PCC e sua estratégia militar: este trabalho foca no estatuto da facção, não em suas ações, analisando as táticas aplicadas desde sua criação.
Explorando o Estatuto do PCC e sua estratégia militar
No estudo do Estatuto do Primeiro Comando da Capital (facção PCC 1533), é possível identificar pontos que lembram a doutrina militar. Apesar disso, o PCC nunca teve como objetivo ser um grupo militar, mas sim um grupo civil, cujo foco inicial foi o fim da opressão no sistema carcerário.
Ressalto mais uma vez, esse artigo não se debruçou sobre a realidade na qual se tornou o Primeiro Comando da Capital, mas simplesmente está analisando o Estatuto de fundação da organização criminosa pelo prisma das doutrinas militares.
Nesta análise, foram citados os itens do Estatuto do PCC referentes ao período de 2007 a 2017, e não ao Estatuto original de 1997. Embora contenham os mesmos itens, o detalhamento nos documentos difere entre as versões.
Táticas militares no contexto do crime
Ao analisar os documentos de 1997 e de 2017, encontro em diversos ítens descrição do PCC e sua estratégia militar. Mesmo assim, elas estão adaptadas ao crime organizado. São conceitos presentes: hierarquia, disciplina, objetivos, unidades, adaptação, expansão territorial e alianças. Isso mostra que a facção soube aplicar estratégias eficientes em suas ações.
Hierarquia e disciplina
Na minha análise do Estatuto do Primeiro Comando da Capital, percebi que a organização possui regras e uma estrutura hierárquica que refletem a importância da ordem e da disciplina, assim como nas doutrinas militares convencionais:
- Item 3: Aborda a importância da hierarquia e disciplina dentro da organização, ressaltando que todos os integrantes têm o direito de expressar suas opiniões, mas também o dever de respeitar as opiniões alheias e seguir a estrutura hierárquica estabelecida.
- Item 9: Enfatiza a importância da lealdade e comprometimento com a organização, mencionando que aqueles que demonstrarem desinteresse pela causa após usufruírem dos benefícios do PCC podem ser considerados traidores e sofrerem consequências graves.
- Item 10: Esclarece que a Sintonia Final é uma fase da hierarquia do PCC composta por integrantes que foram indicados e aprovados pelos membros da Sintonia Final. A Sintonia Final tem como objetivo lutar pelos ideais do PCC e pelo crescimento da organização.
- Item 12: Estabelece que o PCC não possui limite territorial, e todos os integrantes batizados, independentemente de onde estiverem, devem seguir a disciplina e hierarquia do Estatuto.
- Item 14: Declara que todos os integrantes serão tratados com igualdade, e seus méritos e atitudes serão avaliados, dando prioridade àqueles que merecem.
- Item 15: Ressalta que os ideais do PCC estão acima dos conflitos pessoais e que a organização será solidária com os integrantes que estiverem em desvantagem para resolver seus problemas pessoais, desde que estejam agindo de acordo com os ideais do PCC.
- Item 18: Determina que todos os integrantes têm o dever de agir com severidade em casos de opressões, assassinatos e covardias realizados por agentes do estado ou inimigos, demonstrando a importância da disciplina e lealdade à organização durante as missões.
Ao comparar o PCC e sua estratégia militar com as doutrinas militares convencionais, observei que ambas enfatizam a importância da hierarquia, disciplina e lealdade para o funcionamento eficiente e tomada de decisão dentro de suas respectivas organizações.
Objetivos claros e foco na missão
As doutrinas militares enfatizam a importância de estabelecer objetivos claros e manter o foco na missão. Isso garante que as operações militares sejam eficientes e eficazes, alcançando os resultados desejados com o mínimo de recursos e tempo necessários. A clareza dos objetivos e o foco na missão são fundamentais para garantir que todos os membros da força militar estejam alinhados e trabalhem em conjunto para cumprir sua missão.
Ao analisar o Estatuto do PCC, identifico alguns aspectos semelhantes relacionados ao estabelecimento de objetivos e foco na missão. O Estatuto define objetivos específicos, como lutar pela liberdade, justiça e paz (Item 2), além de melhorar as condições prisionais. Essa abordagem é semelhante ao planejamento de missões militares, onde os objetivos são claramente estabelecidos e as ações são planejadas para atingir esses objetivos.
Outros aspectos do Estatuto que demonstram foco na missão incluem:
- Item 7: Ressalta o dever de todos os integrantes em colaborar e participar dos “progressos” do Comando, contribuindo para o sucesso das missões.
- Item 10: Descreve o papel da Sintonia Final, que deve orientar a tropa em busca dos objetivos.
- Item 11: Enfatiza a responsabilidade dos integrantes em cumprir missões designadas, garantindo que todos estejam alinhados e comprometidos com os objetivos da organização.
- Item 12: Destaca a intenção do PCC de expandir suas operações e influência além das fronteiras geográficas, evidenciando a ambição de expansão territorial da organização criminosa.
PCC e sua estratégia militar apresenta aspectos semelhantes às doutrinas militares convencionais no que diz respeito ao estabelecimento de objetivos claros e foco na missão. A organização define objetivos específicos e mantém uma estrutura hierárquica e disciplinada para garantir que todos os membros trabalhem juntos para alcançar esses objetivos. Embora os contextos e as finalidades do PCC e das forças militares sejam distintos, a importância do foco na missão e dos objetivos claros é evidente em ambos os casos.
Unidade e cooperação nas doutrinas militares
Nas doutrinas militares, o conceito de unidade e cooperação é fundamental para o funcionamento eficiente e eficaz das forças armadas. A cooperação entre diferentes unidades e ramos das forças armadas é crucial para realizar operações conjuntas e alcançar os objetivos estabelecidos.
- O item 2 do estatuto do PCC estabelece objetivos que refletem a missão da organização e seu foco nas atividades, incluindo a luta pela paz, justiça, liberdade, igualdade e união. Embora o contexto e os objetivos sejam diferentes das doutrinas militares, o conceito de unidade e cooperação é semelhante na medida em que ambas as organizações buscam alcançar seus objetivos através da colaboração e do trabalho conjunto entre seus membros.
- No caso do PCC, a ênfase na união é explicitamente mencionada no item 2 e também no item 10, que descreve a Sintonia Final como uma instância que visa lutar pelos ideais do Comando e pelo crescimento da organização. A Sintonia Final é um exemplo de como a estrutura do PCC promove a unidade e a cooperação entre os membros, já que os integrantes são indicados e aprovados pelos “irmãos” que fazem parte da Sintonia Final.
Embora as doutrinas militares e o Estatuto do PCC estejam em contextos diferentes e tenham objetivos distintos, o conceito de unidade e cooperação é fundamental para o funcionamento eficiente e eficaz de ambas as organizações. A colaboração e o trabalho conjunto entre os membros são cruciais para alcançar os objetivos estabelecidos tanto nas doutrinas militares quanto no Estatuto do PCC.
Adaptação e resiliência
No Item 4, o estatuto menciona a necessidade de os integrantes manterem contato com a “Sintonia” de sua área, sempre estarem à disposição do Comando e mostrarem empenho e união. Essa disposição indica uma adaptação às diferentes situações e a capacidade de se recuperar de adversidades.
Além disso, o Item 5 destaca a importância da dedicação ao Comando e da participação em projetos que visem criar soluções para o desamparo social e financeiro dos integrantes, demonstrando resiliência e adaptação às necessidades dos membros da organização
Delimitação, expansão e consolidação e domínio territorial
Nas doutrinas militares, a expansão e o domínio territorial são frequentemente abordados no contexto de estratégias nacionais e objetivos geopolíticos. Isso envolve o emprego de forças militares para proteger os interesses nacionais, garantir a segurança das fronteiras e, em alguns casos, estender a influência política e econômica de uma nação.
As forças militares desempenham um papel fundamental na manutenção e expansão do controle territorial, seja por meio de ocupação direta ou por meio do apoio a aliados e parceiros regionais, e no caso da facção, essa ação foi prevista pelo PCC e sua estratégia militar:
O Item 12 do estatuto do PCC afirma que a organização não possui limite territorial e que todos os integrantes batizados fazem parte do PCC, independentemente de cidade, estado ou país. Essa afirmação indica a intenção da organização de expandir suas operações e influência além das fronteiras geográficas, destacando sua ambição de expansão territorial.
A ideia de expansão e domínio territorial do PCC pode ser comparada em alguns aspectos às previstas nas estratégias militares. No caso da organização criminosa, a expansão territorial se manifesta na intenção de estender sua influência e atividades criminosas além das fronteiras locais e regionais. Isso pode incluir o estabelecimento de redes de tráfico de drogas, armas e outros bens ilícitos em outras áreas geográficas e a colaboração com outros grupos criminosos fora de sua área original de atuação.
Alianças e inimigos:
As doutrinas militares tradicionais abordam os conceitos de aliados e inimigos com base em critérios geopolíticos e ideológicos, geralmente em um contexto de defesa nacional e cooperação internacional. No caso do Estatuto do Primeiro Comando da Capital (PCC), a análise dos itens apresenta alguns aspectos similares e divergentes desses conceitos.
No Item 12 do Estatuto, como mencionado em sua análise, fica claro que o PCC busca expandir suas operações e influência além das fronteiras geográficas, destacando sua ambição de expansão territorial. Essa estratégia, de alguma forma, é análoga ao conceito de alianças entre nações, embora não se trate de cooperação entre Estados, mas sim de uma organização criminosa.
Os aliados do PCC são indicados no Item 13, que estabelece que a organização não tem coligações com outras facções, mas vive em harmonia com facções de outros estados. No caso de algum integrante de outra facção chegar em uma cadeia dominada pelo PCC, este será tratado com respeito e receberá apoio, e espera-se o mesmo tratamento para os integrantes do PCC em cadeias dominadas por outras facções amigas.
Os inimigos do PCC são descritos no Item 18, que determina a ação com severidade em cima de opressões, assassinatos e covardias realizadas por Policiais Militares e a máquina opressora. A organização criminosa busca dar respostas proporcionais às ações de seus inimigos, pagando vida com vida e sangue com sangue.
Em resumo, o Estatuto do PCC aborda o conceito de aliados e inimigos de maneira diferente das doutrinas militares tradicionais, mas ainda assim apresenta uma estrutura que busca expandir a influência da organização e estabelecer relações de cooperação ou confronto com outros grupos.
Decreto: pena de morte para traidores
O Código Penal Militar (Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969) estabelece em seu Capítulo II, Artigos 355 a 359, os crimes de traição em tempo de guerra, que incluem traição, favorecimento ao inimigo, espionagem, auxílio à espionagem e revelação de segredo a inimigo. A pena de morte pode ser aplicada em casos específicos de traição e favorecimento ao inimigo conforme o Art. 355 e Art. 356, algo que no Estatuto do Primeiro Comando da Capital está previsto (ítem 9) com o nome de “decreto”: “traição é morte”.
Tanto na legislação brasileira quanto no Estatuto da facção PCC 1533, as penas capitais são exceção e devem ser aplicadas em caso de guerra, a questão é que a organização criminosa paulista se vê em Estado de Guerra desde sua criação, seja contra o estado opressor ou grupos criminosos inimigos.