O PCC como fruto de uma intensa emoção
O Primeiro Comando da Capital é um filho nascido de um estupro coletivo praticado por policiais militares do estado de São Paulo.
Podia ver nos olhos daqueles policiais que estavam prestes a entrar no Carandiru as pupilas dilatadas por uma mistura de medo, excitação e ódio.
Podia sentir naqueles militares os tonéis de adrenalina sendo derramados no sangue que jorrava como cascata pelas veias – um prazer quase sexual:
Foi algo tão forte e tão excitante que por alguns segundos dessa forte emoção aqueles homens trocaram suas carreiras, a vida de 111 homens e a segurança de toda uma sociedade.
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Penetrando com violência – um estupro coletivo
Aqueles policiais agiram como quaisquer outros homens teriam agido na mesma situação – todos participaram, e nunca saberemos com certeza quem é o pai da criança:
O nascimento do PCC seria evitável até o momento no qual o diretor do presídio foi empurrado para o lado e os homens se enfiaram com violência para dentro da instituição.
A Casa de Custódia do Carandiru estava sendo invadida sob os olhares sedentos de prazer dos telespectadores que, de suas poltronas, acompanhavam o evento e repetiam com o Datena: “bandido bom é bandido morto”:
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Pesquisando o momento da concepção do PCC
A ereção e as emoções sentidas por aqueles homens que se enfiaram naquele emaranhado de corredores escuros e sujos baixou após algumas horas.
No entanto, os policiais, sem se darem conta, plantaram a semente do mal e regaram-na com o sangue de centenas de detentos e as lágrimas de milhares de seus amigos, mulheres e familiares.
Dez meses depois, há 134 km dali, na Casa de Custódia do Taubaté, o fruto daquele sêmen introduzido gerou o Primeiro Comando da Capital.
Os policiais militares negam que um deles seja o pai da criança, mas os pesquisadores de Ciências Sociais e Direitos Humanos Cezar Bueno de Lima, Danilo Augusto Gonçalves Carneiro e Deiler Raphael Souza de Lima afirmam que podem comprovar a paternidade.
Esse é o foco do artigo “O mundo é diferente da ponte para cá: uma análise da violação dos Direitos Humanos” publicado nos anais do II Simpósio Internacional Interdisciplinar em Ciências Sociais Aplicadas pelos pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
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União em torno da ética do crime
Os pesquisadores lembram que na certidão de nascimento do PCC, registrada em 1997 no Diário Oficial do Estado de São Paulo, consta:
“13. […] em 02 de outubro de 1992, onde 111 presos foram covardemente assassinados, massacre que jamais será esquecido […] por que nós do Comando vamos sacudir o Sistema e fazer essas autoridades mudar a prática carcerária, desumana, cheia de injustiça, opressão, torturas, massacres nas prisões.”
Até então existiam milhares de grupos de detentos agindo isoladamente em presídios, cadeias, abrigo de menores e clínicas de internação por todo o país, mas o Massacre do Carandiru teve o poder de integrar as diversas gangues.
Foi possível, então, implantar uma ética do crime dentro do sistema carcerário, algo que freasse os abusos sexuais, a violência física e a extorsão sofrida por outros encarcerados e por agentes públicos.
O mundo do crime se auto impunha a obrigação de seguir regras dos Direitos Humanos, reforçando ”o caráter de partido, não no sentido da representação democrática burguesa, mas no sentido da indústria de controle do crime”.
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Nossa desumanidade cria uma nova sociedade
Ao receber a notícia do Massacre do Carandiru:
- o pensamento de cada um dentro do governo era sobre como capitalizar os votos e diminuir o impacto negativo na imagem;
- o pensamento de cada um da imprensa era sobre agradar seu público e conseguir mais audiência sem comprometer sua imagem; e
- o pensamento de cada um das forças policiais que não estiveram presentes no evento, assim como boa parte do público, era de felicidade.
Liev Tolstói, em 1886, descreveu a morte de Ivan Ilitch, mais ou menos assim:
“[…] ao receber a notícia da morte de Ivan Ilitch, o primeiro pensamento de cada um dos presentes foi para as alterações e promoções que essa morte poderia provocar para eles ou seus conhecidos.”
Um século e meio se passou, e eu e você somos expectadores de um mundo que banaliza a vida e a morte. Somos parte integrante da desumanidade de uma sociedade frívola e cruel, construída por valores insensíveis.
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A criança cresce e se torna um mito
O estupro era evitável até o momento em que o diretor foi empurrado para o lado e os corredores escuros eram transformados em rios de sangue.
Nós, eu e você, assistimos ávidos de um prazer quase sexul a morte dos detentos do Carandiru, mas aquele estupro coletivo gerou um filho que agora nos cobra vingança.
Lamento ser eu a vir lhe dizer, mas o garoto não pode ser morto. Ele nasceu de um estupro e foi batizado em um rio de sangue.
O garoto cresceu, tornou-se uma ideia, um mito, e hoje vive na mente e no coração de milhões de brasileiros e de milhares de outros latino-americanos.
Os pais não assumiram a criança quando ela nasceu, e agora não podem controlá-la apesar de, uma vez por ano, desde 2002, alegarem que acabaram com sua cria maldita.
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Bom texto, ótimo para leitura reflexiva sobre história.
Valeu, é interessante como a mesma história pode ser lida de maneira tão diferente de acordo com o que cada um tem como sua verdade.