João Pereira Coutinho me chamou a atenção para a ausência dos gatos nas casas e na vida dos integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC).
Segundo ele, “Freud explica”: mulheres não são atraídas por homens que cuidam de gatinhos:
A conclusão é que homens com gatos são menos masculinos.
Será que foi por isso que nunca vi algum irmão, companheiro ou aliado da facção PCC alisando ou contando sobre as peripécias de seus bichanos?
Sempre são cães — por aqui tenho quatro, e o menor deles não paga pau nem para o meu policial e nem para os outros maiores.
Mas quem é o Coutinho para opinar sobre a masculinidade dos integrantes da facção PCC 1533? Por isso procurei Oberdan.
Ele sim pode explicar sobre a relação entre a dicotomia felino/canino e o que isso tem haver com a masculinidade no Primeiro Comando da Capital.
Na facção PCC 1533 não há espaço para gatos
O mundo do crime se transforma com a chacina dos 111, em 1992, pela Polícia Militar de São Paulo e o nascimento do Primeiro Comando da Capital.
O sangue escorrido dos pavilhões une os dois lados das muralhas, que passam a agir como um só graças a essa ação do Estado e de suas forças policiais.
Camila de Lima Vedovello e Arlete Moysés Rodrigues+
Um novo contrato social é firmado nas comunidades periféricas baseado na cultura implantada pelo Primeiro Comando da Capital dentro dos presídios.
A conduta sexual e o comportamento em família alicerçam essa nova construção social de afetos aceitos, incorporados e rigidamente controlados.
Esse arranjo social nasce liberal na economia e conservadora nos costumes: nele homem é homem, como nos explica Camila Nunes Dias:
Oberdan, citando Zamboni, discorda parcialmente de Camila:
Camila afirma que a facção repudia homossexuais, já Oberdan afirma o contrário, e eu afirmo que ambos estão certos:
PCCs não aceitam homossexuais dentro da organização, mas não fazem restrições a eles na sociedade, havendo rígidas regras de convívio nas prisões: distanciamento, impedimento de uso do pátio e banheiro com outros presos, cabendo ao disciplina da tranca impor as regras para visitas (íntimas nem pensar).
O culto à masculinidade para combater a escravidão sexual
Oberdan me falou dos presídios com suas “relações complexas e um funcionamento social distinto aos padrões” e como isso influi na sexualidade.
O culto à masculinidade acabou se internalizando no comportamento de quem vive fora dos presídios e dentro da área de influência do PCC.
Se a sexualidade influi indiretamente em todos nós e em todos os momentos de nossa vida, no mundo do crime não seria diferente — para o bem e para o mal.

Esse culto à masculinidade com todos os seus atributos foi imposto pela facção para acabar com os crimes sexuais dentro dos cárceres, o que foi bom.

O abuso sexual, comumente perpetrado pelos presos mais fortes e violentos, também era explorado por agentes policiais e carcerários, o que era mau.
A libido reprimida do criminoso e os gatos
O comportamento esperado de integrantes da facção, seus aliados e familiares é ditado pelo conceito conservador dos papéis do homem e da mulher.
As mulheres da facção, sejam dos corres, da liderança, ou da família, agem e são tratadas e respeitadas como mulheres, mas cumprem um papel distinto ao dos homens — havendo exceções para confirmar a regra.
O homem do mundo do crime só será respeitado se for macho, masculino, sem “deslizes”, e se preciso terá que reprimir sua sexualidade (se esta fugir à heterossexualidade), mesmo vivendo em uma sociedade relativamente liberal como a brasileira.
Regimento Disciplinar do Primeiro Comando da Capital
Artigo 27: Homossexualismo é caracterizado quando mantém relação ou atos obscenos com pessoas do mesmo sexo — punição: exclusão sem retorno.
Freud avisa que há um custo psíquico em reprimir os desejos sexuais vivendo em uma sociedade permissiva como a brasileira:
Já Coutinho diz que, ao contrário dos cães, o gato é um perfeito avaliador da personalidade masculina, e por essa razão um gato não se submete a um macho alfa de libido reprimida — magoou a mim e aos meus quatro cães, até mesmo para o menor deles que não paga pau nem para o meu policial e nem para os outros maiores.