticos e agentes públicos que a condena, e ela continuará forte nos seus outros domínios.

O Estado e a imprensa, em pouco tempo, esquecerão esse problema, pelo menos até a próxima vez que a coisa pegar fogo, e os pobres continuarão a buscar, por seus próprios meios, amparar suas necessidades básicas de moradia, segurança e alimentação.

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O maravilhoso mundo da televisão brasileira

Sascha conta uma experiência que ele viveu no Brasil:

“É noite e estou exausto de realizar várias entrevistas, eu ligo a TV e navego pelos diferentes canais. Fico com a Globo, uma cooperativa nacional de TV conhecida por suas produções de telenovelas. Estou organizando minhas anotações do dia em que algo na TV de repente me chama a atenção: vejo imagens brilhantes, vivas e coloridas da favela Paraisópolis. Eu estava lá outro dia para coletar dados quantitativos e ainda tenho as impressões do dia em minha mente — esgotos a céu aberto, becos inundados, barracos de madeira minúsculos e superlotados, e minhas interações com [o PCC]. O que eu vejo agora na TV é diferente: eu vejo pessoas ricas, cores brilhantes nas paredes dos prédios, carros grandes, ruas organizadas e estruturadas. Basicamente, uma versão ‘higienizada’ e romântica de Paraisópolis.”

Nos últimos anos, como consequência do acirramento da disputa por poder entre grupos criminosos, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), tem sido recorrente a execução de grupos rivais dentro de unidades prisionais. Nestes casos, a morte, mesmo qualificada por uma brutalidade terrível, choca ainda menos. Tornamo-nos uma sociedade sádica, despudorada que não apenas aceita estas mortes, mas vibra com elas. A morte deve entrar em casa, tomar café e almoçar todos os dias com cada um de nós e não mais assustar. Tal sadismo toma forma a partir do crescente número de programas jornalísticos sensacionalistas, sucessos de audiência, centrados no espetáculo da violência. O medo da violência não desperta indignação, mas alimenta o ódio ao “outro”, reforçando a cisão social. Neste sentido, a percepção reproduzida nos últimos anos de uma sociedade dividida entre “cidadãos de bem” e “marginais” aparece como a versão mais moderna da polarização entre a Casa Grande e a Senzala. (leia o artigo dessa citação na íntegra)

Rafael Moraes é professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Rícard Wagner Rizzi

O gato preto, a facção PCC e a Seita Satânica

É difícil saber o que é ficção ou realidade no mundo, e os faccionados do PCC levam muito a sério o espiritual.

Pedindo transferência para tranca do PCC

Não nos conhecemos, e eu não preciso dar satisfação a você, e nem você para mim. Só vou contar para você o que está acontecendo para que você tente entender porque preciso ser transferido para uma tranca da facção Primeiro Comando da Capital.

Talvez você fique em dúvida se é verdade o que vou lhe contar, mas lembre que não tenho nenhum motivo para mentir, e não há, de fato, nada de incomum nessa história, apenas algumas coincidências — que para mim pareceram engendradas pelo próprio demônio.

Essa é a razão pela qual quero voltar para um uma tranca do 15, para fugir do tinhoso, pois algo que as crias do PCC não toleram é essas coisas de satanismo — mesmo que isso me custe a própria vida.

Não omitirei ou acrescentarei nada à história. Talvez você possa entender melhor que eu o que aconteceu, por estar de fora e ter mais esclarecimento, talvez me diga que não há nada de extraordinário na morte de minha mulher e nos acontecimentos vinculados ao gato.

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Hoje sou PCC, mas fui um menino comum

Eu era um garoto quieto, ficava na minha, tanto na escola quanto na rua, nunca gostei de confusão, mas se precisasse entrar em briga para ajudar os amigos, eu sempre chegava junto.

Na escola eu ficava ouvindo histórias contadas pelos meus colegas, e na rua só saía para empinar pipa ou jogar futebol, pois o que eu gostava de verdade era ficar em casa ouvindo música e brincando com meu cão. Esse sim, verdadeiro e sincero amigo, e depois que cresci, me aproximei ainda mais do Bob.

Tive a sorte de arranjar uma garota que, assim como eu, gostava de animais. Ela mesma tinha um gato grande e preto. Quando fomos morar juntos, meu já envelhecido cão, me acompanhou, e o gato de imediato se apegou à ele.

Onde o cão estava o gato estava junto. Quando eu chegava do serviço, o Bob e o gato vinham me receber. À noite, o bichano não vinha para a cama conosco, se espremia com o cachorro em sua coberta junto à porta — nunca vi uma amizade como aquela.

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Gatos pretos são seres das trevas

Eu nunca dei trela a essas lorotas, mas seguia o conselho de minha tia Ana: “é melhor prevenir (fechar os olhos, virar o rosto) do que remediar (fazer curativo nos joelhos e/ou escovar com força o solado do sapato).”

Saí do emprego para fazer transporte de cigarro e outras coisas do Paraguai para o interior de São Paulo. O pagamento era bom, a distribuição era suave, e com o dinheiro me mudei para uma casa melhor.

Tudo corria muito bem, apesar do gato se comportar de maneira estranha. Se eu acordava de madrugada, o gato sempre estava sentado ao.lado de bob e me olhava profundamente.

Quando isso acontecia eu tentava dormir novamente, mas sabia que aqueles olhos continuavam fixos em mim. Com o tempo, não conseguia mais dormir, era só eu deitar e lembrava que o gato me olhava. Depois passei até a evitar de ir para casa.

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As drogas proibidas pela facção

O Primeiro Comando da Capital e seu aliados proíbem que seus membros utilizem crack e loló, e mesmo outras drogas liberadas têm que ser usadas com moderação. Você é quem tem que controlar a droga, não ela você.

Dicionário Disciplinar Atualizado 2018 — PCC 1533

32º – USO DE DROGAS NÃO PERMITIDAS
Quando é feito o uso do crack ou até mesmo do mesclado.
→ exclusão sem retorno

Como pimenta nos olhos dos outros é bobagem, o delegado carioca Marcos Vinícius Braga nos conta que: “a entrada do crack nas favelas cariocas foi a condição imposta pela facção criminosas Primeiro Comando da Capital (PCC) para continuar a vender cocaína para o Comando Vermelho”.

Por conta daquele gato eu estava perdendo o controle, e o dinheiro fácil era utilizado a rodo com bebidas e drogas — minha mulher, estava sofrendo com isso.

Meu velho cão e seu fiel gato agora eram os únicos que ainda vinham até mim quando chegava em casa. Minha garota já me evitava, e quando vinha falar era para criticar meu comportamento, pedir mais dinheiro e reclamar de meus amigos.

Ela, que sempre foi evangélica, passou a ser fanática, e isso me irritava profundamente. Era eu chegar em casa e começavam os sermões e louvores. Se em casa o clima era tenso, na rua não era melhor, e até o geral do estado me chamou para trocar umas ideias sobre meus excessos.

Tudo por culpa daquele gato preto. Para você pode parecer que não tem nada de mais em um gato olhar para você, mas é cabuloso e fica encucado na cabeça.

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Perdi completamente o controle sobre mim

Numa madrugada ao chegar em casa, eu estava turbinado, misturei tudo, a mente estava nublada e só me lembro que o Bob e o gato foram até a porta me receber e que minha mulher veio me dar um sermão — bati nela e chutei o cão, só o gato foi poupado.

Ao acordar de manhã ela não disse nada, o cão também se aquietou com o gato ao seu lado, e alguns dias depois o cachorro morreu — ele era muito velho, era de se esperar que partisse mais cedo ou mais tarde, sua morte não podia ter sido por causa de meu chute.

Enquanto ainda estava vivo, o cão olhava para mim triste, sem se levantar de seu cobertor — o gato também me olhava, mas agora com puro ódio, e quando eu acordava à noite, ele estava sentado na cama, bem ao meu lado olhando para mim.

Jurei que nunca mais me excederia, e evitei ir para casa, onde eu sabia que teria que enfrentar o olhar daquele animal demoníaco — eu precisava dar um tempo fora de casa, e a solução veio em forma de um serviço.

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Fui para a Guerra do Acre — B13 PCC vs CV FDN

Em agosto de 2017 me chamaram para levar alguns equipamentos para o Acre, onde estava tendo uma guerra entre a facção Bonde dos 13 (B13) e o Comando Vermelho (CV).

Não ia ter pagamento para esse serviço, era para ajudar os aliados, e eu fui convidado. Era só ir para as proximidades de Aquidauana no Mato Grosso do Sul, esperar na casa de um aliado o carregamento que vinha da fronteira e seguir para Rio Branco.

A viagem correu tranquila, até que minha mulher me ligou perguntando pelo gato, ela achou que eu o havia matado, pois ele desaparecera desde o dia que saí para a viagem — a partir daquele momento, não mais consegui dormir.

Entreguei o material, e os irmãos que me receberam não me deixaram voltar. Fui recebido como rei, e acabei ficando uns dias, e mesmo não participando dos corres por lá, eu, que nunca deixei de ajudar os amigos em suas brigas, não fiquei fora da guerra.

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O sangue infecta a alma

Não preciso aqui mentir, pois não estou sendo julgado por nenhum dos crimes que aconteceram em Rio Branco, Cruzeiro do Sul e Brasiléia, mas garanto que nunca vi em São Paulo o que presenciei por lá. Era outro nível de violência e crueldade, algo satânico.

Aquilo impregna o espírito do homem, mesmo o de um criminoso experiente como eu.

Não é fazer um assalto e esperar que as vítimas não reajam para que tudo termine bem: é ir pegar alguém sabendo que ela será torturada e esquartejada — já havia feito contenções em São Paulo e no Paraná, mas as mortes eram menos cruéis.

Fiquei feliz quando disseram que houve um acordo com o governo e que as ações nas ruas e nos presídios iriam parar, só sendo aceitos os acertos de contas autorizados, sem envolver a população — parti de volta para São Paulo.

Ao chegar em casa, o gato estava no cobertor do cachorro, e de lá não saiu, só ficou me observando. Quando minha mulher chegou em casa disse que o animal ficou fora todos os dias enquanto eu viajava. Ela disse isso e começou a orar, o que me irritou.

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Enforquei o gato no quintal da casa

Repito, não estou aqui para tentar dizer que tinha ou não alguma coisa demoníaca com aquele animal, apenas narrando os fatos na ordem dos acontecimentos e do jeito que aconteceram.

A viagem ao Acre me livrou das drogas, voltei limpo, mas as coisas que vi por lá mexeram com a minha cabeça. Eu não mais toleraria aquele gato, e no começo da noite o enforquei na goiabeira no quintal de casa — e naquela noite minha casa pegou fogo.

Vim direto do Acre para casa, sem parar no caminho para deixar as coisas que trouxe da Família 1533, e se elas queimassem eu teria que enfrentar o Tribunal do Crime — estava colocando no carro as armas e a droga quando a polícia chegou, atraída pelo incêndio.

Segundo Raymundo Juliano Feitosa cobrança mais cruel pelo Código Penal do PCC é o chamado xeque-mate: esquartejamento do infrator enquanto ele ainda está vivo, e só depois ele é morto e todo esculacho é filmado e jogado nas redes – essa condenação é aplicada aos estupradores e pedófilos, também, tem por finalidade servir de exemplo para outros que teriam interesse em fazer o mesmo.

Fui abordado e já estava algemado quando o policial perguntou se tinha alguém na casa. Minha mente ainda não estava funcionando direito, respondi que não, mas naquele momento, da casa ainda em chamas vieram gritos horríveis.

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Minha mulher morreu e eu fui preso

Um dos que narraram o que lá se ouviu foi Carlos Eduardo Valente, um pelotense que havia se mudado para o estado de São Paulo:

“Santo Deus, apenas ecoou no silêncio um gemido, um soluço, um grito prolongado e alto, anormal e inumano, um urro, um guincho lamentoso, cheio de horror e triunfo, como só no inferno pode se erguer das gargantas dos danados a sua agonia, e dos demônios da danação.”

O sangue gelou e ninguém se mexeu enquanto aquele lamento diabólico não cessou, e aí os vizinhos se lembraram que na casa deviam estar minha mulher e o gato, não eu. Quando os bombeiros chegaram, já não restava mais nada a fazer do que o rescaldo.

O corpo dela foi encontrado ainda na cama e na parede queimada, uma mancha branca na parede agora negra. Todos se admiram daquela marca, não tinha como não ver claramente um gato enforcado.

Os bombeiros encontraram e mostraram para o policial o corpo do animal ainda pendurado na árvore, e todos acharam que eu havia aproveitado que minha mulher dormia para matar o bicho, fazer a marca satânica na parede, por fogo na casa e fugir enquanto ela queimava — mas que o plano falhara.

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Mesmo preso o gato me persegue

Não pense que fiquei triste com minha prisão, pensei que ia me livrar do pesadelo, pois na prisão ficaria livre daquele gato do diabo, mas não, fui mandado inicialmente para o CDP de Sorocaba, e lá levei muito “salve”, perdi uns dentes e tive um pulmão perfurado.

Acharam que eu tinha matado minha mulher — fui mandado para o seguro, e depois começaram minhas transferências sem fim.

Independente para onde eu ia, era só eu chegar que, durante a noite, aqueles gritos lamentosos e horripilantes começavam a ser ouvidos pelos corredores, e todos os atribuíam a minha presença.

A imprensa inventou muita coisa a meu respeito, dizendo que eu havia emparedado minha mulher com um gato, o que não foi verdade, mas a mídia comprou a ideia e o mito se colou em mim como o grito daquele gato preto.

Eu aguentei de tudo, mas, agora, que estou em uma tranca onde sou aceito, venho pedir pelo amor de Deus que você consiga minha transferência de volta para qualquer unidade prisional comandada pelo Primeiro.

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O cheiro de carne humana queimada é um elixir para Lúcifer

Eu contei a você tudo o que aconteceu, você pode ver que não tenho nada com esse negócio de satanismo, foram apenas coisas que aconteceram, e aquele gato negro que entrou em minha vida.

Agora estou em uma das poucas unidades, se não a única do estado, onde ainda tem alguns membros da Seita Satânica (SS), e me colocaram com eles — ninguém mais me aceita por perto.

Mas eu prefiro morrer nas mãos dos PCCs a continuar vivendo entre os SSs. Aqui é o inferno no inferno, eu mesmo não teria palavras para descrever o que acontece por aqui. É como Diorgeres de Assis Victorio contou para Guilherme Santana:

“Tenha um mau dia, que o demônio te acompanhe, e tudo de ruim para você.” — é assim que começamos o dia, mau. Nos dias bons, tem cheiro de churrasco, mas é carne de gente viva que é queimada dentro das celas — daqueles que são aceitos como irmãos.

As queimaduras são graves e acabam na enfermaria, eu sou um dos poucos que não aceitam participar dessa loucura, mas não posso negar que eles não tenham força, pois desde que estou aqui, nunca mais o gato maldito apareceu.

O que falei neste site sobre o diabo→ ۞

O estatuto só tem 3 linhas , mas já é o que basta

Presidiário seita satânica SS Bauru

Achei que nada seria pior que o gato demoníaco, mas o cheiro de podridão da tranca da Seita Satânica, as paredes com símbolos de estrelas de cinco pontas e cruzes invertidas, tridentes e escrituras em uma língua estranha, as repetições do número 666 e desenhos de Baphomet e do olho de Lúcifer são muito mais difíceis de suportar que aqueles olhos acusadores ou gritos enlouquecedores do gato do inferno.

Ninguém conta de onde vem o sangue que é guardado até muito depois de apodrecer dentro das celas dos SS, e não serei eu quem o farei, mas o segredo talvez esteja no livro “Alquimia, Satanismo e Cagliostro”.

Até agora, pelo menos, eu não consegui que me deixassem ver o livro. Ele fica enrolado em um pano preto junto com alguns charutos, mas as regras básicas são repetidas e por todos têm que ser decoradas:

1) Que a verdadeira justiça infernal reine em nossos corações.
2) Porque, na verdade, a justiça infernal é inviolável em toda a superfície do universo.
3) Nas profundezas do fogo, nas profundezas do inferno, em toda a superfície da terra, nas profundezas do mar e no espaço infinito, sempre para a glória infernal.

Diorgeres de Assis Victorio pode contar para você toda a história dessa facção, desde o seu início, passando pela difícil convivência com o Primeiro Comando da Capital no Carandiru, até o momento que praticamente foi riscada do mapa pelo PCC.

Onde citei Diorgeres neste site→ ۞

O gato não se atreveu a enfrentar os SSs

O que aconteceu para aquele maldito gato ter deixado de me atormentar todas as noites, aqui, e enquanto eu estava nos outras trancas ele continuar a me perseguir?

Fui condenado pelos homens pela morte de minha mulher, do gato, e pelo incêndio na casa, mas não mereço ir para o inferno, e por isso me recuso a ficar com essas crias de Lúcifer.

Matei sim, mas não minha mulher, trafiquei sim, mas nunca fui uma pessoa má. Sempre gostei de animais, de ajudar meus amigos e ficar com minha mulher.

Por isso, e pela última vez, peço-lhe que consiga minha transferência, pois prefiro que esse meu corpo morra pelas mãos de meus irmãos, mas minha alma seja salva e siga seu caminho para longe daqueles olhos acusadores daquele gato maldito.

Esse texto foi baseado no conto “O Gato Preto”, de Edgar Allan Poe.

Matar pode, mas qual o limite?

A morte de integrantes do Primeiro Comando da Capital em Pernambuco levanta novamente a questão: a polícia pode matar quem está sob custódia?

Que a polícia mata nós sabemos… e aceitamos

Há alguns dias postei aqui um artigo que discute os limites aceitos por nós, a sociedade, sobre policiais que matam impunemente aqueles que eles acreditam ser criminosos: Pena de Morte no Brasil, sim ou não?

Existe um limite mais ou menos bem estabelecido, de maneira informal, mas que tem funcionado, como acontece nos casos de resistência ou de troca de tiros, cuja apuração é simbólica e não há punição dos culpados, mesmo que tenham havido excessos.

Não faltam exemplos disso, como citei na matéria anterior, mas a sociedade não aceita o justiçamento, isto é, após o entrevero, o agente público matar o prisioneiro ou, na falta de provas, assassinar aquele a quem ele atribui um crime.

A onda de matança que atinge os corpos consideráveis “matáveis, pessoas que não vão falar muito por eles, normalmente em bairros mais pobres”, como afirma a tenente-coronel da reserva da PM paraense, Cristiane do Socorro Loureiro

A zona cinza fronteiriça

A morte do PCC José Batista de Souza e seu colega entra justamente nessa zona. Entenda o que aconteceu:

Há alguns dias, criminosos explodiram um caixa eletrônico do Bradesco em Serinhaém, e teriam sido localizados a 150 quilômetros na cidade de Carpina.

A Polícia Militar ainda vai explicar direitinho como é que chegou até eles e quanto foi recuperado do que teria sido roubado desse e de outros assaltos praticados nos estados da Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte.

Pela abrangência das ações da quadrilha, com certeza muito deverá ser recuperado para seus legítimos donos. Quanto aos assaltantes, um bateu a cabeça e morreu, então não vai poder falar mais nada; outro trocou tiros com a polícia.

Ninguém questionaria a morte do bandido que bateu a cabeça, e isso entra na zona obscura aceita pela sociedade. (Quem somos nós para questionar a decisão do ladrão de pular em um poço?)

O que eles sabiam que não podia ser revelado?

Mas e o caso da ambulância? José Batista de Souza, o criminoso que trocou tiros com a polícia, teria sido ferido na perna esquerda, tórax e braço esquerdo e levado para a Unidade Mista de Carpina para os primeiros socorros. De lá, foi colocado em uma ambulância para ser levado para Recife.

Mas quando uma ambulância com médico, enfermeira e motorista, é perseguida e interceptada na estrada e os assassinos declararam que iam terminar o serviço.

Se José Batista de Souza trocou tiros com a polícia e foi socorrido, ele estava sob custódia. Onde estavam os policiais responsáveis pelo acompanhamento?

Morte de PCC assassinado dentro de uma ambulância
Rícard Wagner Rizzi

Caça à Máfia Russa no Brasil

A Polícia Federal faz uma minuciosa revista para comprovar a suspeita de que a máfia russa está atuando na região Norte do Brasil. O que de fato está acontecendo?

Separando o joio do trigo, os turistas dos mafiosos

A existência de tráfico de drogas e lavagem de dinheiro da Máfia Russa no Brasil, até o momento, não passa de uma suposição que transformou nossos policiais federais em agentes “russofóbicos”.

O repórter Allan de Abreu nos conta como doleiros como Dalton Baptista Neman lavam o dinheiro da facção através de uma operação casada : um comerciante paga um fornecedor na China em Dólar convertido de criptomoeda disponibilizada por um comprador de cocaína na Europa, daí, esse comerciante recebe pela venda da mercadoria vinda da China no Brasil em Reais e então paga o traficante brasileiro que vendeu a droga na Europa.

O chinês Jiamin Zhang se estabelecer no Brás no centro de São Paulo e é o líder de um esquema de lavagem de dinheiro com o uso de criptomoedas que pode ter movimentado bilhões de reais. Ele é acusado de trazer ao Brasil toneladas de cocaína vindas da Colômbia, Bolívia e Paraguai. Do território brasileiro, a droga era enviada para a Europa por portos da região sul do país.

Thaís Nunes detalha e dá nome aos bois

No entanto, a Polícia Federal brasileira ainda procura dinheiro nos bolsos, em uma verdadeira caça às bruxas, por vezes, transformando a vida dos turistas russos em um inferno — é o que afirma o empresário e aventureiro Artemiy Semenovskiy (Артемий Семеновский), que se autodenomina representante do CPLCRB (ОКОРГБ), autor de uma pérola sem preço: Рycckий Кokaиh b Бpaзилии – Рaзoблaчaem ЛoжЬ (Cocaína russa no Brasil – Explicando as mentiras).

Em um mundo onde as criptomoedas são utilizadas para lavar do dinheiro até dos crimes domésticos, como se comprovou com a Operação Mamma Mia da Polícia Federal e da Receita Federal ao investigar uma pizzaria comandada pelos integrantes do Primeiro Comando da Capital que além de massas e queijo para pizzas, comprava criptomoedas e ouro para lavar dinheiro e financiar atividades da facção. — Lucas Caram para o Cointelegraph

Sei que você sabe que o CPLCRB é o Comitê Público para a Libertação dos Cidadãos Russos no Brasil, então nem preciso te dizer.

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O russo, a Polícia Federal e o PCC

A maneira como Artemiy escreve me agrada, é como se ele estivesse contando um caso sobre algo que para os russos pode ser uma novidade, mas, para nós, é uma história conhecida: o que é e como nasceu o Primeiro Comando da Capital.

Artemiy Semenovskiy não economiza tintas de cores fortes para descrever a facção criminosa PCC 1533, o sistema carcerário brasileiro e a Polícia Federal:

“Paroxismo engraçado: o próprio poder gerou e criou seu inimigo mais terrível, porque o PCC surgiu como uma reação ao caos da polícia, à desumanidade do sistema prisional, à indiferença de juízes e funcionários.”

Por que os brasileiros querem insistir no mesmo caminho para ver se chegam a um destino diferente? Estranha o estrangeiro que se interessa pela política brasileira, apesar de parecer não ter uma ideia muito clara do que realmente acontece por aqui.

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Política como forma de diminuir a perseguição

Artemiy tenta criar um canal entre os governos brasileiro e russo para diminuir o preconceito das autoridades policiais tupiniquins, mas a instabilidade política dificulta o diálogo a longo prazo.

Com um governo sem rumo e uma polícia perdida e desmotivada não é possível controlar a criminalidade — retiram-se criminosos das ruas para colocá-los em universidades do crime.

Dentro do sistema prisional, o preso pode mandar matar o policial que o prendeu, e é assim em todos os estados, só muda a sigla da facção e a virulência da gangue, avalia Artemiy.

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As facções criminosas como desculpa

Nós brasileiros não aprendemos com o passado, mas Artemiy Semenovskiy, que é russo, vê aqui o que já aconteceu em sua terra com Lênin, ou na Alemanha com Hitler: a necessidade de nomear um bode-expiatório.

Para Artemiy, a bola da vez são as facções criminosas, de preferência o PCC, mas para que o plano seja perfeito é preciso que o inimigo seja externo.

A Máfia Russa cumpre duas funções: a de inimigo externo, que não pode ser tocado e nem mensurado, e a de símbolo de descrença na oposição política, uma vez que o atual governo brasileiro ainda pode acusar o anterior de conspirar com a Rússia.

O inimigo perfeito, pois até os PCCs, por fazerem parte da sociedade brasileira, são parte integrante da corrente de “cordialidade”, nos termos do sociólogo Sérgio Buarque de Holanda.

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Nas eleições vale tudo

O mérito das propostas dos candidatos não faz diferença em campanha eleitoral, o que vale é o poder de vender a ilusão que o inimigo, real ou imaginário, possa ser contido, mesmo que para isso o governo escolha atacar grupos minoritários.

Para Artemiy a escolha já foi feita: as pessoas encarceradas e os russos.

Quando me deparei com o texto desse russo, achei que era um garoto que estava criando uma teoria da conspiração com o seu Comitê Público para a Libertação dos Cidadãos Russos no Brasil (CPLCRB), mas depois de dois dias de intensa pesquisa, vi que realmente o cara ficou preso em Manaus e tem conhecimento de causa.

Agora, cabe a você analisar a situação com o seu conhecimento, somado aos dados compartilhados por Artemiy, e concluir se ele realmente tem razão, total ou parcial, nas conclusões às quais chegou.

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O preconceito pode mudar de lado

PCC se benefica contra preconceito contra venezuelanos

Você não pode dizer que um negro ou um bicha te assaltaram — ou qualquer outra forma politicamente correta ou não para descrever alguém que seja de outro grupo social.

Todo preconceito é desprezível…

… ou melhor, todo preconceito contra nossos iguais, contra os que não pertencem ao nosso grupo pode:

“Quando alguém relata um assalto em Boa Vista-RR, as outras pessoas logo perguntam: “O bandido era venezuelano?”. Os imigrantes estão na boca de quem reclama do crescimento da criminalidade e também do aumento da demanda por serviços essenciais, como saúde e educação.”

Enquanto isso, no mundo real, que não está nem aí para nossos preconceitos:

“Tem havido um crescimento da violência no Estado por causa do rompimento do acordo entre as facções Primeiro Comando da Capital (PCC) e Amigos do Norte, causando assassinatos nas ruas e rebeliões nos presídios, mas isso é na grande criminalidade. As infrações cometidas por venezuelanos não são a maioria, e geralmente são de menor potencial ofensivo: furtos de pequenas posses, como alimentos e celulares.”

Há pouco tempo, os caminhoneiros e aqueles que eram a favor da intervenção militar eram aplaudidos pelas ruas, bastaram alguns dias para que o preconceito contra esses dois grupos os jogassem pelo menos parcialmente na lama — cuidado você pode ser o próximo.

Turistas russos pedem indenização de 7,7 milhões

O PCC e a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD)

Renata Siuda-Ambroziak analisa a evolução social brasileira pós-regime militar e associa religião, política, economia, PCC e IURD.

Religião, política e futebol não se discutem, mas se misturam

Não foram poucos os trabalhos que apresentei a você mostrando a forte influência da religião no Primeiro Comando da Capital. Aquele que mais me marcou foi o MATA-MATA: reciprocidades constitutivas entre classe, gênero, sexualidade e território.

Roberto Cordoville Efrem de Lima Filho demonstra brilhantemente que não se pode analisar o fenômeno Família 1533 sem levar em conta o ambiente histórico, comportamental e religioso da sociedade carcerária brasileira.

Da mesma forma, a pesquisadora Renata Siuda-Ambroziak busca fazer uma análise global no seu artigo Política das igrejas neo pentecostais durante a transformação política no Brasil publicado pela Uniwersytet Marii-Curie Skłodowskiej (UMCS).

É fato que, ao contrário de Roberto, Renata cita a facção paulista apenas de passagem, para ilustrar o inferno no qual o bispo Macedo foi jogado ao ser preso:

“… a Polícia Militar, realizou o assassinato em massa de mais de uma centena de prisioneiros, matando presos deitados com tiro na parte de trás da cabeça. (…) aqueles que sobreviveram ao massacre criaram no final dos anos 90 a maior organização criminosa do Brasil, o Primeiro Comando da Capital (PCC), responsável, entre outras coisas, pelo tráfico de drogas, sequestro e extorsão — enquanto Macedo estava preso, pessoas estavam sendo mortas no Carandiru atrás dos muros da prisão.”

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A fonte que sacia a sede da IURD sacia também o PCC

Há uma forte relação entre a expansão do Primeiro Comando da Capital e da Igreja Universal do Reino de Deus. Ambas são consequência da busca pela satisfação da demanda por segurança da sociedade brasileira redemocratizada após duas décadas de Regime Militar.

As igrejas neopentecostais e a facção paulista cresceram atreladas às mudanças culturais, políticas e sociais dessa nova realidade, em que parte da população buscou abrigo em grupos desvinculados aos antigos detentores do poder, como a Igreja Católica ou a polícia.

Quem conheceu ou vivenciou as demonstrações de fé dos integrantes do PCC conhece a forte influência dos grupos pentecostais e neopentecostais na facção, apesar de vivermos em uma nação de maioria católica e com forte influência das religiões afro-brasileiras.

Renata foi a primeira a me explicar a razão da disparidade entre o quadro esperado e a realidade dos fatos. Ambas as estruturas sociais cresceram simultaneamente, captando pessoas que buscavam novos caminhos após a queda do Antigo Regime.

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Melhore de vida sendo nosso irmão

A Igreja Universal do Reino de Deus e o Primeiro Comando da Capital traziam em sua essência promessas de aceitação e ascensão social, melhora do poder de compra, esperança de enriquecimento e, de quebra, esclarecimento moral e espiritual para a vida de seus integrantes.

Renata denomina esses como “fatores de eliminação psíquica do risco e a redução do estresse”, que são utilizados pelas lideranças desses grupos para otimizar seus resultados, concentrando esforços em áreas em que há maior carência desse serviço.

A insegurança e as desigualdades sociais ostentam-se no Brasil redemocratizado — mais de 50 milhões de pessoas vivendo na faixa da pobreza e meio milhão presos, sofrendo atrás das muralhas todo tipo de violência e humilhações.

As pessoas que sentem alguma forma de privação grave ou ameaça imediata à vida ou à saúde se apegam a alguma crença a fim de mudar a situação — o engajamento em causas religiosas e em outras alternativas precárias é duas vezes maior entre a população mais pobre.

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Avançando sobre as classes média e alta

Após dominarem os cárceres e as periferias, as duas organizações continuaram a crescer, infiltrando-se em outras camadas sociais — Renata diz que esse comportamento já era esperado e é reflexo da busca pela diminuição da desigualdade social.

Na América do Norte, os cidadãos têm um bom poder aquisitivo; porém, a insegurança sobre a estabilidade econômica individual e a percepção das diferenças do poder de compra são marcantes, o que faz com que o fenômeno também ocorra lá.

Quanto mais rica é uma pessoa, menos ela sente os efeitos da desigualdade social e da insegurança, tendo, assim, menor necessidade da religião ou da participação em grupos para garantir sua sobrevivência — no entanto, ainda assim esse indivíduo não é uma ilha.

Dessa forma, as gangues e as igrejas neopentecostais ganham espaço em território americano e por aqui, recebendo jovens das classes média e alta, levados pela insegurança quanto a um possível fracasso econômico ou pelo interesse em proteção contra seus inimigos.

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Próximo passo: as eleições

A organização criminosa e a religiosa se articularam em todas as eleições, utilizando, assim como outros entes da sociedade, seus nichos para tentar colocar representantes nas casas legislativas — e até no executivo —, e esse ano não será diferente:

“Já fizemos as contas e temos a certeza de que vamos conseguir de 400 a 500 mil votos de familiares dos 150 mil presos de São Paulo e isso é suficiente para eleger não só um deputado federal, mas deputados estaduais e dar muita força a qualquer legenda que nos abrigar.”

”Líderes de igrejas evangélicas e partidos ligados a elas estão traçando uma estratégia para ampliarem suas bancadas na Câmara e no Senado a partir de 2019. O objetivo é aumentar de 93 para cerca de 150 o número de deputados federais e quintuplicar, de três para 15, o total de senadores.”

Ambos os grupos, no entanto, estão infiltrados dentro de diversos partidos políticos e linhas ideológicas, já que a política é o caminho natural para lutar contra as injustiças a crescente frustração econômica e a falta de perspectivas de solução para a questão carcerária.

Ao analisar o trabalho de Renata Siuda-Ambroziak, não temos como não ver similaridade nos percursos das duas organizações. Quem sabe essa eleição não possa ser o ponto em que ambas seguirão seus próprios caminhos?

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A IURD, o PCC e a advertência de Freud

Não é só no escrutínio eleitoral que a facção Primeiro Comando da Capital e a Igreja Universal convergem, ambas organizações são conservadoras nos costumes.

As rígidas regras de comportamento sexual impostas a seu adeptos, onde a masturbação, a homosexualidade, as relações fora e antes do casamento, e até a ereção sob a calça são severamente punidas — aqui nesse mundo pelo PCC e no outro mundo pela IURD.

Freud adverte: um ambiente que reprime o libido “produz uma necessidade de descarga, a fim de reduzir a tensão”.

Rícard Wagner Rizzi

A companheira PCC e o sistema prisional feminino

O nascimento de uma companheira do Primeiro Comando da Capital dentro do sistema prisional feminino brasileiro e sua morte por decisão do Tribunal do Crime da facção.

Nós fomos presos, mas só a arlequina do PCC morreu

Eu, Egeu e Berenice somos primos e crescemos juntos. Ela foi uma companheira do Primeiro Comando da Capital, e isso Egeu não postou, mas não foi ele quem a matou — afirmo com certeza pois a vi morrer.

Egeu se incriminou e foi preso pela morte de nossa Berenice, e eu não o desmenti. Agora, Raíssa tocou em um assunto que se entrelaça com a nossa história, por isso, e só por isso, venho contar para você o que realmente aconteceu.

Há muitos anos, Egeu me disse que “é da alegria que nasce a tristeza, e a felicidade passada é a angústia daquilo que podia ter sido e acabou não sendo” — parece que ele estava prevendo nosso futuro.

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Não devíamos ter sido tão felizes e com tantas esperanças no futuro

Nós três, quando crianças, estávamos sempre juntos. Nossos pais trabalhavam fora e as casas ficavam só para nós, sem ninguém para nos dizer do que podíamos brincar ou não, e assim tivemos todas as aventuras que queríamos.

Também não havia limites fora de casa. As ruas, as praças e até a estrada de ferro eram também parques de diversões, eram palco para nossas apresentações e aventuras — felicidade e aventuras sem limitações.

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Diferentes caminhos para a prisão e para a morte

Após nossa separação, apenas Berenice continuou vivendo, se aventurando e sorrindo; mas se eu e Egeu deixamos de viver, ela, sem perceber, rumou para uma morte cruel em uma véspera de Natal.

Toda vida e alegria que Berenice até então reservava para nós passou a ser entregue aos garotos do bairro, e ela aprendeu rapidamente a se aproveitar das vantagens de ser uma novinha da quebrada.

Eu ainda os via ocasionalmente: Egeu cada vez mais nerd e com o pensamento fixo nela; e ela cada vez mais feliz e pensando em qualquer um menos nele — ela deixou de ser nossa Berenice para ser a Nice Loira.

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Nice Loira presa por tráfico de drogas

Não acredite nas manchetes dos jornais, nossa Berenice nunca foi traficante. Um dos garotos com quem ela andava era um vaporzinho, e ela às vezes guardava para ele a droga no sutiã.

Pela letra fria da lei ela foi considerada tão culpada quanto seria o dono da biqueira ou o distribuidor do bairro. Se você considera que ela mereceu o que recebeu, eu respeito seu ponto de vista, mas garanto que nossa Berenice não mereceu.

Ficou quase dois anos presa até conquistar o direito à saidinha: a primeira foi no Dia das Crianças; a segunda no Natal, apenas para ser morta ao entrar na casa de seus pais, que estavam como sempre trabalhando.

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O sistema prisional feminino e a facção paulista

Raíssa Tavares de Araújo apresentou a tese Privatização do encarceramento da mulher: a inaplicabilidade do contrato de parceria público-privada aos presídios femininos no estado do Rio Grande do Norte à luz da criminologia ao Centro de Ciências Sociais aplicadas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Raíssa contou como as coisas funcionam dentro de um presídio feminino e esclareceu a morte de nossa Berenice.

“Antes do surgimento do PCC, os presídios […] eram conhecidos por suas barbáries entre os próprios apenados. Surge, então, para estabelecer regras de Conduta e solidariedade entre os que se encontram com a liberdade privada. Quem ousasse desestabilizar a ordem imposta, podia ser penalizado com a morte.”

E nossa Berenice foi morta por ordem da organização criminosa, não pelas mãos de Egeu, que nunca foi do mundo do crime — ele confessou um assassinato que não cometeu por amor, amizade e burrice.

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Por que nossa Berenice entrou para o PCC 1533?

“A inércia do executivo e a conivência do Judiciário […] provocam o surgimento de escolas do crime. […] Como consequência, aumenta a criminalidade fora dos muros da prisão. Torna-se um círculo vicioso, em que o Estado ainda não encontrou uma forma de rompê-lo.

A ausência da presença pública gera um vácuo tanto nos presídios como em áreas periféricas São nesses lugares que se legitima essa força paralela, ao passo que prestam serviços assistenciais à comunidade e impõe suas leis. Ainda utilizam-se da miséria desse povo para renovar o quadro de membros de sua facção e se perpetuar no poder.”

A pesquisadora do Rio Grande do Norte disse tudo. Nossa Berenice, alegre, comunicativa e cheia de vida, também era a Berenice aventureira, guerreira e audaz, que aproveitaria a situação para se juntar, dominar e quem sabe liderar as feras.

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A arlequina volta para casa para morrer

Eu não cheguei a ver a nossa Berenice quando ela veio na saidinha do Dia das Crianças, mas Egeu me mandou uma mensagem contando que ela estava irreconhecível.

Arlequina sofrida texto no face.jpg

“Ela está sofrendo de alguma doença que está tomando conta de seu espírito e invadindo a sua mente. Ela mudou, não é mais aquela Berenice que nós conhecemos. É terrível e está mudando sua personalidade quase não se dá para a reconhecer.

Eu choro ao lembrar daquela sua vida alegre e doce, e agora ela vivendo na ruína total, enquanto nós, que nunca levamos alegria para ninguém estamos aqui vivos e com saúde.

Quando ela chegou, sua magreza era excessiva é nada lembrava aquela garota ardente que nos fazia rir o tempo todo. Nunca imaginei que poderia ficar tão pálida e seu cabelo que sempre foi de um castanho quase ruivo que vivia caindo na testa da onde ela tirava sempre com um sorriso, agora estava de um loiro aguado amarrado em um coque.

Por Deus, preferia ter morrido do que vê-la assim. Que agonia ela está passando!”

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A beleza da vida — a beleza como razão de vida

Raíssa me mostrou a razão do porque nossa Berenice se deixou definhar:

“A prisão neutraliza a pessoa, principalmente as que pertencem às minorias, como é o caso das mulheres, que sempre foram subjugadas e castrados de suas vontades e em uma prisão a realidade da massa carcerária feminina chega a ser próxima à exploração em razão das características que apresentam: mulheres jovens, condenadas por crimes sem violência ou grave ameaça e penas longas.

Essas mulheres são fáceis de serem domadas em razão da vulnerabilidade que apresentam em decorrência do abandono por parte da família.

As prisões não estão preparadas para resolverem os problemas próprios das mulheres como gravidez, cólicas, higiene, limpeza e o cuidado com a beleza para elevação da auto-estima no cárcere.”

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Nice Loira julgada pelo Tribunal do Crime do PCC

Raíssa matou a charada, nossa alegre Berenice não sobreviveria a falta de cuidado pessoal, mas a facção não esperou a morte levá-la aos poucos.

Ao contrário do que Egeu declarou, ele nada teve a ver com a morte de Berenice — por mais que eu gostasse dela, Nice Loira não seguiu as regras de conduta e entregou uma colega para uma agente penitenciária.

Mesmo no lado errado da vida é preciso correr pelo lado certo, pois o errado é cobrado.

Esse texto foi baseado no conto Berenice, de Edgar Allan Poe.

Rícard Wagner Rizzi

A lista tríplice do MP-SP, o carcereiro e o PCC

A força do nome do Primeiro Comando da Capital (PCC 1533) é incontestável — vincular-se a esse nome pode ser para muitos um problema, mas para outros pode ser a tábua de salvação.

Aquele que não se pode nomear

Poder, medo, respeito e admiração acompanham o nome Primeiro Comando da Capital; quando de meu depoimento na delegacia de polícia sobre este site, meu inquiridor insistiu que “não pode usar esse nome, assusta as pessoas!”.

O que eu deveria fazer então? Mudar para “site sobre aquele que não se pode nomear”?

O medo de enfrentar o problema de frente nos trouxe até esse ponto. O presidente da Comissão de Segurança Pública do Ceará, Leandro Vasques, afirmou ao repórter Carlos Madeira da UOL Notícias:

“… eles partiram do diagnóstico de que não havia facções, que elas não atuavam. Com essa premissa falsa, todo o projeto está comprometido, faliu em finalidade. A partir do instante em que o estado escondeu da própria população de que o crime estava por aqui, o governo decretou a sua perda de controle”.

O Ceará passava por uma fase menos violenta, as facções haviam decretado a pacificação, mas o governo aproveitou para vender a imagem de que a polícia havia colocado ordem na casa, negando que a diminuição das mortes era fruto de acordo entre as gangues rivais.

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A coragem de falar o nome da Besta — e enfrentá-la

Os primeiros escritos da humanidade registraram as antigas tradições orais, e a coragem, tal como hoje, era a rainha das virtudes — enfrentar leões em uma cova, dragões alados que cuspiam fogo, reis déspotas ou tribos de ladrões garantia a glória aos heróis.

Apesar da evolução tecnológica, continuamos sendo motivados pelas mesmas sinapses neurais de quando vagávamos pelos desertos asiáticos ou savanas africanas, contando histórias, criando mitos e forjando heróis.

Hoje, poucos se apresentam dizendo que enfrentaram dragões ou animais selvagens, mas a criação do mito do herói se mantém, e o dragão que cospe fogo se chama Primeiro Comando da Capital (PCC).

Fábio Abreu, Vitor Valim, Marcio Sergio Christino e Diorgeres de Assis Victorio se colocaram em uma posição única, e, sendo época de eleições, deixo que você analise cada um dos candidatos a paladino. Mito ou realidade? Faça sua escolha.

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Falarei sobre três e nada direi sobre o quarto

  1. O secretário de Segurança Pública do Piauí, Fábio Abreu, chamou a imprensa e informou que, devido ao seu combate ferrenho ao PCC, havia sido jurado de morte pela facção — o anúncio foi feito no dia seguinte à publicação pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública dos péssimos resultados do seu estado no ranking nacional;
  2. O apresentador de televisão Vitor Valim, digo, o deputado federal, não está participando de nenhuma comissão que apresente resultados no combate ao crime, tampouco elaborou alguma lei mais rígida, mas alega que está incomodando pelo que fala em seu programa de TV, e por isso estaria sendo ameaçado pela facção — ele de fato chegou ser atacado, no entanto, foi por militantes do Partido dos Trabalhadores PT;
  3. O procurador de Justiça Marcio Sergio Christino, candidato à lista tríplice do cargo de Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo e que aposta todas as suas fichas em seu trabalho de combate à facção paulista.

As eleições gerais de 2018 terão uma prévia com a eleição dos membros que comporão a lista tríplice do Ministério Público de São Paulo. A força do candidato ligado ao combate à organização criminosa PCC dará uma ideia do poder que esse nome agrega.

Essas três personalidades públicas vincularam sua a da facção, alegando que se arriscaram ao enfrentar o perigo, mas, para ter valor, esse autossacrifício deve ser feito por alguém que se coloque a serviço do outro ou de uma causa, sem uma motivação egoísta, e, principalmente, esse risco deve ser real, e não apenas uma suposição.

Onde citei neste site o Ministério Público → ۞

Quanto ao quarto elemento nada falarei

Diorgeres de Assis Victorio, do Canal Ciências Criminais, é um crítico do meu site e do meu trabalho e, de quando em quando, deixa uma mensagem privada me informando que cometi algum erro ou omiti algum dado — por isso me recuso a falar sobre ele.

Farei como o repórter Guilherme Santana e deixarei que Diorgeres fale por si. Caso alguém queira ler a reportagem completa, na qual o estudioso conta sobre a origem da Seita Satânica SS, que vivenciou no berço do PCC, é só ir para o The Intercept Brasil.

“Em 1994, quando eu era um novato, os presos falavam comigo sobre um tal “Partido do Crime”. Eu falava ‘tá bom’, fingindo que estava entendendo, pois não é bom demonstrar dúvida perto dos detentos…

Só depois, eu e o restante dos agentes fomos descobrir que o tal partido era o Primeiro Comando da Capital, que alguns também chamavam de “Sindicato do Crime”. Para nós, os agentes penitenciários, era evidente a força que o grupo estava ganhando, mas, durante muito tempo, o governo negou a sua existência…

Foi nesse caldeirão que, no início dos anos 2000, o conflito explodiu: … o PCC agora mandava no lugar…

O conflito de poder deixou muitos mortos no Carandiru, …

Mesmo que a megarrebelião tenha deixado uns 16 mortos, o objetivo maior do PCC era mostrar o seu poder, aparecer pela primeira vez em todos os meios de comunicação do Brasil e mostrar que ele existia. Foi algo grande. Por pouco não entrei na contagem do número de mortos…

Realmente, eu sabia como era… aquilo era sinal de que a coisa estava esquentando. Nos dias que se seguiram, a cadeia ficou silenciosa e, é como o Drauzio Varella escreveu no livro Carandiru: quando a cadeia está silenciosa, é porque alguma coisa vai acontecer…

De repente, aparece um preso na minha frente, me rende … No caminho, vi que eles já estavam por todo lugar e haviam tomado o presídio…

… fui derrubado de barriga pra baixo ao lado dos outros agentes e funcionários que também haviam sido rendidos. Eu achei, na verdade tive certeza, que iriam nos matar ali mesmo. Pensei quem seria o primeiro a ser cortado, decapitado e ter as orelhas jogadas para os jacks [gíria para estupradores] comerem à força. Também passou pela minha cabeça os Satanistas negociando com o PCC alguma morte ou sangue para os rituais deles. Pensei em várias maneiras de morrer. Desejei que eu fosse o primeiro. Não queria ver o resto dos meus colegas morrerem na minha frente…

Presidiário seita satânica SS Bauru

Então um dos detentos que parecia um líder disse que precisava de dois reféns para ir com ele até a muralha do pátio. Era ali, na frente de todo mundo, que eles costumavam matar os reféns. Como na época do Exército eu havia tido aulas de prisioneiro de guerra, com porrada, tapa na cara etc., concluí que poderia estar mais preparado do que os outros para ir, então eu acenei com a cabeça para um colega que achei que tinha mais frieza e nós dois dissemos que iríamos…

Chegando lá, os caras estavam todos drogados, tomando tudo quanto era tipo de remédio com álcool, maria-louca, cocaína, fumando maconha…

Em seguida, tivemos nossas mãos amarradas umas às outras, um de costas para o outro, e fomos envolvidos por dois colchões, com as nossas cabeças de fora. Jogaram álcool em nós, pegaram um cilindro de gás industrial e abriram a válvula na nossa cara. Um deles estava com um isqueiro na mão, fazendo ameaças…”

… a história continua no The Intercept Brasil.

Fábio Abreu, Vitor Valim, Marcio Christino e Diorgeres de Assis Victorio se colocaram em uma posição única, e, sendo época de eleições, deixo que você analise cada um dos candidatos a paladino. Mito ou realidade? Faça sua escolha.

Escolha você em quem prefere acreditar, e escolha apenas um.

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Rícard Wagner Rizzi

O real e o imaginário e os ataques da facção PCC

Um grupo de pessoas se rebelam contra o Estado e a sociedade levando medo e agitação às ruas — o que de fato aconteceu e qual a posição tomada por você e por mim?

Informação certa — conclusão errada (errare humanum est)

Peço que não deixe José ver esse texto — sei lá, use a sua imaginação, se ele chegar enquanto você estiver lendo, coloque as folhas na gaveta ou por baixo do paletó — o importante é não deixar ele ver esse artigo.

Aline Ribeiro, jornalista da Revista Época, escreveu que eu produzo “textos carregados de referências pretensamente filosóficas”, então, optei por chupinhar o trabalho dos outros, e dessa vez a vítima foi o José, por isso lhe peço cuidado.

O que aqui escrevi está na monografia de José Isaías Venera“Da cólera ao acontecimento junho de 2013: do que escapa à representação em Deleuze e Lacan”, apresentada à Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL).

Há tempos, Nicodemos Rocha, da Academia Saltense de Letras, meu mais severo crítico, garantiu que eu tinha a extraordinária capacidade de obter os melhores dados das melhores fontes e chegar às mais errôneas conclusões — e talvez seja o caso de hoje.

Acho que não foi nada disso o que ele disse, ou talvez tenha sido, sei lá; deixo para que você leia o texto e tire suas conclusões.

Pensamos como bicho gente (parentum et magistrorum disciplinam)*

Raíssa e Francisco, da UFPR,  me atentaram para a forma sutil como todos nós recebemos e repassamos informações e conceitos do governo por meio de seus representantes dentro do mais puro e inconsciente conceito de Servidão Voluntária (Etienne de La Boétie).

Sim, nós — não estou falando deles, estou falando de você e de mim, pois nós não somos menos responsáveis que Arnaldo Jabor da CBN ou do blogueiro Reinaldo Azevedo da Revista Vejasomos todos farinha do mesmo saco.

Todos pertencemos à espécie animal Homo sapiens, e nossas sinapses neurais funcionam da mesma forma, em mim, em você, no Lula e no Bolsonaro — processamos de forma similar as informações que o ambiente, as experiências vividas e nossos mentores nos passam…

… e aí é que Raíssa e Francisco entram na história.

Eles demonstraram que a imprensa nos passa as informações que interessam ao governo — até aí sem novidade; mas isso acontece sem premeditação do Estado — os próprios jornalistas buscam por comodidade os agentes públicos para basear suas reportagens…

… e nós buscamos comodamente informações com os jornalistas que nos agradam, consequentemente todos nós nos acomodamos nessa cadeia de servidão voluntária.

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Pensamos que pensamos fora da caixinha (Quam odi)*

Aí está a dificuldade de todos nós, mesmo daqueles que vivem de transmitir fatos — não podemos deixar de lado toda nossa história de vida, tudo que aprendemos desde criança, e precisamos de um norte, de uma base para chegarmos a uma conclusão.

Movimentos sociais como os estudados por José ou a existência onipresente do Primeiro Comando da Capital impedem que os analistas interpretem o que está acontecendo por meio dos métodos tradicionais de análise — o real não se enquadra no imaginário.

Como em Matrix, a realidade passa a ser incognoscível, e o que foge ao padrão é ignorado e sua existência é negada, pois nossa mente tende a ignorar aquilo que não pode assimilar — confesse que quando você assistiu ao filme não se tocou da relação do Matrix com a organização criminosa.

Fatos atípicos, como a força de movimentos sociais, só são notados com ações grandiosas, como os ataques do PCC de maio de 2006 ou as manifestações dos vinte centavos em junho de 2013, e aí vamos buscar o auxílio de nossos mentores…

… do papai e da mamãe, ou, para não ficar feio, dos órgãos oficiais, ou da imprensa.

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Não pensamos fora da caixinha (Non Cogito, ergo sum)*

Somos nós quem buscamos socorro nessas fontes, até como forma de nos proteger, e repetimos o que nos foi passado por nossos mentores como se fossem nossas essa verdades — inconscientemente nos juntamos a uma das manadas…

… e foi assim que Arnaldo Jabor, assim como muitos de nós, viu a imagem da facção Primeiro Comando da Capital nas manifestações dos jovens pelos vinte centavos.

Homi K. Bhabha talvez dissesse que sem perceber havíamos chegado a um entre-lugar, a um ponto de colapso, em que um grupo de pessoas que não consegue se fazer ouvir abre mão de sua individualidade para ganhar voz.

“As autoridades não tinham ideia de onde aquilo ia parar. Pior do que isso — o que as afligia mais — eram a incredulidade e a incompreensão que as assaltavam diante das cenas dos protestos. Eles não conseguiam compreender como é que a fúria tinha começado. Sem que elas entendessem coisa alguma, o quadro complicava dia após dia, deixando um rastro pesado de desmoralização do Estado, depredações generalizadas — e mortes.”

Eu, você e Arnaldo Jabor teríamos dificuldade em saber a qual evento Eugênio Bucci estaria se referindo nesse trecho: do movimento Diretas Já! de 1984, dos ataques do PCC de 2006 ou das manifestações dos vinte centavos de junho de 2013?

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Todos iguais, braços dados ou não (Omnes Romani, annon eundem)*

As cóleras de cada tempo, expressas na mobilização de grupos distintos têm a mesma raiz e foram por nós interpretadas de forma diferente por cada uma das manadas; e as vozes do governo e seus representantes demonizaram em cada época aqueles que os impunham oposição.

Todos nós aqui somos pessoas direitas, justas e honestas, então, assim como Arnaldo Jabor, no calor dos acontecimentos, nos opusemos às Diretas Já!, aos ataques do PCC e ao movimento dos vinte centavos — coisas de desajustados e baderneiros criminosos!

Mas acredite em mim quando digo que nem todos são tão certinhos como eu, você e Arnaldo Jabor, havendo quem participasse de algum desses eventos — tal pessoa consideraria que aquele foi um evento por uma causa justa, e apenas as pessoas que participaram dos outros é que são desajustadas, baderneiras e criminosas.

No entanto, parece que lá de Palhoça o barriga-verde José Isaías Venera olha tudo e vê algo mais, que nada tem a ver com o que é certo ou errado, mas, sim, com manifestação de grupos que tentam quebrar o código da Matrix para poderem ser vistas e ouvidas…

… assim conquistamos as Diretas (mas não já), a facção Primeiro Comando da Capital deixou de ser negada pelas autoridades, e se não conseguimos os “vinte centavos” naquele momento, passamos a ver de outra forma a realidade política nacional.

Isso não é um cachimbo (Ceci n´est pas une pipe)

José, o pesquisador da UNISUL, navega entre Jacques Lacan e Gilles Deleuze, colocando em dúvida nossa percepção do que é Real ou Imaginário, usando repetidamente a figura do cachimbo de Magritte.

Após a leitura do trabalho de José, jamais verei uma foto de uma manifestação pública, de ônibus queimados e de presos amotinados sem lembrar que aquela imagem não é a manifestação pública, o ônibus queimado e os presos amotinados.

Post Scriptum (poste pichado pelos manifestantes)

Agora jogue fora essas folhas antes que o José as veja e se some a Nicodemos Rocha confirmando que não adianta eu ter as melhores fontes que eu sempre chegarei as mais erradas conclusões.

  • as frases latinas aqui foram postas apenas para avalizar, eu mesmo, Aline Ribeiro da Revista Época.

Nos últimos anos, como consequência do acirramento da disputa por poder entre grupos criminosos, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), tem sido recorrente a execução de grupos rivais dentro de unidades prisionais. Nestes casos, a morte, mesmo qualificada por uma brutalidade terrível, choca ainda menos. Tornamo-nos uma sociedade sádica, despudorada que não apenas aceita estas mortes, mas vibra com elas. A morte deve entrar em casa, tomar café e almoçar todos os dias com cada um de nós e não mais assustar. Tal sadismo toma forma a partir do crescente número de programas jornalísticos sensacionalistas, sucessos de audiência, centrados no espetáculo da violência. O medo da violência não desperta indignação, mas alimenta o ódio ao “outro”, reforçando a cisão social. Neste sentido, a percepção reproduzida nos últimos anos de uma sociedade dividida entre “cidadãos de bem” e “marginais” aparece como a versão mais moderna da polarização entre a Casa Grande e a Senzala. (leia o artigo dessa citação na íntegra)

Rafael Moraes é professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Rícard Wagner Rizzi
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