Mito ou realidade Corinthians Paulista e o Primeiro Comando?
Vincular o Corinthians Paulista com o Primeiro Comando da Capital me parece mais preconceito social que fato.
Meu caro Francesco Guerra,
Bem sabe que não estou mais disposto a me dedicar ao estudo da organização criminosa PCC 1533.
No entanto, ao abrir meu note deparo-me com uma situação intrigante.
O site The Football Lovers, especializado em artigos baseados em opinião, escritos por apaixonados fãs de futebol de todo o mundo, alega que sete clubes estão ligados ao mundo do crime:
- Juventus e Lazio da Itália;
- Leeds United e Sheffield Wednesday da Inglaterra;
- Boca Juniors da Argentina; e
- Corinthians do Brasil.
Os crimes do Corinthians Paulista
O autor do artigo, Shimil Umesh, lembra que o Corinthians foi implicado no escândalo de corrupção da FIFA em 2015, com alegações de suborno e propinas envolvendo vários dirigentes de alto escalão.
No entanto, a principal acusação seria envolvimento da agremiação futebolística com o Primeiro Comando da Capital.
É fato que, conforme divulgado pela mídia, existe base para levarmos em consideração a possibilidade de que tais informações sejam verdadeiras.
No entanto, precisamos estar atentos às fontes e à veracidade dos fatos antes de tirarmos conclusões precipitadas.
É preciso investigar a fundo cada uma dessas alegações e obter provas concretas para confirmar ou refutar essas afirmações.
É preciso separar os fatos da ficção para chegar à verdade
No entanto, é verdade que existem casos de indivíduos associados ao clube que foram investigados e condenados por envolvimento com organizações criminosas, incluindo o Primeiro Comando da Capital, como torcedores organizados e até mesmo alguns ex-jogadores.
Alguns casos que receberam ampla cobertura na mídia incluem a prisão de integrantes da torcida organizada Gaviões da Fiel em operações policiais contra o PCC, bem como acusações de que o ex-jogador corintiano Jorge Henrique teria ligações com o grupo criminoso.
No entanto, é importante ressaltar que tais casos não implicam que o clube Corinthians em si tenha algum envolvimento com atividades criminosas ou com o PCC.
PCC e favelas: tudo junto e misturado
As periferias de São Paulo são áreas historicamente marcadas pela pobreza, a desigualdade social e a violência, o nascedouro do time de futebol, e o berço da maioria daqueles que lotam as prisões paulistas.
O time de futebol Corinthians, foi fundado em 1910 no bairro do Bom Retiro, uma região com grande concentração de imigrantes e operários, populações marginalizadas naquele início de século.
Da mesma forma, a facção criminosa PCC 1533 teve origem nas prisões da capital paulista na década de 1990, onde muitos detentos eram oriundos das mesmas periferias que o time Corinthians Paulista.
O Primeiro Comando da Capital se fortaleceu a partir da união de presos que compartilhavam experiências de exclusão e marginalização social, assim como os torcedores do time, que encontravam no Corinthians uma identidade cultural e esportiva que os unia.
Dessa forma, pode-se entender que a associação entre o nome da facção PCC e o time Corinthians se dá principalmente pela origem e pela identidade social compartilhada pelas duas organizações.
Ambas têm suas raízes nas periferias da capital paulista, e seus membros compartilham uma experiência de exclusão e marginalização social que acaba se refletindo em suas respectivas culturas.
Separando o joio do trigo
Por isso é fundamental separar a conduta de indivíduos específicos da imagem e reputação do clube como um todo.
A grande maioria dos torcedores do Corinthians não tem envolvimento com o Primeiro Comando da Capital, e a associação entre os dois grupos é frequentemente exagerada pela mídia e por discursos preconceituosos.
No entanto, alguns estudos antropológicos têm se dedicado a investigar as relações entre torcidas organizadas de futebol e grupos criminosos.
Essas análises mostram que, em alguns casos, há uma sobreposição entre esses dois corpos sociais, com membros da torcida organizada também fazendo parte do grupo criminoso.
Essa sobreposição pode ser explicada por uma série de fatores, incluindo a cultura de lealdade e solidariedade presente em ambas as organizações, bem como a possibilidade de obter ganhos financeiros por meio do envolvimento em atividades criminosas.
Entre cobras e lagartos: o Corinthians Paulista e o Primeiro Comando da Capital
A relação entre torcidas organizadas e grupos criminosos é complexa e varia de acordo com cada contexto.
Nem todas as torcidas organizadas estão envolvidas com atividades criminosas, e nem todos os membros dessas organizações compartilham dos mesmos valores e práticas, no entanto, a maioria é oriunda da mesma fatia social.
Essa é a razão do preconceito das elites em relação a esses grupos sociais.
Uma série de fatores explicam esse prejulgamento, incluindo estereótipos negativos associados a torcedores de futebol e a grupos criminosos, bem como a visão elitista de que esses grupos representam uma ameaça à ordem social e aos valores civilizados.
Esta prenoção pode ser vista como uma forma de defesa psicológica utilizada por algumas pessoas, entre elas, Shimil Umesh, para preservar sua autoestima e senso de identidade.
Nesse sentido, a identificação de um grupo como “inferior” pode ser uma maneira de reforçar a crença na superioridade do próprio grupo e, consequentemente, proteger a autoimagem.
A imagem do Corinthians está vinculada à facção PCC
Além disso, a vinculação da imagem da facção PCC com o Corinthians pode ser vista como uma forma de estigmatização.
É uma forma de rotular indivíduos ou grupos com base em características estereotipadas ou negativas, contribuindo para a sua exclusão social e marginalização.
A psicologia social também pode contribuir para a compreensão da dinâmica entre grupos e a formação de identidades coletivas.
A identificação com um grupo pode ser uma fonte de apoio social e emocional, bem como de reconhecimento e pertencimento.
No entanto, quando essa identificação é baseada em estereótipos negativos e comportamentos prejudiciais, pode levar à discriminação e ao preconceito em relação a outros grupos.
A diversidade cultural, o Corinthians Paulista e o Primeiro Comando da Capital
Shimil Umesh, através de seu curto e sem dados comprobatórios, nos permitiu analisar como é importante desafiar estereótipos e preconceitos e promover o respeito às diferenças.
Isso pode envolver a conscientização dos indivíduos sobre seus próprios preconceitos e a valorização da diversidade cultural e social como fonte de enriquecimento e aprendizado.
É importante entender que o autor do texto, Shimil Umesh, não é uma ilha.
Ele é apenas mais um que nada no puro caldo do preconceito social que abunda em tempos onde a extrema-direita nada de braçada.
O autor faz uma análise raza sobre uma questão de grande complexidade e ambiguidade que é a relação entre a periferia, as torcidas organizadas e o PCC.
Nem teve Umesh a capacidade de imaginar as múltiplas perspectivas que existem dentro desses grupos e vislumbrar parte da dinâmica social envolvida.
Afora todas essas considerações, o autor da crítica também deixou de levar em consideração as relações entre esses grupos, Corinthians e facção PCC, e outras instituições sociais, como a polícia, a política, a mídia, e o sistema judicial.
O PCC como fruto de dinâmicas sociais e culturais
As relações entre o Corinthians Paulista e o Primeiro Comando Comando da Capital precisam analisar sob uma abordagem multidisciplinar e multifacetada.
Já o artigo no The Football Lovers não passou da soma de algumas palavras acusatórias cercadas de múltiplas imagens dos brasões dos clubes.
O sociólogo Gabriel Feltran que estuda as dinâmicas sociais e culturais nas periferias das grandes cidades, com foco especial na relação entre a juventude, a violência e as gangues, iria ainda mais longe do que eu, relacionando à esse fenômeno as estruturas políticas, socieis e econômicas do país.
Analisar a questão a partir de uma perspectiva histórica e sociológica mais ampla nos permitiria entender como a relação entre esses elementos se desenvolveu ao longo do tempo e como ela é moldada pelas estruturas que moldam a vida nas periferias.
Acusar o centenário Sport Club Corinthians Paulista sem considerar as dinâmicas internas, valores culturais e normas que governam suas torcidas organizadas e sua a administração do clube, não passa de preconceituoso amadorismo pretensioso.