Briga entre torcidas e a polícia
Dentro do vagão do metrô eu assistia a briga entre torcidas na plataforma da Linha Verde:
O som dos socos e insultos ecoavam pela composição calando a todos os passageiros.
Jovens de duas torcidas se enfrentavam em uma briga violenta.
Ambos os grupos pareciam decididos a vencer, trocando golpes com fúria e tentando derrubar o outro a todo custo.
Quando a polícia e os seguranças do metrô chegaram, aparentemente com a intenção de separá-los, a situação mudou.
Em vez de cessar o combate, os dois grupos se uniram em uma aliança estranha, voltando-se contra o recém-chegado com uma raiva ainda maior do que antes.
Agora, em vez de dois oponentes, os policiais enfrentavam um único grupo feroz, determinado e unido.
Dentro do vagão do metrô eu assistia a briga entre torcidas e agora assisto à pacificação de antigos inimigos e sua união contra o Estado e suas forças policiais.
Assim como foi no passado é no presente e será no futuro
É dessa forma que eu escreveria sobre esse mesmo tema:
PCC manda parar a briga entre torcidas organizadas
Os ditos “cidadãos de bem” não aprendem com os próprios erros.
Erram em 1991 quando deixavam os grupos rivais se matarem nas prisões e presídios. Extopim para o Massacre do Carandiru.
Erraram em 1993 quando aplaudiram as decapitações no Piranhão. Extopim para a criação do Primeiro Comando da Capital.
Erram hoje quando não percebem que o PCC não manda nas torcidas organizadas, as torcidas organizadas são o PCC.
Não é um juízo de valor, não é uma crítica, mas as torcidas organizadas são grupos de jovens na maioria periféricos que estão prontos a se revoltar contra a opressão do Estado e de suas forças policiais.
É isso que escrevi em 2012, só que com muito mais palavras. É isso que escrevo hoje:
Cidadãos de bem não aprendem com os próprios erros.
Artigo original publicado em 3 de abril de 2012:
Arthur Conan Doyle e a briga entre torcidas
Arthur Conan Doyle me alertou nos idos de 1993 sobre algo que estava me passando despercebido — ele me acusa de ser muito pouco observador.
Ao assistir pela TV presos jogando futebol com a cabeça de outros presos em um presídio do interior de São Paulo eu fiquei abismado!
Em 31 de agosto de 1993 no Piranhão (Casa de Custódia de Taubaté) jogadores do time “Partido do Crime da Capital — PCC” decapitaram os adversários…
… e foi assim, sem jogadores vivos, que o “Partido Caipira” foi eliminado do campeonato daquele ano e o Brasil nunca mais foi o mesmo.
Como quase todas as pessoas, fiquei revoltado com aquela loucura, mas Arthur que assistia ao meu lado não!
Ele ficou ali, sem falar nada como se nada tivesse acontecido.
Ele viu em 1933 o que eu só vejo hoje
Aceito que não é o gênio que eu acho que é, e sei que cometeu muitos erros, mas ainda acho que ele é um gênio.
Portanto, entenderei as restrições que você possa colocar, mas você não tem como negar que ele vê coisas antes das outras pessoas.
Naquela noite histórica de 31 de agosto de 1993, quando finalmente desliguei a televisão, Arthur simplesmente disse:
O mundo está cheio de coisas óbvias, que ninguém, em momento algum, observa! E aí está uma delas.
Eu não vi nada de oculto por trás do horror que é um jogo de futebol que termina em sangue! — Arthur às vezes fala merda.
relatos inéditos de integrantes das facções e contam essa história sob um ângulo inédito e revelador. Geridas de dentro dos presídios, as facções criminosas se profissionalizaram. Quem assumiu a dianteira desse processo foi o PCC, responsável por um grau inédito de organização nos presídios brasileiros. Criada em 1993
Juntando os pontos
Resolvi dar uma desculpa e ir embora, Arthur é que era a visita em minha casa e não parecia que iria embora tão cedo!
No entanto, passados anos, vejo que ele viu o que eu não vi.
Em dezembro de 2010 quando outra revolução política começou em uma briga de futebol e então vi o óbvio que Arthur viu em 1993.
A Primavera Árabe: regra, não foi exceção
Rodrigo Vianna lembra que as torcidas organizadas surgiram na América Latina nos anos 70 e se enraizaram na sociedade.
Esses grupos sociais são compostos na maioria por jovens na faixa dos 20 aos 30 anos de idade.
Meu amigo dizia que “ao eliminar o impossível, o que sobraria, por mais incrível que parecesse seria a verdade”, então, jogos de futebol tem um grande poder revolucionário.
Livro grátis de Rodrigo Viana no Kindle>Jovens, futebol, Piranhão e revolução
Geleião tinha 32 anos quando no dia do jogo no Piranhão. Marcola que não estava no jogo mas participou do movimento tinha 25 anos.
Pode se dizer que os fundadores do PCC foram os oito integrantes do time de futebol e todos jovens na faixa dos 20 aos 30:
- Misael Aparecido da Silva, o Misa;
- Wander Eduardo Ferreira, o Eduardo Cara Gorda;
- Antonio Carlos Roberto da Paixão, o Paixão;
- Isaías Moreira do Nascimento, o Isaías Esquisito;
- Ademar dos Santos, o Dafé;
- Antônio Carlos dos Santos, o Bicho Feio;
- César Augusto Roris da Silva, o Cesinha; e
- José Márcio Felício, o Geleião.
Todos, além de jovens, viviam isolados dentro do mundo que eles mesmos construíram por terem sido levados pela sociedade a criar.
Assim, foram os fundadores do Primeiro Comando da Capital, e assim é com os jovens das torcidas organizadas hoje.
PCC nascido do sangue no Piranhão
Faltou imaginação à mim quando houve o banho de sangue no Piranhão, ou eu teria visto o potencial de tudo o que estava começando.
Olhar apenas na superfície me impediu de ver que naquele momento nascia a maior organização criminosa da América Latina, mas Arthur viu.
A falta de imaginação nos transforma em bichos que apenas observam e agem, sem se questionar e perceber as consequências do que vemos ou fazemos.
Assim, em 1991, policiais militares de São Paulo com idade entre 20 e 30 anos mataram 111 no Carandiru, plantando as sementes da facção PCC.
Assim, em 1993, criminosos do Piranhão com idade entre 20 e 30 anos decapitaram um inimigo, regando com sangue as sementes da facção PCC.
Assim, em 2010, jovens egípcios com idade entre 20 e 30 anos se revoltam contra o sistema político opressor, iniciando a Primavera Árabe.
Assim, hoje ao proibir briga entre as torcidas organizadas a organização criminosa está plantando para o futuro.
Terríveis rebeliões periodicamente ocupam o noticiário nacional, com suas execuções bárbaras e rituais medievais, não é a eclosão eventual, mas que não ocorram todas as semanas. A chave desse enigma se encontra na pergunta: “De quem é o comando na prisão?”
O PCC, os jovens e seu espírito revolucionário
Lá assim como aqui as torcidas organizadas e as organizações criminosas tem em sua maioria jovens com até de vinte e cinco anos de idade.
Jovens de periferia que contestam a força repressora do Estado e sua polícia, que desprezam a corrupção política e a exclusão social.
Arthur não estava olhando para mim, sorte, pois detesto quando ele percebe que eu fico sem argumentos e não tenho como refutá-lo.
Sem dúvida, tanto o Primeiro Comando da Capital, quanto às torcidas organizadas tem o mesmo perfil: jovens entre 20 e 30 anos da periferia.
Segunda-feira, 15 de maio de 2006, foi um dia aterrador em São Paulo. Cidadãos, delegacias, penitenciárias, policiais, prefeitura e governo do Estado foram encurralados. Instalou-se um clima de pânico generalizado na capital paulista…
PCC e as torcidas organizadas
Haveria razão para que a maior organização criminosa da América Latina se infiltrasse nas torcidas?
Optei não mais conversar com Arthur a este respeito, pois sei que ele sempre diz que é um erro terrível teorizar antes de termos informação.
Principalmente por que o homem tem essa característica, a de se achar especialista em tudo, quando na realidade sua especialidade é apenas a omnisciência.
O tempo passou e agora devo novamente procurar Arthur e me desculpar, pois o respeitado jornalista Ricardo Perrone garantiu que o grupo criminoso PCC repreendeu a Gaviões da Fiel e a Mancha Verde pela morte dos dois palmeirenses, o que confirma a influência da facção sobre as organizadas.
“Cultura desviante e juventude: a torcida organizada como instrumento de domínio territorial”, com o foco na juventude e seus agrupamentos na formação de uma torcida organizada e de sua territorialização.
A pacificação do PCC nas ruas
Aqui em Itu, por muito tempo, a Avenida da Paz Universal esteve em paz graças a uma determinação dos traficantes ligados ao PCC para que não houvesse armas, brigas ou mortes, pois chamariam a atenção da polícia, criando situações de confronto que não interessavam aos negócios.
Ao falar hoje com meu amigo ele me explicou o último ponto de sua linha de raciocínio:
A razão. Ela não existe. Não existe razão para que o PCC influencie e domine as torcidas organizadas, mas ela existe pela própria natureza das duas culturas: a conta-cultura criminosa difundida pelas facções, e a cultura do futebol.
Ambas acéfalas, existem lideranças, mas sua base se move por vontade própria de modo pouco estruturado.
A tentativa das mídias sociais como a TV e o rádio de criar um clima familiar na torcida, é artificial.
Campos de futebol é o lugar onde milhares de cidadãos gritam “Filha da Puta Vai Se Fudê” e quebram as amarras sociais.
Torcida organizada: um universo em camadas sutis em que as retóricas torcedoras alcançam muitas direções, intenções e consequências.
A facção ainda não optou por usar a força que já possui:
O próximo levante da facção criminosa, ao contrário do que se espera, deverá ocorrer usando esta reserva poderosa e inesperada, não para derrubar o governo, mas para conquistar ainda mais espaço.
Veremos duas torcidas brigando e quando houver intervenção policial se unirem contra o inimigo comum: a polícia.
Ao chegar a este ponto, razões justas serão postas: a excessiva repressão policial, corrupção na política e no esporte, desigualdade social…
O governo negará que as facções criminosas determinaram o fim das brigas, mas por trás das câmeras lhes darão mais regalias.
Os policiais serão punidos como bodes expiatórios.
As mídias sociais, todas elas, faturam horrores com o caso, e a população ficará entretida por algum tempo.
joão porta @joao_viitor96E essa fita ai que o primeiro comando deu o papo de que é pra acabar com as brigas de torcida em SP? Se for verdade mesmo, rapaz..