Os relatórios que apontam que a facção criminosa brasileira Primeiro Comando da Capital (PCC 15.3.3) estaria assumindo o comércio de cocaína em Portugal ainda não tem fundamento.
É possível saber a importância da Facção Criminosa em Portugal?
Geográfica e linguísticamente, Portugal se torna um centro crescente para o tráfico transnacional europeu de cocaína.
Sob esse ponto de vista, a surpresa é que demorou tanto para essa tendência se tornar tão aparente.
No entanto, a extensão da influência da organização criminosa Primeiro Comando da Capital em Portugal continua difícil de provar.
As denúncias feitas nas investigações dos periódicos portugueses Expresso e do Diário de Notícias falam de várias dezenas de integrantes do PCC no país.
Facção Criminosa PCC em processo de expanção
Os integrantes da facção criminosa paulista estariam preparados para ampliar o controle da entrada de drogas no país, mas há poucos detalhes além disso.
Em novembro de 2021, autoridades de São Paulo prenderam um integrante do Primeiro Comando da Capital com uma lista de membros de gangues no exterior.
Segundo o promotor de Justiça Lincoln Gakiya haveriam em Portugal, 42 pessoas já identificadas, mas apenas como números, como tendo recebido dinheiro da facção.
A facção criminosa PCC 1533 costuma recrutar membros entre os que buscam refúgio em Portugal ou que por lá já realizam algum tráfico de drogas.
As prisões de Wanderson e leonardo em Dubai
Em setembro de 2022, a polícia portuguesa prendeu Wanderson Machado de Oliveira, também relatado como membro da organização criminosa paulista PCC.
Ele foi acusado de tráfico de drogas e sequestro de dois homens que erroneamente pensou ter roubado 240 quilos de cocaína que pertenceriam à facção.
No entanto, as drogas haviam sido apreendidas pelas autoridades no porto de Sines, no sul de Portugal.
Em novembro, Leonardo Serro dos Santos foi preso em Dubai. Ele seria um dos líderes do PCC responsável pelo tráfico transnacional que passava por Portugal.
Ele negou todas as acusações contra e foi solto após 45 dias porque o Brasil não fez um pedido de extradição a tempo.
No entanto, Portugal não é destino destes carregamentos de cocaína. Em vez disso, a ‘Ndrangheta manda suas drogas para a Bélgica, Holanda, Alemanha e Itália.
A facção criminosa Primeiro Comando da Capital atua no Uruguai em parceria com grupos criminosos locais, como o Primer Comando Uruguayo (PCU).
O PCU é a responsável pela logística e segurança do esquema de parte do tráfico do PCC em território uruguaio.
A apreensão de grandes carregamentos de drogas, oriundos do Uruguai, em diversos portos pelo mundo comprova a existência dessa rota alternativa de tráfico do PCC 15.3.3.
Uma menor rigidez na fiscalização fizeram do porto de Montevidéu uma opção para suprir o mercado europeu com as drogas colombianas.
Já na Argentina, a principal rota ligando ao Paraguai é a hidrovia do rio Paraná-Paraguai, que possui poucos controles em ambos os lados da fronteira, mas um complexo nível regulatório para controlar as barcaças.
Desde junho de 2020, as autoridades uruguaias reconhecem a presença da organização criminosa paulista, atuando em parceria com grupos locais.
Essa união entre criminosos permitiu cooptar ou coagir os agentes públicos responsáveis pela repressão e de Justiça através de bombas, ameaças, sequestros, e subornos.
O assassinato sem precedentes de três soldados no Uruguai, alerta para a ousadia crescente dos criminosos em um país há muito considerado um dos mais seguros.
No início da manhã de 31 de maio, foram localizados os corpos de três soldados que foram executados na base naval de Fortaleza de Cerro, em Montevidéu.
As prisões sul-americanas passaram a ser centros logísticos, de treinamento e doutrinação do Primeiro Comando da Capital.
O aprisionamento em massa sem critério de separação por periculosidade e faixa etária, permitiu que em 2009 o Primer Comando Uruguayo estivesse atuando depois de poucos meses em contato com facciosos brasileiro e paraguaios dentro das prisões uruguaias.
Graham Denyer Willis e Benjamin Lessing explicam que dentro dos presídios e no meio de milhares de soldados prontos para serem doutrinados na filosofia e nas estratégias da organização fica fácil para as chefias da facção ficarem protegidas de seus inimigos e se dedicarem ao gerenciamento dos negócios da facção.
Capturade em El Salvador aproxima facção criminosa do crime
A facção criminosa Primeiro Comando da Capital (facção PCC 15.3.3) ordenou o assassinato do promotor de Justiça Marcelo Pecci do Ministério Público do Paraguai — é o que acreditam as autoridades dos diversos países.
O crime ocorreu no dia 10 de maio de 2022 na praia de Barú, na província de Cartagena, na Colômbia, onde o funcionário do governo paraguaio aproveitava sua lua de mel quando dois homens invadiram a praia particular em jet skis e dispararam contra o promotor.
Marcelo Pecci se destacou no combate ao tráfico internacional de drogas geridas pela organização criminosa PCC 1533 oriundas do Paraguai, passando pelo Brasil com destino a Europa.
Juntamente com ela, um cidadão de El Salvador, Vibert Giovanni Rodrigues, foi detido por ajudar na fuga e ocultação de Margaretha. No entanto, ainda não há provas apontando os mandantes ou o envolvimento da organização criminosa paulista.
A disputa entre as organizações criminosas pelo controle do tráfico na fronteira entre o Brasil, o Peru e a Bolívia.
O banda criminal los Choleros disputa o estratégico eixo de tráfico de drogas do Departamento boliviano de Pando com o Primeiro Comando da Capital (PCC 1533) e facção carioca Comando Vermelho (CV).
Pando faz fronteira com o Acre, Rondônia, e Peru, além de dar acesso ao centro da Bolívia — controlar essa rota reduz o custo do tráfico devido ao menor risco de perda da liberdade, de investimentos e de vidas.
A capital Cobija se localiza ao lado dos núcleos urbanos brasileiros de Brasiléia e Epitaciolândia, e as organizações lutam também para tomar o controle do comércio local, como ilustra artigo do El Dia:
Essa ação coroou a tentativa do controle hegemônico do mercado ilegal paraguaio por parte da facção PCC 1533, mas acabou criando dificuldades além das previstas para o grupo paulista.
Inicialmente, o Primeiro Comando da Capital uniu-se a um grupo desmembrado da Família do Norte, denominada a Cartel do Norte (CDN), para eliminar os crias que resistiam da facção Comando Vermelho e do que sobrou da FDN.
E do outro lado da fronteira de Pando, na Bolívia, o grupo local Choleros tomasse coragem e fôlego para enfrentar de igual para igual e ao mesmo tempo os dois mais importantes grupos criminais do Cone Sul.
Através da organização criminosa brasileira Primeiro Comando da Capital a família mafiosa italiana ‘Ndrangheta unificou a rota de distribuição de drogas do Cone Sul para a Europa.
“Os corretores da máfia são tão poderosos que lidam diretamente com o PCC. Traficando da Colômbia, da Bolívia e do Peru, passando pelo Paraguai como rota de trânsito.” — Zully Rolón, ministro da Secretaria Nacional Antidrogas do Paraguai
A parceria entre as duas organizações criminosas possibilitou que a ‘Ndrangheta passasse a hegemonia do tráfico de drogas da América para a Europa com o dominando 80% do fluxo.
A droga saída da Bolívia, Peru e Colômbia, chega no Paraguai e é colocado em containers que seguem por via terrestre ou fluvial/marítima para portos na Argentina (Buenos Aires), Uruguai (Montevidéu) e Brasil (Santos e Paranaguá) e desses para os portos europeus. — Última Hora
Alguém, por algum motivo, espalha aos quatro ventos que o Primeiro Comando da Capital (facção PCC 1533) domina o crime, aterroriza a política, a polícia e a população da região amazônica. Nada é menos real.
Quem ganha com esta desinformação?
Penso que as organizações criminosas que atuam na região se beneficiam com o uso dessa antiquíssima técnica: a ilusão hipnótica.
Chamando a atenção para um ponto de modo a ocultar outro, deixando-o fora do alcance da capacidade sensitiva e liberando-o de vencer as barreiras racionais daquele que deve sofrer o engodo, pois as áreas de seu cérebro que deveriam processar de maneira crítica a informação sobre um ponto acaba por desconsiderá-lo em detrimento de outro.
Essa técnica quando utilizada por uma pessoa se chama hipnose e pode fazer sumir uma moeda ou um mação e fazê-las aparecer em outro ponto. Essa técnica quando utilizada por um grupo se chama política e pode fazer sumir uma etnia ou uma floresta e fazê-las aparecer em outro ponto como dinheiro.
O ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles do governo Jair Bolsonaro descreveu essa técnica como “deixar passar a boiada”: enquanto incentivavam e mudavam a legislação para facilitar a exploração ilegal de madeira e minerais na região amazônica chamavam a atenção para a perigosa presença entre os índios yanomâmis do rei da Noruega Harold V ou dos integrantes da facção paulista Primeiro Comando da Capital.
Nem mesmo quando a Polícia Federal apreendeu com 77 Kg de ouro dos garimpos ilegais em terras indígenas o tenente-coronel Marcelo Tasso, o sargento Gildsmar Canuto (ambos da Casa Militar), e alguns soldados da Polícia Militar de São Paulo, poucos meses depois do presidente Jair Bolsonaro haver entregue aos militares paulistas o controle sobre as terras yanomâmis, a imprensa e das redes sociais parecem ter acordado do transe.
Não foram poucas as vezes ao longo da última década que acompanhei os altos e baixos da facção PCC 1533 nos estados do Norte do país, mas a facção nunca chegou a assumir o poder que lhe atribuíram sendo que no artigo “Abandonados, crias do 15 entram em extinção no Acre” faço um apanhado da precária situação dos paulistas por aquelas bandas.
A plataforma de ciência ambiental e conservação Mongabay, em 2021, elaborou um mapa delimitando as áreas de atuação de cada grupo criminoso. No entanto, o projeto de pesquisa denominado “Cartografia da Violência na Amazônia” foi elaborado com dados obtidos nos anos anteriores e refletem a derrocada e o racha da facção Família do Norte (FDN).
Após esse período, parte da facção FDN se consolidou como o Cartel do Norte, que inicialmente se aliou ao PCC e posteriormente tornou-se seu inimigo. O dinamismo das guerras entre as gangues no Norte transformaram o belíssimo trabalho de compilação de dados do projeto Mongabay em um registro de um passado.
No entanto, mesmo esse quadro publicado no artigo Organized crime drives violence and deforestation in the Amazon, study shows captou o efêmero momento no qual Primeiro Comando da Capital esteve em seu ápice, mas mesmo nele podemos notar a insignificância do PCC nessa geleia geral que é a divisão das pelo menos duas dezenas de grupos criminosos nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Rondônia, Roraima, e Tocantins.
Se em tese a Ilusão Hipnótica é a capacidade de usar fortes ilusões para alterar e controlar os comportamentos e ideias dos seus alvos, na prática é apontar para o poder do rei da Noruega ou da facção paulista para desviar a atenção dos grupos paramilitares e militares envolvidos com madeireiros e garimpeiros em terras indígenas.
Comércio de cocaína cresce na África Oriental e Meridional
De acordo com pesquisas recentes, à medida que os mercados globais de cocaína se expandem, remessas de drogas muito maiores estão chegando aos países da África Oriental e Meridional do que se acreditava anteriormente.
As cargas viajam principalmente em contêineres marítimos saindo do porto de Santos no Brasil, embora também haja um fluxo constante de pessoas levando consigo quantidades menores através do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. A maior parte dessas cargas desembarca em países costeiros como África do Sul, Moçambique, Quênia e Tanzânia, para serem posteriormente traficadas para outros continentes, ou mesmo para o interior da África.
Como resultado de tudo isso, tem havido um próspero comércio de drogas cuja verdadeira magnitude é desconhecida devido à fraca capacidade de interceptação. Os corredores de tráfico mais famosos do continente estão no oeste e no Norte da África, mas como eles têm maior capacidade de monitoramento – por exemplo, os porta-aviões navais franceses que patrulham o Golfo da Guiné – é difícil fazer comparações com base apenas nos dados de apreensão.
Abaixo, o InSight Crime apresenta três fatos importantes sobre o progresso da cocaína na África Oriental e Meridional.
Preços de varejo da cocaína em toda a região. Cortesia de Jason Eligh e do GI-TOC
Corredores de tráfico de grande escala
Os traficantes de cocaína enviam regularmente grandes remessas para vários países da região. Isso ocorre de três formas: em contêineres, em embarcações marítimas, como barcos de pesca, e por meio de esquemas de narcotráfico da América Latina.
A investigação identificou vários portos receptores principais, como Durban na África do Sul, Pemba e Nacala em Moçambique, Dar es Salaam e Zanzibar na Tanzânia, Mombaça no Quênia e Walvis Bay na Namíbia.
Por outro lado, observa o relatório, os navios desembarcaram ou deixam drogas “ao longo das costas leste e oeste da África do Sul, na costa norte de Moçambique entre Angoche e Pemba, nas águas costeiras de Zanzibar e Madagascar, na costa queniana de Kilifi a Lamu e as águas costeiras da área marítima da Somália-Quênia“.
Os esquemas de microtráfico são os mais diversos, tanto em termos de método de contrabando como de destino. Essas cargas, geralmente com menos de 5 quilos, podem viajar por correio, ser transportadas por mensageiros humanos em voos comerciais ou em bagagens abandonadas que são recolhidas por funcionários cúmplices nos aeroportos.
As taxas de interceptação são muito baixas e os mensageiros humanos viajam facilmente pela região. Abundantes conexões significam que o Aeroporto de Bole em Adis Abeba, Etiópia, e o Aeroporto Internacional Oliver Tambo em Joanesburgo, África do Sul, são os principais pontos de conexão para a Europa, Oriente Médio e Ásia.
Os traficantes de drogas da Nigéria há muito dominam os fluxos marítimos e aéreos desde que estabeleceram postos avançados de navegação em São Paulo, Brasil, no final dos anos 2000. Em 2013, eles já organizaram até 30% das exportações de cocaína por navio ou contêineres do porto de Santos , segundo relatório publicado naquele ano pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).
o porto de Santos, Brasil
Mais recentemente, em dezembro deste ano, a polícia prendeu um suposto traficante de cocaína nigeriano em São Paulo. Ele era acusado de embarcar cinco toneladas de cocaína, em outubro de 2021, do porto do Rio de Janeiro para a Europa via Moçambique. Além deste caso, no entanto, acredita-se que os atores nigerianos tenham perdido terreno, diz Jason Eligh, autor do relatório e especialista ligado ao GI-TOC.
Eles desempenham um certo papel, particularmente em termos de distribuição regional de cocaína no Leste e Sul da África. O que não se sabe é o tamanho desse papel hoje, em comparação com uma década atrás, por exemplo.
disse Eligh ao InSight Crime
A chegada do PCC, a organização criminosa brasileira
A ascensão meteórica de outro grupo pode ter sido a causa do deslocamento dos nigerianos: o Primeiro Comando da Capital (facção PCC 1533), a maior quadrilha carcerária do Brasil. Desde meados da década de 2010, o PCC com sede em São Paulo dominou o tráfico de drogas do Brasil para a Europa, transformando o porto de Santos em um centro global de comércio de cocaína.
Além disso, o grupo começou a enviar volumes crescentes de drogas para a costa atlântica da África nos últimos anos, a fim de diversificar o trânsito para a Europa e estabelecer novos mercados na África e na Ásia. As ligações linguísticas, históricas e de transporte fizeram de Moçambique uma rota importante, especialmente devido à sua proximidade com a África do Sul, o principal centro de distribuição de cocaína da região.
O país se tornou um nó de trânsito regional para os carregamentos de cocaína da quadrilha do porto de Santos tanto para o mercado regional, principalmente a África do Sul, quanto para a Europa e outras áreas.
afirma o relatório da UNODC
a costa de Moçambique
Uma mistura de vários fatores, como a presença de funcionários locais flexíveis, pouco desenvolvimento de infraestrutura, conexões multimodais de transporte para mercados europeus, uma língua comum e o hábito de fechar os olhos para o movimento de mercadorias ilícitas, como heroína, fez de Moçambique a escolha natural como caminho viável para sua rota de distribuição de cocaína.
conclui o documento da UNODC
Em 2020, o narcotraficante brasileiro Gilberto Aparecido dos Santos, vulgo “Fuminho”, que permanecia foragido das autoridades internacionais, foi preso junto com dois comparsas nigerianos na capital moçambicana, Maputo, onde estaria organizando tráfico de drogas para o Primeiro Comando da Capital. A imprensa brasileira destacou então que ele já havia feito negócios em vários países vizinhos.
Depois disso, não houve mais prisões de integrantes do PCC na região. No entanto, é provável que o grupo continue a rumar para a África Meridional no futuro. A única dúvida é se vai enviar membros da facção “batizados”, como Fuminho, para organizar os embarques, como alegadamente está a fazer em Portugal, ou se vai recorrer a intermediários externos.
Consumo surpreendentemente alto
Uma das principais conclusões do relatório é que os mercados de cocaína na África Oriental e Meridional estão muito mais desenvolvidos do que o esperado. Tanto a droga em pó quanto o crack estão amplamente disponíveis em toda a região, e estima-se que o uso seja surpreendentemente alto em vários países.
Por exemplo, de acordo com uma estimativa, os 60 milhões de habitantes da África do Sul podem consumir até 19 toneladas de cocaína por ano. Em uma base per capita, isso é comparável à Austrália, um dos maiores consumidores de cocaína do mundo, cujos 25 milhões de pessoas consumiram cerca de 5,6 toneladas de cocaína entre 2019 e 2020, de acordo com o último Relatório de Dados sobre Drogas Ilícitas do país.
Além disso, a pureza também é relativamente alta. O número mais recente do UNODC, em 2017, coloca a pureza média de um grama de cocaína em pó na África do Sul em 55%, em comparação com 60% no Reino Unido no mesmo ano, o maior consumidor de cocaína da Europa.
Divisão de três gramas de cocaína em pó em uma cidade costeira do Quênia. Cortesia de Jason Eligh
E a renda é abundante. Em dezembro de 2022, um quilo de cocaína em pó estava sendo vendido no atacado na África do Sul por algo entre US$ 26.000 e US$ 29.000, diz Jason Eligh. Isso é um pouco menos do valor comercializado em algumas áreas da Europa Ocidental. Da mesma forma, o relatório estima que o preço médio de varejo por grama foi de US$ 38 na África do Sul em 2021, o que, embora baixo para a Europa, ainda é muito bom.
O mercado também não se limita à África do Sul. Seus vizinhos, Essuatíni (antiga Suazilândia) e Lesoto, consomem uma quantidade impressionante per capita; de sua parte, Malawi supostamente tem oito vezes mais usuários de cocaína do que usuários de heroína. O crack é amplamente usado na Zâmbia, e o comércio de cocaína no Quênia é lucrativo o suficiente para causar uma competição violenta entre os traficantes.
Em resumo, a pesquisa indica que a região não deve mais ser considerada periférica em relação ao comércio global de cocaína. (…) É um importante ponto de destino para o mercado.”
Muitos dizem que o cangaço e as facções criminosas são, antes de mais nada, um fenômeno social. Seria o Primeiro Comando da Capital de hoje o cangaço do passado?
O Novo Cangaço — um grupo ou uma modalidade criminosa?
No Brasil, o Novo Cangaço é uma modalidade criminosa que descreve a ação na qual grupos do crime organizado dominam apenas pelo tempo de duração de um ataque planejado em uma região delimitada — um tipo secular de crime, no entanto, o Primeiro Comando da Capital (facção PCC 1533) profissionalizou os procedimentos.
Autoridades do Paraguai e da Argentina discutem estratégias para se contrapor aos ataques do Novo Cangaço e vejo tanto a imprensa e quanto autoridades utilizando o termo “Novo Cangaço” para designar uma facção criminosa como se fosse um nome próprio:
Não descarto que possa haver algum grupo que tenha se apropriado do nome, no entanto, o importante é estudar o fenômeno em si, como demonstra a morte de diversos membros das forças de segurança e a prisão de um número cada vez maior de profissionais do crime que se especializaram nessa modalidade criminosa.
O Primeiro Comando da Capital já possui em território paraguaio 700 integrantes conhecidos pelas autoridades e suas ações tem se concentrado nas províncias paraguaia e argentina próximas à fronteira com o Brasil.
Devido ao planejamento, a sofisticação na execução, aos contatos dentro das forças de segurança pública e privada, e o alto investimento envolvido é impossível os agentes de rua reagirem com eficácia aos ataques, e sua coerção só é possível através de um sofisticado processo de investigação com respaldo em legislação específica — o que pode contrariar interesses políticos.
Esse trecho do “Temacast Lampião” poderia estar se referindo tanto ao bando de Lampião quanto a um grupo de criminosos de hoje nas favelas e comunidades carentes brasileiras e agora ultrapassam a fronteira em direção ao Paraguai e a Argentina:
O Temacast, o cangaço e a facção PCC 1533
O Primeiro Comando da Capital é fruto de nosso tempo, mas não tem como não notar as semelhanças entre esse fenômeno criminal e a era de ouro do cangaço ao ouvir o podcast “Lampião”, do canal Temacast.
Leia este texto, que é uma transcrição de parágrafos inteiros (como o acima), Em alguns deles, substituo a palavra “cangaço” pelo termo “facção criminosa”, e a descrição do passado se encaixa como uma luva para os dias de hoje, mas, se preferir, ouça você mesmo o bate-papo entre os acadêmicos Francisco Seixas, Larissa Abreu, Igor Alcantara e Fabrício Soares: Temacast
Facções criminosas: milicianas e criminosas
Hoje não há uma clara diferença entre os facciosos oriundos do mundo do crime e aqueles que vieram das milícias, no entanto os milicianos se originaram da mesma forma que os antigos cangaceiros do nordeste.
Os primeiros milicianos tiveram sua origem como meros “prestadores de serviço”, aí o termo prestadores de serviço tem que ficar entre aspas, porque eles prestavam serviços de jagunços para os chefes políticos locais e pequenos empresários das comunidades.
Por outro lado, as grandes organizações criminosas brasileiras cuja origem se deu no mundo do crime, como o Comando Vermelho, Primeiro Comando da Capital e Família do Norte, tiveram sua célula mater na antiga Falange Vermelha (FV), do Rio de Janeiro.
Os primeiros grupos facciosos de que se tem relato eram, na verdade, meros grupos de presos que visavam apenas se autoproteger dentro das muralhas do sistema carcerário, mas que passaram a atuar fora das celas, inicialmente em suas próprias comunidades.
Conta-se que já em 1840, em Feira de Santana, na Bahia, havia um cangaceiro chamado Lucas da Feira, que tinha uma maneira de agir muito parecida com a de Robin Hood: ele fazia os saques e distribuía parte do butim para a comunidade carente.
Assim como o cangaceiro Lucas da Feira, os facciosos faziam uso de extrema violência e crueldade para garantir o sucesso de suas ações, contudo eram aceitos com certa naturalidade e até com boa vontade dentro de suas bases territoriais.
O Lampião de ontem, o Marcola de hoje, e o antagonista de amanhã
Da forma com que a imprensa e a história apresentam Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, e Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, tem-se a impressão que ambos foram fundadores dos movimentos que representam: facções criminosas e cangaço.
No entanto, foram apenas frutos de um processo que os antecederam em décadas.
Creio que você, assim como eu, não possui uma bola de cristal que possa lhe dizer como o futuro há de julgar Marcola do PCC, mas, se me basear no passado, em Lampião, posso afirmar que o antagonismo se manterá vivo por muito tempo:
odiado, pois sob o ponto de vista da lei, Marcola é, assim como Virgulino foi, um bandido, um criminoso sanguinário que matava e fazia negociatas sujas com políticos; e
amado, pois sob o ponto de vista político, Marcola é, assim como Virgulino foi, uma dessas pessoas que não aceitava o modelo oligárquico, no qual uma minoria privilegiada tem acesso aos bens de consumo e a ampla maioria da população vive disputando um espaço de sol na miséria.
Jesuíno Alves de Melo Calado, o cangaceiro Jesuíno Brilhante, buscava contestar o sistema da forma como ele estava montado, ao contrário de Lampião e Marcola, que se integraram, cada um de seu jeito, ao sistema, se aliando a políticos conservadores.
Esses ícones do Estado paralelo tiveram suas vidas esmiuçadas por dezenas de estudiosos em milhares de trabalhos acadêmicos e audiovisuais. No entanto não há consenso, alguns refletiram a visão daqueles que combateram o cangaço ou que tiveram seus antepassados mortos ou saqueados por eles; já outros, se basearam nos depoimentos do povo que convivia com eles.
Talvez nunca saberemos, afinal, se era um deus ou um diabo que reinava na terra do sol, assim como não sabemos, hoje, como serão vistos, no futuro, aqueles que reinam nas periferias, nos morros ou dentro do Sistema Prisional.
Qualquer grande líder político, militar ou religioso desperta essa reação de amor e ódio, e, se fizermos uma análise profunda, encontraremos grandes razões para amá-los e odiá-los ― não foi diferente com Lampião e Jesuíno Brilhante, e não será diferente com Marcola.
O Estado como controlador da violência
Lampião comandou seu homens com pouca resistência no período que sucedeu a Proclamação da República, em 1888, e Marcola viu o fortalecimento de sua organização após a derrubada do Regime Militar e com a Promulgação da Constituição Cidadã de 1988.
Espécies nocivas que frequentam o ambiente se proliferam com rapidez pela falta de predadores naturais, e assim o cangaço e as facções criminosas se fortaleceram na ausência do Estado nos presídios, nas periferias e no sertão nordestino.
Assim como no passado, o medo impera naqueles que comandam os diversos níveis de poder mas não temem a criminalidade tanto quanto temem a eles mesmos:
Os fazendeiros e políticos locais do século XIX e o governo federal temiam a política dos governadores. Um século e meio após, se um candidato à presidência propor a federalização ou a municipalização da segurança pública ― os governadores pirariam!
Dentro dessa realidade, o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) não consegue ser implementado deixando uma via aberta e bem pavimentada para as organizações criminosas enquanto os diversos entes federativos lutam pelo poder.
Getúlio Vargas para acabar com o PCC?
Até hoje, não há dados confiáveis sobre as questões de Segurança Pública. Cada estado é responsável pelo cadastramento de seus cidadãos e dos criminosos, através da emissão de documentos, e estes não estão disponíveis em tempo real.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não aposta em um novo salvador da pátria e explica suas razões:
No passado também foi assim, pelo menos até que chegou o cara, o salvador da pátria! Getúlio Vargas derruba o poder dos governadores e dos senhores locais e encerra a era de ouro do cangaço.
Talvez apareça um novo messias para nos salvar, talvez o Sistema Único de Segurança Pública dê mais um passo em seu lento deslocamento em direção ao aperfeiçoamento, ou talvez deixemos como está para ver como é que fica.
Pedro Rodrigues da Silva, o Pedrinho Matador, conhece o sistema prisional de São Paulo como poucos. Ele ficou sem ver a rua de 1973 até 2007 e de 2011 até 2018 — viveu mais de 40 atrás das grades e por lá, ele conta que viu mais de 200 presos serem mortos enquanto esteve por lá, sendo que mais de 100 foram ele mesmo que matou.
Viveu no cárcere no tempo do Regime Militar, da redemocratização e dos governos com leve viés progressista, mas mudança mesmo, houve quando a facção paulista despontou como hegemônica, acabando com as diversas gangs e grupos dentro das cadeias e presídios.
Sobre o Primeiro Comando da Capital ele afirmou durante uma entrevista:
“Fui [convidado a entrar no PCC], mas não entrei. Ali é o seguinte: depois que surgiu o partido, você vê que a cadeia mudou. Não morre ninguém porque o partido não deixa. É paz. Paz para a Justiça ver. Se começa uma briga, eles seguram. Eles também ajudam quem sai, arrumam trabalho.”
O que a alta hierarquia da facção Primeiro Comando da Capital espera dos “gerais do estado” nessa nova fase da organização criminosa.
Meus irmãos, aí um abraço, boa noite para todos da parte do André Júnior, tamô junto meus irmãos?
Bom meus irmãos, a caminhada é a seguinte.
Nós estamos reunindo para trocar um papo com vocês em relação a várias situações que vem acontecendo dentro dos estados, mas principalmente, estar conscientizando e estar tentando trazer uma imagem para vocês em relação a realidade que a gente vive hoje.
O Primeiro Comando da Capital está carente de liderança.
Carente de líderes, mas porque carente de líderes André Júnior, se todos os estados tem a sintonia, se todos os estados tem todo mundo puxando bonde, porque que está dessa forma?
Tá carente irmãos, porque o Comando precisa de líderes e não de chefes. Infelizmente, a gente, tem se deparado com alguns irmãos que não tem levado o Comando tão a sério, da forma que tem que ser.
Do que que a gente precisa? Nós precisamos que vocês tomem ciência da importância que é ser uma liderança, que mostra a direção mais real que a gente tem que seguir, ou seja, a direção aonde leva todo mundo a pregar e viver nossa ideologia.
O Comando hoje, vive um momento delicado em relação às facções, e muitas vezes os irmãos não tá tendo ciência disso aí. Os irmãos tem que procurar trazer a nova cara do PCC para seu estado.
Hoje, a nossa maior dificuldade é fazer os irmãos entender que o Comando é uma organização criminosa que tem que ser levada a sério: o comando não tem que ser tratado como se fosse um clube social.
É como fala no nosso Estatuto: o Comando não tem que ser tratado como se fosse uma quadrilhina ou um bando de vila.
O Comando é uma organização criminosa muito séria por sinal — é compromisso de vida que a gente faz, é a nossa vida que está ali no momento em que você aceita o convite.
Você tem que tomar ciência que ser liderança no seu estado é você deitar planejando o que vai ser melhor para o Comando no outro dia.
Você tem que tomar ciência que ser liderança no seu estado, é você planejar algo que seja em prol do interesse coletivo, e não interesse próprio.
Ser liderança no seu estado é você buscar cada dia mais tá aprimorando conhecimento, evoluindo, crescendo do seu estado em nossa organização.
Ser liderança no seu estado é muitas vezes você ter que se abster da sua família, dos seus corres particular, das suas necessidades pessoais prá viver em prol do Comando.
Isso é ser uma liderança dentro do seu estado.
Eu não estou aqui tentando dizer para vocês pararem de viver, ou deixar de ter família, ou deixar seus corres não. Eu estou querendo dizer que vocês tem que levar o Comando muito mais a sério, do que da forma que tem sido levado.
É inadmissível para nós achar que a Sintonia do Comando é só depois da sete horas da noite. É importante para nós entender que o Comando é uma filosofia de vida, é uma ideologia que a gente segue, que a gente escolheu para nós.
Porque querendo ou não, se nós não tiver de mão dada, se nós não tiver unido, nós infelizmente não vai conseguir alcançar o nosso objetivo.
Então irmão, é primordial que a gente faça uma conscientização de nossa luta para que os irmãos do estado comecem a refletir e seguir a nossa luta da maneira que tem que ser irmão.
Porque não adianta dizer que “sou liderança dentro do meu estado, eu sou isso, eu sou aquilo” mas os resultados não aparecerem — a sua falta de dedicação não pode contaminar os demais irmãos do estado.
Eu canso de falar isso aí! Para você ser uma liderança do estado não precisa você sair gritando: “eu sou PCC, eu sou isso, eu sou aquilo”.
Os irmãos do estado, pela sua atitude, pela forma de você agir, pela forma que você se conduz no dia a dia, eles vão ver que você é um PCC e que você vive a realidade que o Comando exige de você.
Todos os estados que estão com nós hoje passaram por momentos turbulentos.
Todos os estados que estão com nós hoje, vêm das crises do crescimento para a evolução, mas todos tem que dar a mão para continuar lutando e, sem a nossa união e sem nossas mãos dadas é impossível que cheguemos ao nosso objetivo.
Eu, André Júnior, querer, o Príncipe, ou qualquer outro irmão do resumo querer, é uma caminhada, mas vocês querer, e vocês buscar por onde, pode ter certeza que o resultado vai ser bem maior. Porque vocês é que estão dentro do problema. É vocês que estão dentro dos estados. É vocês que vivem a realidade de vocês.
Então irmão, é dedicação irmão! É a seriedade! E hoje a gente vê uma grande quantidade de irmão que não está levando o Comando a sério! Tá levando o Comando na brincadeira, irmão! É sintonia na hora que quer! Conduz do jeito que quer! É pedido um levantamento, não é levado com seriedade! O resumo chega e pede um levantamento, irmão, e parece que os irmãos ficam esperando ser punidos ou ser afastado para daí correr atrás!
E não é isso irmão! O Comando é dedicação, o Comando é seriedade, o Comando é responsabilidade com o compromisso que você tem com o crime! Entendeu irmão?
Então não adianta vocês vir falar, não adianta vocês vir querer fazer as coisas de uma maneira, sendo que a realidade, sendo que as coisas estão acontecendo de outra e muitas vezes o comodismo, a falta de interesse, de comprometimento, de responsabilidade está fazendo com que o Comando começa a abrir um caminho triste no seu estado.
Aonde você acha que o Comando só tem que fortalecer, fortalecer e fortalecer, e não é isso. A nossa realidade é um fortalecer o outro. É o crime fortalecendo o crime. É seriedade, é responsabilidade!
As vezes vocês acham… “Ah! Lá em São Paulo o Comando é isso. Ah! Lá em São Paulo o Comando é aquilo”.
O Comando de São Paulo, o Comando do Paraná, o Comando MS, o Comando do MG, o Comando de qualquer canto do Brasil é um Comando só!
Só que para o Comando ser um pouquinho mais evoluído aqui, um pouquinho mais evoluído aí, dependeu da dedicação, da responsabilidade, do compromisso e do comprometimento dos irmãos!
Hoje, vocês tem acesso muito mais fácil as informações da organização e ao andamento da organização. O entendimento que vocês tem hoje, muitas vezes eu não tive lá atrás quem me trouxesse o entendimento na hora.
Muitas vezes irmão, eu queria ter alguém para falar sobre o PCC mas eu não encontrava porque as pessoas tinham a visão distorcida.
Quantas vezes, chegava em uma cadeia como eu cheguei, e você entrar em um pavilhão com 60 coisas pedindo para você sair se não iam te matar — e hoje é tudo mais fácil, é tudo irmão.
Todos integrantes do PCC tem acesso fácil a sintonia.
Eu fui conseguir falar com um resumo em 2013! Nunca consegui falar com um irmão de hierarquia maior: só Geral do Estado e Geral do Sistema, eu nem sabia como funcionava direito e muitas vezes eu levava o Comando pela Ética do Crime que eu já trazia comigo.
Hoje a gente tem o privilégio de falar com vocês, dividir ideia, de falar do Comando, de falar da nossa criação, de falar do porque que foi criado e muitas vezes isso aí é jogado ao vento! Muitas vezes isso aí não é tratado com a seriedade que tem que ser! Muitas vezes isso aí é tido como loucura, como fanatismo, e não é, é um compromisso que nós assumimos que não é só eu que tem que levar a sério, não é só eu que tem que pensar no Comando 24 horas, não é só eu quem tem que deixar muitas vezes a minha família sentindo falta de mim lá porque estão precisando de mim por alguma situação e eu estar aqui falando com vocês. Sabe porque? Isso é amor a causa, isso é amor ao Comando, isso é amar meus irmãos, isso é amar meus afiliados e querer que o Comando cresça e evolua.
Hoje por exemplo, eu fiquei do meio dia e quarenta até agora a pouco, sete e meia da noite, escrevendo estado por estado as necessidades que está tendo, a dificuldade para que os irmãos possam olhar por nós e depositar mais alguma coisa em nós para que possamos fazer o Comando andar melhor.
E aí a gente olha para os lados e vê os estados acumular ideia em aberto, acumular inadimplência, a sintonia do estado se apagando, os irmãos fazendo ali um pouquinho de corpo mole, porra meus irmãos!
Vamos levar a sério o compromisso que nós tem, vamos nos comprometer com nossa causa, nós não vai chegar a lugar nenhum se cada um procurar se acomodar, se vocês pegar a revolução que teve no mundo, a mudança que teve na história, lá de três mil anos atrás até a data de hoje, você vai ver irmão, que foi através de comprometimento, foi através de suor, foi através de sangue, foi através de muita luta, muitas vidas que se perderam para nós chegar aonde nós chegou!
E dentro da organização criminosa Primeiro Comando da Capital da qual você faz parte, na qual você exerce uma função dentro, uma responsabilidade dentro, lá atrás nós perdemos muitas vidas para que fosse tomada essa iniciativa e após tomada e criado o Primeiro Comando da Capital, muitas vidas se foram em prol dessa causa e muitos irmãos nossos estão hoje dentro de tranca estadual e tranca federal, muitas vezes sem família, muitas vezes sem notícia de ninguém porque lutavam, lutaram e estão lutando mesmo dentro dessas trancas em prol da causa, irmão.
Hoje é um verdadeiro privilégio pegar um telefone e gritar o nome do Comando nos quatro cantos do Brasil e do mundo e muitas vezes a gente se acomoda por falta de interesse.
Muitas vezes a gente acha melhor ficar aí no Zap namorando, ficar olhando foto de mulher pelada!
Então irmão, é uma responsabilidade muito grande que você carrega e que quando a gente tem o privilégio de ter um minuto falando do PCC, ouvindo nossa história, a gente tem que dar valor nisso aí!
A gente tem que dar valor nisso aí, e não é só ouvir e guardar para nós não! É ouvir, analisar, refletir, e no outro dia você estar falando para seus irmãos e para seus companheiros a importância que eles têm para o Primeiro Comando! A importância que eles tem para nossa organização, como é muito mais importante se eles tiverem se doando de corpo e alma em prol dessa causa.
Há cerca de dois anos e pouco atrás a gente tinha cerca de 2,440 em todos os estados, fora São Paulo, hoje, a gente tem tranquilamente 13.700, 13.800, quase 14 mil irmãos — não tenho o fechamento exato porque vou fechar agora dia 1º (agosto 2021).
Isso não foi uma caminhada que nós começou e falou que nós queria ir e foi, nós tivemos que planejar, tivemos que se articular, nós tivemos que falar do Comando.
Se hoje muitos de vocês estão dentro do Comando, foi porque uma hora alguém encostou e falou do PCC. Eu mesmo quantas vezes não peguei a Cartilha e não fui ler junto com muitos de vocês, dentro da cela, pregando para sete ou oito companheiro ali, irmão?
Acreditando que vocês ia estar passando aquilo para frente, foi o que aconteceu e hoje graças a Deus a gente tem aí 13 mil integrantes para 14 mil integrantes dentro dos estados fora São Paulo.
Hoje vocês pedem um telefone e a gente com muito custo a gente consegue um dinheirinho e consegue colocar vocês no ar. Isso é fruto de união, irmão! Isso é fruto de uma ousada, é nós querer melhor, é nós passar pros irmãos nossa dificuldade e os irmãos acreditar em nós irmão!
Eu peço para vocês de verdade, nós estamos vivendo um momento muito crítico em relação as outras facções e é primordial irmão, que nós estejamos um olhando para o outro, que nós estejamos de mãos dadas.
A gente hoje tem uns quadros que apoiam vocês 24 horas do dia, com apoio nos estados, com apoio do resumo, e está toda hora aí falando com vocês!
Mano, vocês tem que sugar, vocês tem que pegar esses caras aí, mano, e absorver todas as informações, todo o conhecimento, pedir, ajudar, montar projeto para seu estado, e trazer os irmãos para perto de vocês!
Isso não quer dizer que a linha nossa do resumo está fechada para vocês, nossa linha é aberta, todo mundo pode chegar na nossa linha. Se não der para responder na hora, liga de novo irmão, mas nós estamos aqui para compartilhar com vocês essa nossa alegria de ver o Comando crescendo.
Nós queremos compartilhar com vocês essa nova alegria de ver vocês em sintonia, falando da nossa Cartilha e do nosso Estatuto — pregando o Comando!
Dedicação meus irmãos, seriedade, respeito, responsabilidade é o que nós pedimos para vocês, meus irmãos.
Eu peço para vocês de verdade, do fundo do meu coração que vocês comecem a pensar mais na organização, e não é só pensar da boca para fora, não é só pensar em vão. É viver o Comando, irmão. É respirar o Comando!
Nós temos vários irmãos nossos que daria tudo para estar aqui hoje para ver isso acontecer, mas eles estão na tranca, recebendo o mínimo de informação possível daquilo que eles mais sonharam, daquilo que eles mais almejaram.
Vocês estão vivendo um momento histórico, um momento único da facção, da facção não, da organização dentro dos estados e muitas vezes vocês não estão valorizando isso cara!
Vocês vão ter história para contar lá na frente:
“Porra mano, nós tivemos um momento no Comando… eu me lembro quando o Comando estava em 13 mil, eu lembro quando o Comando estava em 14 mil”.
Vocês vão poder escrever a história de vocês no Comando, e eu pergunto, vocês vão querer deixar sua história no Comando em branco? Vocês vão querer escrever uma de fracasso ou de sucesso?
Está nas mãos de vocês! Vocês foram os escolhidos para estar na frente dos estados de vocês, para estar na frente do sistema, na frente de qualquer responsabilidade.
Vocês foram os escolhidos e isso não quer dizer que sua hierarquia é menor do que a outra que você vai se sentir menor e vai querer fazer menos — não quer dizer que a hierarquia minha é maior que a de vocês que eu vou pisar por cima de vocês não, eu quero estar junto, eu quero estar de mãos dadas, eu quero estar abraçado assim como meu quadro quer, assim como os irmãos da financeira quer, como os irmãos do progresso quer!
A importância do pagamento das contribuições: cebola e rifa
Quando a gente fala da Cebola, a gente não está falando que esse dinheiro vai para o meu bolso, vai para o bolso da nossa liderança não! Esse dinheiro ele volta para os irmãos, ele volta em forma de ajuda nas contas de água e de luz, ele volta em forma de cesta básica, ele volta, de alguma forma ele retorna, não fica parado no bolso de ninguém não, esse dinheiro compra munição, esse dinheiro compra arma, esse dinheiro paga transporte de visita para as unidades carentes.
Quando a gente fala da Rifa, tem irmão que tem a capacidade de falar… “ah, mas eu nunca ganhei!”.
Como que você nunca ganhou se não é o premio da rifa? É o seu irmão que está na Federal chegar no final do mês ele não receber a ajuda dele? É a cunhada que está lá na casa de apoio tendo comida, tendo onde morar, tendo água e luz paga, …. ajuda, poder mandar para os filhos do seu irmão! Você quer premio maior que esse da rifa, irmão?
Você quer prêmio maior do que esse, meu irmão, não tem prêmio maior que esse para quem está lutando pela vida!
Para quem compra a rifa, só pensando em carro, só pensando em premiação, não está de verdade na causa! Você tem que comprar a rifa pensando que você está contribuindo!
Se você ganhar, meu irmão, eu fico feliz por você, mas isso aí é segundo plano, o primeiro plano é contribuir com os irmãos menos favorecidos. A premiação que os irmãos estão mandando para nós é uma forma de incentivação, é uma forma de motivação!
O maior premio você vai receber como eu já recebi quando estava lá na Federal e a minha mulher recebia lá no finalzinho do mês os 500 realzinhos dela lá para poder mandar para meus filhos para poder comprar as coisas dela, esse era o maior prêmio da minha vida.
O maior prêmio que eu recebi da RPF foi quando eu estava na Federal, chegava no final do mês aquele único dinheirinho minha mulher conseguia mandar um livro e uma revista para mim ler.
Esse foi o maior prêmio que eu recebi na minha vida! E a gente vê alguns irmãos não levando a sério a rifa, levando o trabalho da rifa na hipocrisia.
Muitas vezes tem irmão levando o subterfúgio para não pagar a rifa para ser afastado da responsa, para ser punido, para não dizer que está fazendo uma para sair do Comando eles ficam usando como subterfúgio.
O irmão usando dinheiro da cebola para falar:
“Ah irmão, eu tenho que me ausentar da cebola por que minha situação tá difícil.”
Então eu não estou entendendo mais, então antes de ser PCC você passava fome na rua? Antes de você ser PCC, até então você andava descalço… não andava, é isso que os irmãos tem que entender! Para contribuir com o Comando é só um passo a mais na luta que ele assumiu, porque comer, beber, comprar roupa, isso daí já tinha antes de ser PCC.
Colocando a ideologia da organização criminosa a frente
Vamos colocar a frente de tudo que o trabalho que o Comando oferece para nós, vamos colocar a frente de tudo a nossa ideologia que é o crime fortalecendo o crime, não vamos mudar o direcionamento dessas ideias irmão. Porque o dia que nós mudar o direcionamento dessas ideias, nós vai enfraquecer nossa causa e nós não pode enfraquecer!
Nós fomos escolhidos para estar a frente dessa luta e nós vai estar de verdade, e é o que nós está pedindo para você irmão! É o coração, põe o coração na frente da causa irmão. Ponha a mente na frente da causa.
Quando eu falo coração, eu falo, é de amor, é querer fazer as coisas com amor, com vontade, não estou falando de fazer as coisas na emoção. De fazer aqui e depois se arrepender, não!
Coloque a causa na frente de tudo o que você for fazer meu irmão. Quando você for comprar a rifa, pensa que um dia você pode estar na tranca e você vai precisar.
Quando você estiver aí para cobrar seus irmãos a cebola, mostra para ele que o dinheiro não vai para nosso bolso. Se você participar de qualquer trabalho, não fica inadimplente, eu peço para vocês, cara, procura pagar o trabalho de vocês em dia. Precisa ter pontualidade, porque nós fazemos compromisso com esse dinheiro.
O Comando não é uma organização capitalista, mas o dinheiro é para o próprio sustento da organização, o dinheiro é uma vertente aonde entra sai, tudo em prol ao crime, entra no bolso do crime e sai do bolso do crime para o próprio crime.
Batizar, batizar, e batizar!
Selecionar os companheiros irmão, trazer os companheiros para perto e ver se não tem mancha no crime, ver se tem uma trajetória da hora, se o cara é bandido, se é criminoso mesmo e trás com nós irmao. Coloca na caminhada e fala para ele:
“A partir de hoje sua vida é o PCC e você vai fazer por onde, você vai escrever a nova história”.
É isso que eu quero passar para vocês e espero que vocês tenham entendido o meu recado. Se alguma palavra minha foi mal colocada eu peço perdão meu irmão, mas eu precisava falar para você que o comando precisa de vocês com mais seriedade, responsabilidade, dedicação e pontualidade.
O que se pode esperar da estratégia de crescimento da Comunidade do Complexo de Israel no intrincado tabuleiro do crime organizado.
O ativista russo de direitos humanos Artemiy Semenovskiy (Артемий Семеновский) comentou no grupo de WhatsApp do site que recebeu informações que Manaus teria sido dominada pelo Comando Vermelho (CV).
Fiquei intrigado.
Há muito rola por lá a guerra entre as facções, mas a definição do conflito não me parecia estar próxima, apesar de me preocupar com a postura de grupos que antes se aliavam ao PCC: Guardiões do Estado GDE e o Bonde dos 40 B-40.
O GDE passou para a neutralidade e o B-40 tornou-se inimigo, matando integrantes e saqueando suas biqueiras do PCC, enquanto a antes poderosa Família do Norte FDN se dissolve.
Fabrício dos Santos Chaves, um dos líderes da Família do Norte, se escondeu com a família em Teresina após a FDN ter desmoronado, mas acabou sendo preso juntamente com sua mãe dele e outras seis pessoas por homicídios cometidos no Maranhão.
A resposta para essa intrincada e bilionária disputa pelo poder e pelos negócios nas regiões Norte e Nordeste pode estar nas comunidades do Complexo de Israel CDI no Rio de Janeiro, como me fez ver o canal Band Net News.
O Complexo de Israel é um grupo criminoso carioca, contrário ao Comando Vermelho, e que, apesar de manter parceria com Primeiro Comando da Capital, é considerado um grupo neutro e não aliado, assim como o GDE.
Comandado pelo traficante Álvaro Malaquias Santa Rosa (Peixão ou Aarão), o Complexo de Israeltem suas bases nas comunidades da Zona Norte do Rio de Janeiro: Cidade Alta, Vigário Geral, Parada de Lucas, Cinco Bocas, e Pica-pau.
fonte: Canal Band Net News
O futuro do PCC nas mãos do Complexo de Israel
Aarão está mudando o desenho do crime organizado no Brasil.
A neutralidade de Aarão em relação ao PCC, permite que:
acesse seus produtos como drogas, armas e cigarros;
aproveite sua logística de distribuição e conhecimento;
contato com sua liderança do crime em todos os estados e países; e
feche parceria com o Terceiro Comando Puro TCP, aliado fiel dos paulistasno Rio de Janeiro.
Essa situação favorece o Primeiro Comando da Capital pois enfraquece o Comando Vermelho em sua base sem ter o custo de manter uma guerra direta no território onde seu inimigo está melhor estruturado.
No entanto, o Complexo de Israel demonstra que pretende despontar como uma força nacional e para isso fechou aliança com duas facções de fora do estado:
Cartel do Norte CDN do Amazonas, formado por antigos integrantes da Família do Norte FDN que debandaram com a sua implosão, e que atualmente é uma facção aliada ao Primeiro Comando da Capital.
Aarão não faz segredo que pretende criar uma rota de transporte de drogas, armas e outros ilícitos a partir do Rio de Janeiro em direção ao Norte e fazer o caminho inverso com outros produtos oriundos da Rota dos Solimões.
Com a derrocada da Família do Norte, esperava-se que o PCC tomasse com certa facilidade a Rota dos Solimões, pois enfrentaria um Comando Vermelho enfraquecido por estar sendoatacado em seu território pelo Terceiro Comando Puro e demais aliados locais da facção paulita, e milicianos que usam as polícias Militar e Civil como tropas de apoio.
A integração da Rota do Solimões e da Rota Caipira sob o monopólio do PCC concentraria o abastecimento de ilícitos dos grupos, bondes, facções e vendedores individuais, e portos para exportação em todo o país.
É possível que a pretensão de Aarão se encaixe nesse plano, pois ao unir o Terceiro Comando Puro (Rio de Janeiro), Guardiões do Estado (Ceará), e Cartel do Norte (Amazonas), cria uma rota ligando Rio de Janeiro à Manaus, ao mesmo tempo em que auxilia os paulistas no enfraquecimento do CV.
Um ex-aliado (GDE), um antigo aliado (TCP), e um novo aliado (CDN) do Primeiro Comando da Capital passam agora a girar em torno do Complexo de Israel, que se torna uma nova força aglutinadora.
Aarão do Complexo de Israel seria o novo Marcola do PCC?
A prisão e morte das antigas lideranças do Primeiro Comando da Capital podem ter desarticulado seus negociadores, ou as novas lideranças paulistas estão perdendo o contato e o respeito da tropa na base.
O canal Band Net News coloca o dedo na ferida ao afirmar que “as crias do Terceiro Comando Puro … tem o estado de espírito bastante semelhante dos crias do Guardiões do Estado e do Cartel do Norte”.
Renato Alves Pereira, o Carioca, um dos líderes do Primeiro Comando Puro, perseguido no Rio de Janeiro, deu fuga para Fortaleza no Ceará, mocozando-se no bairro Vicente Pinzon e nas comunidades de Rosalina, Passaré e Itaperi.
Carioca caiu no campo em que guerreavam o Comando Vermelho e os Guardiões do Estado, e estava junto a eles quando perderam o território para o CV, e teve que retornar ao Rio de Janeiro, mas levou consigo 30 GDEs.
Com esse reforço, o Terceiro Comando Puro e as tropas do Complexo de Israel buscaram expandir seus territórios, assinando na prática um pacto de sangue entre os grupos cariocas e o cearense.
A disputa pelo território no Norte do Brasil Carioca também seguiu então para Manaus, para unir forças com o Cartel do Norte de João Branco, o vulgo JB, já corria com os crias do Primeiro Comando da Capital, para derrotarem juntos o Comando Vermelho que está nas mãos de Gelson Carnaúba, o Mano Gê.
Comando Vermelho domina com focos de resistência do Cartel do Norte em: Mozinha, Gilberto Mestrinho, São José e Tancredo Neves;
Zona Norte
Comando Vermelho domina o bairro Novo Aleixo com uma pequena área sob o domínio de um cria da Família do Norte,
Comando Vermelho domina a Cidade Deus e Cidade Nova com poucos focos de resistência do Cartel do Norte, e permanece em disputa o Conjunto Habitacional Viver Melhor e a Comunidade Monte Olimpo;
Zona Sul
Cartel do Norte controla com pouca resistência do Comando Vermelho em partes do: Alvorada, Morro da Liberdade, Santa Luzia, São Lázaro, São Jorge, e Vila da Prata, Parque 10 de Novembro, Colônia Oliveira Machado;
Zona Oeste
Comando Vermelho domina em especial no bairro Compensa, local onde a organização criminosa teve origem, mas tem sofrido ataques do Cartel do Norte no Carbraz, Parque São Pedro, Redenção e Bairro da Paz; e
Centro
Comando Vermelho controla com resistência no Bairro do Céu controlado por um cria chamado Marcelinho da extinta Família do Norte.
O Coroado de Manaus tem uma posição estratégica, é o bairro da Zona Leste que faz fronteira com a região central e é cheio de becos e vielas, que dificultam a a ação da polícia e facilita. — Ayrton Senna Gazel para o emtempo
“Agora é CDN. O coroado é CDN”, gritam eles. Os bandidos ainda aparecem ameaçando os jovens que estavam na quadra.
Um segundo vídeo, gravado no mesmo espaço, feito como “direito de resposta”, mostra membros da facção criminosa rival, Comando Vermelho, apagando as pichações e pintando a própria sigla no muro, também usando armas.
Graças as vitórias do Comando Vermelho sobre os crias dos Guardiões do Estado, vários deles foram para o Rio de Janeiro, onde se somaram aos crias do Complexo de Israel e do Terceiro Comando Puro atacando o CV em sua base.
Agora, com o enfraquecimento do CV carioca, os crias cearenses estão começando a buscar a independência. Nas penitenciárias de segurança máxima do Ceará já houve entrega de camisa de integrantes que se declararam “população”.
A neutralidade valeria também para as comunidades fortalezenses de : Curió, Alagadiço Novo, Lagoa Redonda, Guajerú, Coaçu e Paupina, todos na Grande Messejana, além de Moura Brasil e Itaoca; e para os municípios como Maranguape, Caucaia, Aracati, Crato, Sobral e Barreira. — BenditoJor
Análise baseada no seminário promovido pelo site InSight Crime sobre expansão do Primeiro Comando da Capital e o mercado transnacional de drogas.
Entendendo o crime transnacional a partir da facção PCC 1533
Pesquisadores do InSight Crime analisaram a mecânica do crime organizado transnacional no Cone Sul através do processo de expansão da facção criminosa brasileira Primeiro Comando da Capital.
Com mais de 10 mil integrantes só no estado de São Paulo e quase três décadas de história, a facção paulista gere a vida dentro das muralhas, assim como, a partir de suas biqueiras, as comunidades periféricas ou marginalizadas.
Somando negociação e violência extrema, a organização paulatinamente chegou a todos os recantos do país, com maior ou menor presença, de acordo com a realidade local e de seus interesses estratégicos.
Assim, o Primeiro Comando da Capital, passou de coadjuvante a coordenador do mundo do crime: criando regras, harmonizando desafetos, aplicando a justiça, e construindo um imaginário na população encarcerada e periférica.
Facção PCC 1533: como componente da equação
É fato que a violência dispara quando a facção disputa um território, no entanto, também é fato que os índices de homicídio desabam quando ela consolida sua presença:
São Paulo: com a hegemonia da organização criminosa, o número de homicídios caiu paulatinamente 76,66% a partir de 1999, sendo hoje o estado mais seguro do Brasil para se viver;
Ceará: o governo estadual atribuiu a queda dos homicídios dos anos de 2015 e 2016 à sua política de Segurança Pública, no entanto foi o resultado da pacificação conquistada pela facção que fechou parceria com grupos rivais e harmonizou as gangues locais.
Ceará: Em 2017, com o fim dos acordos de paz entre a facção paulista com a Família do Norte (FDN) e o Comando Vermelho (CV), o estado viu o número de assassinatos dispararem 48,73%, comprovando que a pacificação não havia sido uma conquista das forças de segurança pública.
Com o fim dos acordos de paz entre o Primeiro Comando da Capital com o Comando Vermelho, e deste com a Família do Norte, rios de sangue correram de norte a sul do Brasil: dentro das trancas, nas ruas, e quebradas.
gráfico com a taxa de mortalidade: Brasil, São Paulo e Rio de Janeiro
Facção PCC 1533: a estratégica política de cooptação
O interesse por um território pode ser local, para garantir o fluxo em uma única biqueira, mas também pode ser estratégico, para dominar ou fortalecer sua presença nas regiões produtoras de drogas e nas rotas de distribuição.
A política de cooptação que tenderia a fragmentar a facção, então, segundo Camila Nunes Dias, a facção montou “uma estrutura horizontal flexível e muito forte, conseguindo cadastrar e vincular seus integrantes”.
Os novos aliados cooptados incorporam ao leque do Primeiro Comando da Capital: produtos, serviços, estratégias, contatos e conhecimentos específicos do submundo local.
Não faziam parte do leque original de produtos e serviços do PCC: contrabando de cigarros, prostituição, adulteração de combustíveis, participação em empresas e licitações públicas, entre outros — o contrabando de cigarro hoje é um dos braços mais rentáveis da facção.
E assim, as creches da prefeitura de São Paulo, a maior cidade da América Latina, acabam sendo usadas para lavar o dinheiro da organização criminosa.
A cooptação é usada tanto para o domínio de uma biqueira em uma vila amazônica, quanto para a criação de rotas transoceânicas — como nos casos de: Fuminho (Gilberto Aparecido dos Santos) e Gegê do Mangue (Rogério Jeremias de Simone).
Facção PCC 1533: Fuminho e Gegê do Mangue
Fuminho que já havia atuado na Bolívia junto aos produtores de coca, e na melhoria das linhas de escoamento para o Brasil, acabou preso em Moçambique quando tecia parceria entre o PCC com grupos criminosos do sudeste africano.
Moçambique não foi escolhido apenas pelo idioma, mas por sua posição estratégica — uma semente bem plantada naquele solo fértil, se devidamente regada, permitiria ao Primeiro Comando da Capital colher bons frutos:
As organizações criminosas moçambicanas atuam no tráfico regional de heroína e de armas, fazendo a ligação com as organizações asiáticas que atuam nos 47 países que integram a zona de influência do Oceano Índico.
O eixo africano permitiria ao Primeiro Comando da Capital entregar diretamente para clientes europeus, evitando os portos da Bélgica, Holanda e Itália, onde é necessário pagar o agenciamento cobrado pelos cartéis locais que gira em torno de 40% do valor da mercadoria.
Não se pode afirmar com certeza quando o Primeiro Comando da Capital iniciou suas operações por lá, mas se acredita que tenha montado bases tanto em Moçambique quanto na África do Sul, e que mantenha laços comerciais desde 2012, e o Hezbollah tem uma presença importante naquelas bandas:
Estudando esse caso, Camila Nunes Dias chamou minha atenção para a dificuldade de se entender a estrutura da facção: Fuminho, liderança inconteste do grupo criminoso, sequer é um membro batizado da organização criminosa.
Teoricamente:
podendo fazer negócios particulares com grupos inimigos;
ficando nebulosa sua colaboração para o caixa da organização;
Gegê do Mangue, batizado na facção, organizou rotas de distribuição da Bolívia para o Brasil, e foi morto no Ceará onde negociava com grupos locais a estruturação e segurança dos entrepostos e portos para o despacho de drogas para as organizações criminosas européias.
Facção PCC 1533: estruturando a Rota Caipira
O Brasil se tornou o segundo maior mercado do mundo depois dos Estados Unidos, com dois milhões e oitocentos mil consumidores, obrigando o Primeiro Comando da Capital a desenvolver uma cadeia logística que garantisse o fluxo constante, seguro e em grande escala do produto.
Para isso, lideranças da organização criminosa seguiram para Bolívia, Colômbia e Paraguai, para estruturar um sistema de parcerias interligando: plantadores de coca, refinadores, distribuidores autônomos, varejistas, e exportadores.
Quando a liderança da facção PCC 1533 seguiu para a região, já haviam células atuando em toda a extensão da Rota Caipira: Bolívia, Paraguai, Mato Grosso do Sul e Paraná — tendo lá chegado a partir dos presídios.
Por anos, PCCs foram aprisionados ou transferidos para essas regiões, difundindo a “filosofia do partido” nos presídios, e suas sementes ao serem libertadas, se espalhavam para as comunidades do entorno formando essas células por toda a extensão da Rota.
Facção PCC 1533: encontrando seu limite
O Primeiro Comando da Capital distribui 60% da cannabis produzida em solo paraguaio em uma área estimada entre 7 e 20 mil hectares (1.340 municípios brasileiros tem uma área de até 20 ha.), produzindo entre 15 e 30 mil toneladas por ano, ocupando duas dezenas de milhares de trabalhadores rurais: da pequena agricultura familiar aos latifúndios do agronegócio.
A organização criminosa atravessa com facilidade os ilícitos através dos 800 quilómetros da fronteira do Brasil com o Paraguai, utilizando-se para o transporte de empreendedores individuais ou coletivos autônomos — entre 2014 e 2021 foram apreendidos 48,42 toneladas de maconha, portanto, vazou um mínimo estimado de 90 mil toneladas.
A facção optou por não possuir uma estrutura logística própria, terceirizando como empreendimentos individuais ou coletivos autônomos: de mochileiros à caminhões e aviões (que em época de Covid tem ganhado competitividade).
Vinícius Madureira salienta que foi a partir dos presídios que o PCCdominou este que é o maior corredor de escoamento de drogas e ilícitos do Cone Sul — o Rio Grande do Sul e o Uruguai não estão integrados na rota principal por serem regiões onde o Primeiro Comando da Capital ainda enfrenta resistência.
O PCC não venceu a resistência dos diversos e consolidados grupos que atuam nos presídios gaúchos, e assim, não obteve o controle das comunidades e rotas, se mantendo, segundo Vinícius Madureira, apenas “como fornecedor de drogas e facilitador do desenrolar da mecânica criminal na região”.
Essa miríade de facções, grupos e bondes, somados à facilidade de acesso por qualquer criminoso independente aos fornecedores da Tríplice Fronteira, levaram a facção paulista a optar pela cooptação dos grupos locais para concorrer do mercadogaúcho e não a ação das forças de Segurança Pública do estado.
No Uruguai a presença paulista, segundo Vinícius Madureira, é tênue também devido aos grupos locais, mas essa informação destoa de um conteúdo do próprio site InSight Crime:
Vinícius Madureira argumenta que tanto para driblar o cerco policial, quanto por questões estratégicas, o Primeiro Comando da Capital e o Comando Vermelho, buscam ampliar um corredor alternativo: a Rota do Solimões.
O PCC para obter o controle da Rota do Solimõesestruturou núcleos próprios na região Norte e Nordeste integrados a grupos criminosos locais como piratas ribeirinhos, facções e bondes.
A facção conta com aliados poderosos como o Bonde dos 13, mas tem dificuldade de dominar os quase 4 milhões de quilômetros quadrados, área equivalente aos territórios da Índia e do Paquistão somados, com baixa densidade demográfica e precária infraestrutura de transportes e comunicação.
A principal estratégia adotada pelos paulistas é estrangular as fontes de insumos da Família do Norte e do Comando Vermelho, descapitalizando-os, e assim, criando disputas internas que facilitam a tomada de suas quebradas pelas suas células ou aliados locais.
Atualmente, o PCC busca os narcóticos diretamente dos produtores rurais ou seus distribuidores no Peru, na Colômbia e na Bolívia, e entrega o produto acabado para despacho nos portos com destino à Europa e à África, alimentando no caminho o mercado interno do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
Essa disputa de mercado é a razão dos massacres ocorridos nos presídios do Norte e Nordeste do país: COMPAJ do Amazonas, Monte Cristo de Roraima, Alcaçuz do Rio Grande do Norte, Urso Branco em Rondônia, Altamira no Pará, além de mortes nas cadeias, nos centro sócio-educativos e nas quebradas.
A oposição de direita que afirma que o presidente Luis Arce deveria soicitar o apoio da Drug Control Administration (DEA), no entanto o vice-ministro de Substâncias Controladas, Jaime Mamani Espíndola, acredita que seja apenas uma jogada política de grupos políticos visando levar terror para vender uma solução. Dados do Google Trends demonstram que a população não tem levado em conta essa narrativa.
Facção PCC 1533: expansão estratégica
Sem grupos capazes de lhe fazer frente, o PCC cooptou ou eliminou os reticentes, tornando-se hegemônico no tráfico de grandes quantidades de drogas e outros ilícitos — dominando com certa tranquilidade as rotas transnacionais do norte ao sul do país.
Estima-se que apenas a cannabis que circula no Cone Sul, se legalizada, geraria 10 bilhões de dólares anuais — daí o interesse dos grupos criminosos pelo domínio das rotas e de sua não legalização.
Apesar de sua força e influência, a organização paulista sofre oposição do Comando Vermelho e de grupos locais nos estados e países fronteiriços, como o Clan Rotela no Paraguai — havendo uma relação de rivais.
O avanço da facção PCC nos últimos anos foi impulsionado pela criação dessa rede para o atendimento do mercado interno ao mesmo tempo em que o mercado europeu de cocaína se expandia.
Para suprir o aumento do consumo na Europa, a ‘Ndrangheta e outras organizações criminosas europeias buscaram parceiros comerciais estruturados e capazes de garantir o suprimento dessa demanda.
“Os corretores da máfia são tão poderosos que lidam diretamente com o PCC. Traficando da Colômbia, da Bolívia e do Peru, passando pelo Paraguai como rota de trânsito.” — Zully Rolón, ministro da Secretaria Nacional Antidrogas do Paraguai
A parceria entre as duas organizações criminosas possibilitou que a ‘Ndrangheta passasse a hegemonia do tráfico de drogas da América para a Europa com o dominando 80% do fluxo.
Um dos esquemas, tinha como base as esteiras do Terminal do Aeroporto de Guarulhos: as bolsas seguiam pelas esteiras rolantes até a área restrita, onde funcionários aliciados pelo Primeiro Comando da Capital recebiam dos comparsas as fotos com as imagens das malas recheadas com drogas, e as embarcavam para Portugal, França e Holanda, na Europa, e também para Johannesburgo, na África do Sul.
O aquecimento do mercado interno aqui e na Europa deslocou o eixo do tráfico do hemisfério norte para o sul, onde a capacidade investigativa policial e o custo de transporte e produção, que já era menor, se amortizam.
Representantes do Primeiro Comando da Capital na Europa fizeram o “meio do campo” com as organizações criminosas europeias, optando por não atuar diretamente na distribuição para aquele mercado.
Fuminho, segundo Vinícius Madureira, seria um desses corretores autônomos (brokers) que agem em pequenos grupos com grande especialidade e capacidade de fechar grandes negócios.
Facção PCC 1533: o aliciamento das forças públicas
A relação entre as autoridades policiais e o Primeiro Comando da Capital pode se dar através da corrupção ordinária em uma biqueira ou delegacia, durante um flagrante ou de forma contínua com o pagamento do “arrego”.
Índice de Capacidade de Combate à Corrupção 2020 nos países com maior influência da facção Primeiro Comando da Capital:
No entanto, também pode ser coletivo, como nos lembra Steven Dudley lembrando o caso de 2017 onde dezenas de policiais civis do Vale do Paraíba gerenciavam indiretamente através da facção PCC os negócios ilícitos em São José dos Campos.
Dois anos depois desse caso, provou-se que 53 policiais militares da Força Tática do 22º Batalhão de São Paulo estavam a soldo da facção PCC para manter a paz entre as biqueiras e garantir a segurança do comércio na região.
Em todas as regiões é usual a cooptação de policiais para a tomada ou compra de pontos de drogas de concorrentes com a prisão dos donos ou gerentes das biqueiras ou sufocando o acesso dos usuários à elas.
Facção PCC 1533: a mão de obra especializada
A participação de militares, policiais e agentes prisionais na facção é conhecida, mas é pouco explorado o trabalho de dezenas de milhares de outros profissionais de diversas nacionalidades.
Além dos agentes públicos, a logística inclui de norte a sul: transportadoras, aviões e helicópteros próprios ou terceirizados, assim como uma malha de contatos em empresas de transportes ferroviários, aeroportuários, marítimos e fluviais e em aduanas, distribuidoras e entrepostos.
… ou quem sabe coloque até drogas para ser transportado em avião presidencial.
A organização gere US $150 milhões por ano, utilizando-se para lavar o dinheiro: postos de combustíveis, redes de alimentos industriais ou de tratamento dentário, buffets para festas infantis, clubes de futebol, entre outros pequenos negócios.
Grandes valores seguem para as mãos de profissionais como o fazendeiro sul-mato-grossense Antonio Joaquim da Mota que tinha negócios com Sérgio de Arruda Quintiliano Neto, o PCC Minotauro da região da Tríplice Aliança.
Já o repórter Allan de Abreu conta que doleiros como Dalton Baptista Neman faziam uma operação casada para lavar o dinheiro da facção: um comerciante paga um fornecedor na China em Dólar convertido de criptomoeda disponibilizada por um comprador de cocaína na Europa, daí, esse comerciante recebe pela venda da mercadoria vinda da China no Brasil em Reais e então paga o traficante brasileiro que vendeu a droga na Europa.
O chinês Jiamin Zhang se estabelecer no Brás no centro de São Paulo e é o líder de um esquema de lavagem de dinheiro com o uso de criptomoedas que pode ter movimentado bilhões de reais. Ele é acusado de trazer ao Brasil toneladas de cocaína vindas da Colômbia, Bolívia e Paraguai. Do território brasileiro, a droga era enviada para a Europa por portos da região sul do país.
No entanto, as criptomoedas também são utilizadas para lavagem do dinheiro doméstico, como se comprovou com a Operação Mamma Mia da Polícia Federal e da Receita Federal ao investigar uma pizzaria comandada pelos integrantes do Primeiro Comando da Capital que além de massas e queijo para pizzas, comprava criptomoedas e ouro para lavar dinheiro e financiar atividades da facção. — Lucas Caram para o Cointelegraph
Facção PCC 1533: e a escravização sexual nos presídios
O crescimento e a consolidação da facção paulista são consequências visíveis do colapso do sistema prisional brasileiro, que em nove anos quadruplicou a população carcerária.
Em seus pátios, corredores e celas, a ética do mundo do crime foi forjada e implantada pela facção 1533, permitindo o cumprimento da pena com certa dignidade, o que nunca antes fora garantido pelo Estado brasileiro:
Um garoto universitário branco com boa aparência, que entrasse em um presídio até 1996, antes do PCC, era negociado pelo carcereiro ou outro preso e todo mundo sabia a quem ele pertenceria no xadrez.
Pedro Rodrigues da Silva, o Pedrinho Matador, conhece o sistema prisional de São Paulo como poucos. Ele ficou sem ver a rua de 1973 até 2007 e de 2011 até 2018 — viveu mais de 40 atrás das grades e por lá, ele conta que viu mais de 200 presos serem mortos enquanto esteve por lá, sendo que mais de 100 foram ele mesmo que matou.
Viveu no cárcere no tempo do Regime Militar, da redemocratização e dos governos com leve viés progressista, mas mudança mesmo, houve quando a facção paulista despontou como hegemônica, acabando com as diversas gangs e grupos dentro das cadeias e presídios.
Sobre o Primeiro Comando da Capital ele afirmou durante uma entrevista:
“Fui [convidado a entrar no PCC], mas não entrei. Ali é o seguinte: depois que surgiu o partido, você vê que a cadeia mudou. Não morre ninguém porque o partido não deixa. É paz. Paz para a Justiça ver. Se começa uma briga, eles seguram. Eles também ajudam quem sai, arrumam trabalho.”
O Primeiro Comando da Capital impôs a regra de correr pelo lado certo do lado errado da vida, conquistando o respeito do mundo do crime, abrindo caminho para doutrinar cada um dos ingressos no sistema prisional.
A avalanche de aprisionamentos tornou-se uma avalanche de convertidos e replicantes do discurso e da filosofia da facção.
Ninguém é obrigado a se submeter à facção, a servidão é voluntária, e, como descrito por Etienne de La Boétie: ao se colocarem voluntariamente em condição subserviente, fortalecem seus dominadores, que dominarão então mais, realimentando e fortalecendo o processo.
Como Sísifo, condenado a empurrar uma pedra até ao cimo de um monte, e ao chegar vê-la novamente cair montanha abaixo e repetindo esse trabalho por toda a eternidade, o PCC criou e foi criado por um círculo vicioso:
ao oferecer ao encarcerado segurança real e imediata na tranca, gera a perspectiva de que quando livre, ele trabalhará no rendoso mundo do crime para a organização; e
ao oferecer ao criminoso trabalho real e imediato na rua, gera a perspectiva de que quando preso, ele será respeitado dentro das muralhas pelo mundo do crime por pertencer a organização.
O PCC é poderoso por que impõe as regras, ou o PCC impõe as regras por que é poderoso?
Stefen Dudley ressalta que o Primeiro Comando da Capital é uma exceção nas Américas, pois apesar de haverem outros grupos criminosos que atuam dentro dos presídios e nas ruas, nenhum tem a sua magnitude, e cita como exemplo:
MS-13: presente em 6 países, atua com uma estrutura horizontal em células relativamente independentes agregadas torno de regras conhecidas e uma marca forte, mas não tem atuação transnacional; e
Barrio Azteca: nascida no sistema prisional norte-americano, tem uma atuação forte na região fronteiriça com o México em parceria com o Cartel de Juarez, mas tem uma atuação pífia no interior do país.
Facção PCC 1533: criando um atalho para os EUA
O Primeiro Comando da Capital estaria expandindo suas atividades não só para países vizinhos, existiriam tentativas de se associar ao MS-13 de El Salvador, para conseguir uma porta de entrada para o mercado americano via América Central, hoje, a droga brasileira vai primeiro para a África para depois seguir para os Estados Unidos.
O que é mais assustador é que, pela primeira vez, o PCC e o MS13, de El Salvador, particularmente nos últimos meses, estão desenvolvendo relações sérias, especialmente em Puerto Cortés, em Honduras. Pela primeira vez na história, o MS13 está fazendo tráfico de cocaína. Eles nunca lidaram com drogas.
A marca “Primeiro Comando da Capital ou facção PCC 1533” tem força no mercado e respeito entre os integrantes do mundo do crime (seus clientes em potencial).
Ao aderirem a marca, os novos integrantes, sejam individuais ou coletivos como gangues, bondes, e facções locais ou regionais, se comprometem a seguir determinadas regras de conduta:
o criminoso batizado ou companheiro responde pelo Regimento Interno (Dicionário PCC), deve seguir seu Estatuto, acompanhar os salves, e estar em dia com o pagamento da contribuição; e
os coletivos, podem aderir totalmente ao PCC assumindo sua marca e compromissos, ou se aliarem, usufruindo de parte dos benefícios, mas não tendo obrigatoriamente que seguir suas regras de comportamento.
O vínculo do indivíduo só poderá ser quebrado se ele abandonar o mundo do crime, seja: para seguir a vida como trabalhador,por ter se batizado em uma igreja, ou por outro motivo aceito em debate pelas lideranças locais.
Os coletivos podem sair da aliança, mas cada caso é avaliado de acordo com o grau de envolvimento e interesse:
o Comando Vermelho (CV) esteve ao lado do PCC por mais de duas décadas, desde sua fundação até o assassinato de Jorge Rafaat Toumani em 2016, quando houve uma separação tensa e nada amigável — homens que lutaram ombro a ombro passaram a se matar por todo Cone Sul.
Estatuto do PCC de 1997
Facção PCC 1533: Paraguai sucesso ou fracasso?
Camila Nunes Dias atesta que Jorge Rafaat Toumani com seu domínio da Tríplice Fronteira mantinha “uma certa ordem social na região fazendo uma regulação” entre os grupos criminosos e comerciais brasileiros e paraguaios.
Já Vinícius Madureira lembra que o controle de Toumani era intenso, chegando a armar emboscadas e matar integrantes do Primeiro Comando da Capital quando entravam em sua área de influência sem sua autorização.
As lideranças do PCC acreditaram que com a morte de Toumani, os fornecedores independentes de drogas e armas seriam sufocados e dominados, dificultando assim o acesso do Comando Vermelho à Rota Caipira.
No entanto, os planos das lideranças do PCC que executaram Toumani em 2017, foram frustrados pela complexa estrutura sócio econômica do Paraguai, baseada em sua vocação de polo de livre circulação de pessoas, serviços e mercadorias.
Desde o século XIX nação agrega povos e conhecimento, e em uma emaranhada rede internacional de relacionamentos e contatos — essa secular, arraigada e maleável estrutura socioeconômica não se dissolveu com o assassinato de Toumani.
Ao contrário, o vácuo de poder deu lugar a diversos fornecedores independentes a possibilidade dividir e absorver a demanda das facções inimigas do Primeiro Comando da Capital, deixando o quadro ainda mais intrincado.
Fahd Jamil George, o Fuad, outro megatraficante da região da Tríplice Fronteira, conseguiu manter-se independente, mesmo após a morte de Toumani, no entanto, escolheu se entregar às autoridades por medo de ser morto pelos integrantes da facção paulista.
O conflito entre os PCCs da região e os órfãos de Fuad; e a análise das contas de Maria Alciris Cabral, esposa de Minotauro, e dos traficantes Pavão e Galã demonstram o quão ininteligível se tornou a relação entre os diversos grupos criminosos na região.
Para o promotor de Justiça Lincoln Gakiya do MP-SP, com a prisão de Fuad, o PCC Paraguai passou de fase e tendo dominado o mundo do crime começará a atacar as autoridades policiais, políticas e judiciárias.
O pesquisador Bruno Paes Manso e Camila Nunes Dias lembram que a facção carioca já havia tentado a mesma estratégia quinze anos antes, eliminando a família Morel, que até então dominavam a fronteira, mas também sem conseguir consolidar o domínio.
Facção PCC 1533: PRIMEIRO COMANDO DA CAPITAL®
Steven Dudley vê certa similaridade entre a forma com que a facção PCC permite e controla aqueles que agem em nome da facção e o mercado de franquias.
A tensão é da natureza do franchising: o investidor busca maximizar seu capital, aproveitando-se das vantagens oferecidas pelo franqueador, da mesma forma que esse na obtenção de lucro e vantagens do franqueado.
A mesma lógica pode ser empregada no mundo do crime, apesar da facção PCC não ser efetivamente uma franquia — ao se vincular ao nome do Primeiro Comando da Capital, o criminoso ou coletivo passam a usufruir de algumas vantagens:
logística local e internacional: ligando-o às rotas do Paraguai à Colômbia, que atendam a sua região;
credibilidade do produto ou do profissional: não há controle de qualidade por parte do PCC, mas, os ilícitos vendidos ou os serviços prestados são menos questionados;
acesso à trabalhos lucrativos: a facção tem condições de aproveitar os indivíduos ou coletivos em negócios altamente rentáveis;
marca consolidada no mercado: o benefício de ter uma organização forte por trás desestimula concorrentes de disputar o mercado;
treinamento, suporte, financiamento e acesso a equipamentos: disponibilizados de acordo com a demanda do empreendedor, quase sempre terceirizado por outros integrantes do grupo.
Os benefícios desse último item, não fazem parte de um pacote, mas ao aderir à marca, o indivíduo ou coletivo tem o acesso facilitado aos irmãos que os prestam.
A organização criminosa pode ignorar totalmente esses negócios paralelos, ou intermediá-los, se responsabilizando ou não pelo pagamento, ou até, de acordo com o interesse ou necessidade, bancando parcialmente o investimento:
Durante a consolidação do Terceiro Comando Puro (TCP) no Rio de Janeiro, o PCC enviou reforço de homens e armas para garantir suas posições na guerra contra o Comando Vermelho e as milícias.
Assim como um vírus utiliza um agente externo ou uma ação do hospedeiro para passar de um indivíduo para outro, a facção utilizou-se das transferências de presos para passar de unidade prisional para outra.
Esse método de expansão, orgânico, eficaz e aleatório, tornou-se a alma da organização no qual os interesses pessoais dos integrantes e da organização se adequam e se aproveitam com naturalidade aos fatores extrínsecos.
Todo irmão, companheiro ou aliado é autônomo em seus negócios e seus procedimentos, desde que seguindo a ética do crime, sem chefes que determinem: funções, obrigações ou cobrando resultados.
Desta forma, as habilidades individuais são desenvolvidas independente da facção, mas são aproveitadas integralmente por ela.
Quando as forças policiais e a imprensa noticiam a derrubada de um ponto de distribuição ou a apreensão de veículos ou aeronaves da organização, muito provavelmente esses bens são investimentos de um integrante e não da facção.
Cada fração do trabalho é investimento individual ou coletivo: desde as fazendas produtoras e os armazéns distribuidores no Paraguai e na Bolívia, passando pelas rotas de distribuição e exportação no território brasileiro, chegando até as biqueiras que atendem ao consumidor final.
O Primeiro Comando da Capital não possui estrutura própria, e mesmo as atividades administrativas são atividades autônomas remuneradas, como as centrais de comunicação e tráfico de drogas para dentro do presídio — havendo exceções.
A organização possui bens e capital, mas estes são juntados para uma ação ou um fim específico, diferentemente da lógica de acumulação do capital empresarial, podendo ser distribuído após alcançado cada objetivo.
A mesma lógica é aplicada na ações executadas por interesse da organização: irmãos, companheiros e aliados, são convidados a se voluntariar de forma remunerada ou não — podem recusar, mas após a aceitação não podem abandonar a empreitada ou agir de maneira displicente em sua execução:
Dicionário do PCC (Regimento Disciplinar) — artigo 6º
Como qualquer integrante, os cargos dentro da facção, sintonias e disciplinas, tem autonomia em seus negócios particulares, mas quando agem em nome da facção não podem fugir ao procedimento correto ou tomar atitude isolada que possa denegrir a imagem da organização:
Dicionário do PCC (Regulamento Disciplinar) — artigo 4º
O mega assalto da transportadora de valores Prosegur, em Ciudad del Este em 2017, onde uma equipe composta de 40 homens saquearam US $12 milhões, é usado por Vinícius Madureira como exemplo da autonomia dos grupos dentro do Primeiro Comando da Capital.
Ironicamente, o mega assalto se deu no décimo aniversário da declaração dada pelo Ministério Público de São Paulo MP-SP no qual afirmava que “a transferência de 40 líderes da quadrilha para o presídio de Catanduvas, de isolamento total, marca o começo do fim do PCC”.
A facção paulista foi a liga que uniu para o mega assalto profissionais autônomos de diversas regiões dos dois países através de sua rede de relacionamentos e contatos — os empreendedores da operação utilizaram recursos próprios e dessa forma dispensaram o aval da hierarquia para a ação.
O caso do Prosegur deixa claro que a rede de contatos é mais dinâmica, autônoma, e complexa do que as autoridades imaginavam: indo do aviãozinho da biqueira até as principais lideranças das tranças aos residentes no exterior.
Dez anos depois que as lideranças do Primeiro Comando da Capital foram isoladas, e após um grande esforço para barrar a entrada dos celulares nos presídios paulistas, a facção provou que reinventou sua rede de network.
Facção PCC 1533: o caixa da organização criminosa
Os integrantes pagam uma parcela dos seus lucros para a organização e o responsável pela cobrança é o irmão da cebola, que também vende números da loteria interna do Primeiro Comando da Capital.
Os fundadores da facçãoimplantaram o conceito da função social do tributo ao PCC. A organização passou a ser vista como o ente em condições de gerir adequadamente os recursos arrecadados pelo bem comum da comunidade do mundo do crime.
Os valores aferidos financiam lotes de drogas e armas, e outras atividades para o crescimento e manutenção da facção, como o pagamento de advogados e funcionários públicos ou privados essenciais para o funcionamento da estrutura.
Diferentemente dos negócios privados ou de outros grupos criminosos, o lucro das operações não fica com os líderes ou investidores, devendo ser aplicados em benefício das demandas e dos mais necessitados do mundo do crime:
operações de resgate de presos,
domínio e pacificação de regiões de influência;
apoio de transporte as famílias que visitam os presos; e
indenização aos familiares de criminosos que foram mortos em ações de interesse da organização.
O desvio de finalidade do capital pago pelos integrantes é severamente punido. Gegê do Mangue e Cabelo Duro (Wagner Ferreira da Silva), foram alguns líderes que teriam morrido por usarem em benefício próprio dinheiro da facção.
Cabelo Duro chegava a lucrar 450 milhões de Reais todo o ano, mas mesmo com toda essa grana e poder, depois das mortes de Gegê e de Paca, ele percebeu que o próximo a ser morto pela facção.
Não deu outra. Integrantes sequestraram Nado que era de toda confiança de Cabelo Duro, desbloquearam o celular dele e usaram para chama-lo para o flat do Tatuapé, onde armaram uma casinha: Cabelo Duro foi metralhado e fala-se que nesse mesmo dia Nado foi decapitado e enterrado em região de favela.
O mundo dá voltas, Gegê e Paca foram mortos por Cabelo Duro, Cabelo Duro foi morto por Galo, Galo foi fuzilado na Zona Leste de São Paulo… — Luís Adorno para o R7
Facção PCC 1533: sobrevivendo onde outros pereceram
A rápida expansão do Primeiro Comando da Capital se deu graças a essa estrutura horizontal, permeável e multifacetada, que permitiu sua integração a outros grupos criminosos locais ou regionais: gangues, bondes, e facções.
Grupos criminosos tentam copiar o modelo, mas ao se expandirem e formarem alianças, perdem a coesão, se dividem, e partem para o fratricídio, colapsando por terem se organizado em torno de seus líderes ou grupos, e não sobre ideais e regras claras.
O Comando Vermelho, a mais antiga facção brasileira, falhou em se consolidar como força nacional, pois ao contrário da facção paulista que se estruturou em torno de pessoas e não de um ideal, baseando o seu crescimento na conquista física de territórios e não nas mentes e nos corações de seus integrantes.
Steven Dudley também vê similitude entre grupos terroristas e o PCC, já que ambos “fazem muitos recrutamentos dentro do sistema prisional” e possuem “uma ideologia que tem que ver com as diferenças de classes e a injustiça que existe no mundo”.
Todos concordam também que terroristas e PCCs utilizam-se de métodos e modus operandi semelhantes e utilizam o medo como ferramenta estratégica para a captação ou para circulação de recursos ilegais, assim como, utilizam-se de “métodos criminais para adquirir o financiamento necessário [para alcançar seus objetivos ideológicos]”.
Mas diferem na fonte de seus recursos e sua aplicação:
Enquanto grupos terroristas buscam financiamento e recrutamento através de simpatizantes, a organização criminosa obtém recursos através de ações criminosas autônomas nas quais seus filiados visam seu ganho pessoal.
Também diferentemente dos grupos terroristas, não fica com o butim das ações criminosas para realimentar-se: os criminosos ficam com o lucro das ações cedendo uma parcela, como um imposto sobre o lucro obtido, que deve ser aplicado pela facção em benefício das demandas e dos mais necessitados.
A fronteira entre um e outro grupo, como tudo no Mundo Líquido de Zygmunt Bauman, está se dissolvendo, se já não se dissolveu e apenas não nos demos conta disso.
Michael Fredholm enumera e discorre a respeito de uma dezena pontos nebulosos que separam os dois grupos, explicando que não há uma resposta simples para a pergunta:
“O Primeiro Comando da Capital (PCC 1533) é uma organização terrorista ou uma facção criminosa?”
Vera Lúcia Monteiro da Mota Melo alerta para o risco de ao confundirmos um grupo terrorista com um grupo criminoso abrirmos campo para o desrespeito dos direitos:
Facção PCC 1533 do futuro aos brasileiros pertencerá?
Pesquisadores do InSight Crime analisaram a mecânica do crime organizado transnacional através do processo de expansão da facção criminosa brasileira Primeiro Comando da Capital.
Às informações passadas por Steven Dudley, Vinícius Madureira, e Camila Nunes Dias somadas a outras me deixam a dúvida se a facção paulista, tal qual a conhecemos, não está prestes a acabar.
Desde suas mais remotas origens até poucos anos atrás, a cúpula do Primeiro Comando da Capital era formada por uma massa disforme de presos oriundos das periferias das grandes cidades.
Por puro preconceito, os operadores da polícia, da mídia, da Justiça, e a população em geral, desacreditaram que uma empresa com todo esse poder pudesse ser gerenciada por essas pessoas simples de dentro dos presídios.
No entanto, mesmo antes, mas principalmente após a pandemia da Covid-19, esse controle estava se alterando, passando cada vez mais a grupos especializados que manipulam a massa carcerária e dos criminosos nas ruas.
Não é possível que os negócios internacionais sigam sob um domínio que não o mesmo do abastecimento interno, e este por sua vez se interliga a todo o mundo do crime: do furto e assaltos ao tráfico de armas e pessoas.
Quando Camila Nunes Dias e Vinícius Madureira chamaram a atenção para o fato de que cada vez mais as decisões estratégicas e operacionais estão deixando os presídios para se concentrar nas mãos de empresários e da nova elite do PCC, colocaram uma pulga atrás de minha orelha.
Para Vinícius a questão é simples: haverão integrantes da facção capazes de ultrapassar essa nova fase da transnacionalização, a qual exige expertise em comércio e logística internacional — com domínio de línguas estrangeiras?
Mas, para mim, acendeu um sinal de alerta: qual a consequência para a política, a Segurança Pública, e para as comunidades se a facção deixar de atuar como defensora dos interesses difusos e dos negócios de seus integrantes e dos encarcerados, para ser uma facção com poder concentrado nas mãos de empresários, políticos e poucos líderes, que podem negociar o controle da organização criminosa para grupos estrangeiros, que, mesmo indiretamente passassem a ter sob suas ordens dezenas de milhares de integrantes armados?
Se houvesse mais armas nas ruas, ele colocaria outra no lugar, “tomaria um salve para aprender”, e seguiria sua vida — como vi isso algumas vezes.
Sinto saudades daquele lugar, da pequena ponte sobre o córrego, onde os garotos aguardavam de sinaleiros, e dos cavalos que pastavam sossegados no meio do capim gordura — talvez fosse vê-los o que me acalmava.
Dificilmente alguém me trás boas lembranças, mas ao ler o trabalho de André,revivi aquele dia e me senti de volta naquele lugar. Devo isso a ele.
Em um país sem controle sobre as armas
Houve um tempo onde as armas sobravam nas mãos de policiais, civis, e criminosos.
Viaturas policiais com armas frias, tanto para o uso ilícito dos próprios policiais como para entrouxar em algum desafeto.
Traficantes com armas frias, tanto para sua segurança pessoal e de seu negócio como ferramenta de convencimento nas cobranças.
Hoje, no entanto, é raro a polícia paulista andar com arma fria mocosada na viatura, assim como são raríssimas as abordagens que encontram indivíduos armados, principalmente em biqueiras, e são milhares de abordagens diárias.
As armas curtas foram controladas tanto pela aprovação do Estatuto do Desarmamento de 2003 durante o governo Lula quanto por ordem do Primeiro Comando da Capital (PCC).
O Estado retirou as armas das ruas para diminuir a taxa de homicídio, e o PCC para acabar com as guerras entre as biqueiras dentro das comunidades.
Assim como o governo, as lideranças da facção PCC 1533 perceberam que esse genocídio é ruim para a sociedade e para a economia, exceto para os fabricantes de armas e seus defensores.
PCC e Bolsonaro no lucrativo mercado de armas
Assim como um vírus, a organização criminosa Primeiro Comando da Capital evolui exponencialmente e já se prepara para atuar em um mercado de armas com menor custo e maior oferta e demanda.
André, citando Evan Ellis e Daniel Sansó-Rubert, explica essa mudança na dinâmica nos negócios de armas curtas ilícitas:
Índice de Capacidade de Combate à Corrupção 2020 nos países com maior influência da facção Primeiro Comando da Capital:
Sei que não existe corrupção no governo, principalmente por parte de Bolsonaro e seus filhos, e que com certeza eles nada recebem do mercado internacional de armas, que movimenta anualmente 80 bilhões de dólares.
Se estivessem, seria o que se chama de “corrupção sistêmica”, aquela na qual o agente público de alto escalão cria situações que facilitam em larga escala a atuação das organizações criminosas.
Bolsonaro aplica na política de armas a mesma lógica que aplica na gestão da Saúde: apostar no que acredita e no que agrada suas bases eleitorais independentemente dos resultados.
Existe um consenso internacional de que a diminuição do número de armas nas mãos da população tem influência direta no número de vidas poupadas, e no Brasil essa tendência se confirma.
A flexibilização da lei de armas do governo Bolsonaro fragiliza ferramentas que funcionam e estão sendo aperfeiçoadas há 25 anos: o “Sistema Nacional de Armas” (SINARM) e o”Sistema de Gerenciamento Militar de Armas” (SIGMA).
O governo federal, ao turbinar o mercado legal de armas e de segurança privada, impactará o mercado ilegal:
O Primeiro Comando da Capital e a flexibilização da lei de armas
As grandes organizações de tráfico internacional de armas, interessadas em investir nesse mercado, ampliarão as parcerias já existentes com o Primeiro Comando da Capital, que domina uma sofisticada estrutura de distribuição, com rotas estabelecidas com coparticipação de agentes públicos.
Para a facção PCC 1533, o custo operacional para o contrabando internacional de armas ainda é alto, precisando manter agentes nos órgãos policiais e de fiscalização para garantir o fluxo com menor índice de perdas.
Diversas rotas trazem as armas oriundas de diversos países fronteiriços, principalmente do Paraguai, ao sul, e da Venezuela, ao norte, mas também dos Estados Unidos, tanto pelos portos e aeroportos quanto pela Bolívia.
Além do apoio dos agentes públicos, as rotas geridas pelo Primeiro Comando da Capital incluem transportadoras, aviões e helicópteros próprios ou terceirizados, assim como uma malha de contatos em empresas de transportes ferroviários, aeroportuários, marítimos e fluviais e em aduanas e entrepostos.
Essa pesada estrutura não supre totalmente uma organização criminosa de estrutura gramínea, como a facção PCC 1533, e seus integrantes individualmente procuram soluções para seu próprio abastecimento:
militares e policiais desviam dos paióis;
empresas de segurança privada (de fachada ou por furto e roubo nas armarias);
contrabando, tanto o de poucas unidades em larga escala quanto em lotes maiores mas de forma independente;
furto e roubo de particulares em residência e comércio — em menor escala após a Lei do Desarmamento, mas com a flexibilização retomará seu volume e importância.
Em um país sem controle sobre os políticos
Interesses políticos impedem que haja um controle sobre o fluxo de dinheiro: da mesma forma que a família Bolsonaro consegue comprar dezenas de imóveis com dinheiro vivo, dinheiro legal, é claro, e a facção paulista também o faz.
Regras que acompanhassem, com eficiência, o dinheiro impediriam que tanto um deputado brasileiro quanto o sobrinho de Pablo Escobar em Barueri tivessem o trabalho de ter que ventilar seu apartamento para não embolorar as notas.
A infraestrutura de distribuição do Primeiro Comando da Capital se soma aos interesses políticos em um menor controle na circulação de armas e dinheiro vivo (agora com notas de 200 Reais) e a criação de entraves para o funcionamento dos mecanismos federais de controle de atividades financeiras.
O garoto de Sorocaba pegou a arma do mocó em um momento em que não se encontram armas com facilidade para substituir, se bem que o preço no mercado ilegal é mais baixo do que no legal.
A mão invisível de Adam Smith sumiu com as armas das ruas, mas seu valor de venda não subiu, pois o risco de tê-las e as altas penas impostas para quem for pego com elas desestimularam a busca pelo produto, confirmando a eficácia da teoria smithiana de mercado.
No imaginário popular, os integrantes do PCC estão montados em armas, mas não é bem assim: elas estão pulverizadas ou sob o controle dos responsáveis pelos paióis — certa vez conheci um deles, mas foi outra história.
Há muito não vou para Sorocaba, menos ainda para o Jardim Marli. Devo a André o recordar de boas lembranças — juro que enquanto escrevo, sinto a brisa, o cheiro e paz daquela quebrada.
Detalhes do funcionamento da parceria PCC TPC, apareceram com a indicação de um integrante da facção paulista para a posição de sintonia em um presídio carioca.
a descentralização, pois a princípio “Barone” não responderia ao “sintonia do estado do Rio de Janeiro” ou ao “sintonia geral das trancas do Rio de Janeiro”, apesar de se esperar que aja de acordo com os princípios gerais desses e dentro de um conjunto de regras e cadeias hierarquias; e
a ele é atribuída a maioria das ações que devem ser tomadas dentro de sua área de influência, sendo que ele sequer era oriundo do núcleo central do PCC, o estado de São Paulo, e nem do Rio de Janeiro onde chegou para atuar, morava em Belém do Pará e foi indicado pelo sintonia de Pernambuco! A esse emaranhado de relacionamentos e divisão de poderes e funções, Steven Dudley dá o nome de “desorganização”; já eu chamo de “metodologia do caos”.
Trechos do Habeas Corpus de Barone:
“… estabelecer no Estado do Rio de Janeiro uma extensão da organização criminosa acima referida, através de estruturas secundárias denominadas ‘sintonias’ “;
“o Rio de Janeiro já tá pronto” e “fecha em Minas Gerais, Rio de Janeiro,Espírito Santo, Brasília, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul” — afirmou um dos envolvidos segundo uma escuta telefônica.
“… tráfico de armas e munições e tráfico de entorpecentes, concentrando as atividades ilícitas no Complexo de Gericinó, em especial nas unidades prisionais Esmeraldino Bandeira; Edgard Costa; Benjamim de Moraes e Bangu IV.”
“ [ele] integraria a “Sintonia Pernambuco” e [foi apresentado pelo] responsável pela “Geral do Estado da Externa de Pernambuco”.
“Primeiro Comando da Capital conta com ‘normas estatutárias e disciplinares, estabelecendo funções específicas para cada um dos integrantes ou grupo de integrantes’ ”.
A desordem da estrutura do PCC é seu maior mérito, gerando altas taxas de mutação e evolução rápida e eficaz — mesmo que à custa de muitas perdas.
Steven Dudley, em artigo publicado no site InSight Crime, que analisa e descreve processos criminais, chegou à conclusão que, ao contrário das principais organizações criminosas, o Primeiro Comando da Capital não desenvolveu um sistema organizacional ordenado e estável.
Steven está coberto de razão.
Na Família 1533, um garoto que ganha moral no mundo do crime, por vezes sequer sendo irmão batizado, pode ser convidado a um cargo de liderança — só então se batizando para assumir a posição.
Esse novo personagem carrega consigo, uma nova e única visão, fruto de suas experiências pessoais e profissionais de dentro e de fora do mundo do crime, assim como uma rede pessoal de contatos.
Essa imprevisibilidade causa mudanças constantes na estrutura local, com impacto a longo prazo para o conjunto da organização, e cega as autoridades que se dedicam ao seu entendimento e caça.
Uma única espécie de vírus pode possuir milhares de cepas com estruturas muito diferentes entre si, e quando os infectologistas obtêm sucesso no combate de um grupo, outros tantos lhes serão imunes, e estarão se disseminando e evoluindo — e assim é com o Primeiro Comando da Capital.
O louvável sucesso alcançado pelo Ministério Público de São Paulo (MP-SP) no combate à estrutura da facção criminosa teve um impacto positivo para a sobrevivência, a longo prazo, da organização ao impedir que ela tivesse uma estrutura uniforme, e assim como o bambu: verga, mas não quebra.
A esse emaranhado de relacionamentos e divisão de poderes e funções, Steven Dudley dá o nome de “desorganização”; já eu chamo de “metodologia do caos”.
O Primeiro Comando da Capital (PCC) costuma ser considerado a facção criminosa mais poderosa do Brasil, mas um recente processo judicial contra integrantes da facção traça uma imagem que desmente a reputação do grupo como uma organização criminosa transnacional estrita e hierárquica.
No caso, que foi apresentado em 2018 por procuradores do Estado de Mato Grosso do Sul, localizado na região centro-oeste do Brasil, 30 pessoas são acusadas de serem integrantes do Primeiro Comando da Capital.
Os réus foram acusados de tráfico de armas, venda de entorpecentes, lavagem de dinheiro e uso de menores para cometer atos criminosos. O grupo operava uma série de pequenas redes, que os promotores repetidamente chamavam de “núcleos” do PCC. Na realidade, um núcleo pode ser formado por membros do PCC ou uma mistura de membros, sócios e parentes.
* Esta história faz parte de uma investigação de dois anos do Centro de Estudos Latino-Americanos e Latinos (CLALS) e do InSight Crime no PCC. A série completa será publicada entre 11 e 18 de dezembro. Leia o relatório completo aqui ou baixe-o da Social Science Research Network.
Um dos crimes mais citados durante o caso foi a venda de drogas.
A polícia e os promotores apresentaram inúmeras gravações telefônicas no tribunal, nas quais vários réus falam sobre vendas de drogas. Em uma das gravações, Dagner Saul Aguilar Gil, vulgo “Pacho”, integrante do PCC preso em Mato Grosso do Sul, organiza a venda de meio quilo de “óleo” (TK) e 100 gramas de “pó” (pó ou cocaína) de uma pessoa identificada como Marcos Ferreira da Silva, vulgo “Praia”. Os dois já haviam feito negócios e, durante o telefonema, Ferreira insiste com Aguilar que é o mensageiro, e não ele, quem deve carregar a droga: “Mande a droga assim [por meio de um mensageiro]”, diz Ferreira, “porque é assim Eles estão seguros, então não se perdem, entendeu?”
A polícia ouviu a conversa e o mensageiro foi pego.
Algo que aparece no caso como uma característica distintiva do PCC é que Aguilar também administrou veículos roubados e manteve contato com uma presidiária, Odete, que, junto com Ferreira, obteve armas para o grupo. Enquanto, por outro lado, a filha de Odete abriu contas bancárias para a organização.
Na verdade, parece que cada um dos núcleos do grupo opera vários empreendimentos criminosos. Ao contrário de muitos grupos criminosos transnacionais, que estão envolvidos em um pequeno número de negócios ou confiam tarefas a vários especialistas, a facção paulista parece estar disperso em muitas tarefas diferentes.
O primeiro núcleo citado no caso contava com um mototaxista que levava drogas para seu filho, integrante do PCC na prisão. Parte desse núcleo foi presa em um apartamento onde o grupo guardava armas de alto calibre.
O dono daquele apartamento, dizem os promotores, era um preso que, além de administrar o depósito de armas, era a “sintonía geral do estado e do país”, o que significa que era responsável pela catalogação dos integrantes da organização criminosa.
Embora seja uma gangue carcerária, o PCC talvez seja a organização criminosa mais burocrática da região. Ele mantém registros de seus membros, suas famílias, seus patrocinadores e a jornada dos membros dentro do grupo.
Práticas contábeis rígidas e referências à hierarquia PCC geralmente as denunciam. Os promotores do caso Mato Grosso do Sul, por exemplo, conseguiram mostrar que vários réus eram integrantes da organização — o que é crime no Brasil — por se referirem a um “padrinho”, como é conhecido o patrocinador [aquele que apresenta e se responsabiliza por um convidado a ingressar na facção — nota do tradutor], ou a um “general”, líder ou “gerente” do grupo.
Por exemplo, um integrante do primeiro núcleo citado no caso diz ao pai, o mototaxista, que ele é o “gerente da região Norte”, o que para o Ministério Público significa que ele é o responsável por todas as operações do tráfico de armas e drogas na região norte do estado.
Os policiais afirmam que outro dos acusados é o “gestor do estado de Rondônia”, o que segundo eles confirma que o homem controla o “batismo” dos novos membros no estado vizinho, bem como a estratégia expansiva do PCC e seus enfrentamentos com rivais em Rondônia, um corredor estratégico para receitas de drogas e mineração ilegal da Bolívia e Venezuela.
Além disso, o caso faz inúmeras referências à “disciplina”, como são conhecidos os responsáveis pela aplicação das regras na organização, principalmente no que se refere à cobrança de “dívidas” de associados que traficam drogas. E as ameaças não são em vão.
“Aproveitei o fato de ter me encontrado [com a pessoa] e assediado [ele]”, conta um réu a outro em conversa interceptada, referindo-se às ações iminentes de uma “disciplina” do PCC contra um devedor.
Mas embora haja indícios de estruturas de poder verticais que exercem controle estrito sobre os membros da facção, o que é mais percebido no caso é uma organização pouco coesa que tende a usar redes amplas para fazer negócios nos quais eles são inexperientes, o que tem custos para eles.
Sem dúvida o melhor exemplo deste último é o caso de Tânia Cristina Lima de Moura. Considerado o “braço direito” de um dos integrantes do PCC 1533 na prisão, Lima de Moura abre contas bancárias em nome da filha e do neto do integrante da gangue, que, segundo os promotores, tinha na época cerca de 10 anos. e movimenta mais de 50.000 reais (cerca de US $ 9.000) nessas contas. Ela também troca caminhões roubados por drogas, prática comum no PCC, e organiza a transferência de drogas de Mato Grosso do Sul para Campinas, uma das principais cidades do estado de São Paulo. Lima de Moura foi capturada em junho de 2018.
Em outro exemplo, o PCC usa um menor para transportar maconha de ônibus. O menor é detido no caminho e preso com drogas e um celular LG que a facção paulistalhe deu para se comunicar. Em outro caso, em uma gravação telefônica, um líder da organização é ouvido na prisão, furioso porque outro menor foi preso por não esconder adequadamente as drogas que estavam coladas em seu corpo.
“Olha [o que acabou de acontecer], paguei 4,5 mil reais o quilo da vagabunda, e o menino acabou sendo um fiasco”, diz o líder da gravação.
Mesmo os profissionais que o PCC usa cometem erros bobos. Um guarda que a quadrilha emprega para extrair informações está envolvido no caso contra o grupo porque não escondeu que utilizou o sistema interno de informática da polícia – Sistema de Gestão Operacional Integrado (SIGO) – para conhecer os processos contra integrantes do Primeiro Comando da Capital.
Em seu veredicto, a juíza reconhece diferenças entre os integrantes da facção criminosa, como “operadora”, “lacaio“, e o que poderia ser chamado de “nenhuma das anteriores“. Dos 30 membros acusados, 23 foram condenados.
* Esta história faz parte de uma investigação de dois anos do Centro de Estudos Latino-Americanos e Latinos (CLALS) e do InSight Crime no PCC. A série completa será publicada entre 11 e 18 de dezembro. Leia o relatório completo aqui ou baixe-o da Social Science Research Network.