A ilusão hipnótica e a facção PCC 1533

A falácia de apontar o Primeiro Comando da Capital como peça fundamental no crime organizado na Região Norte do Brasil.

Arte sobre mapa amazônico e um quadro de hipnose

Alguém, por algum motivo, espalha aos quatro ventos que o Primeiro Comando da Capital (facção PCC 1533) domina o crime, aterroriza a política, a polícia e a população da região amazônica. Nada é menos real.

Quem ganha com esta desinformação?

Penso que as organizações criminosas que atuam na região se beneficiam com o uso dessa antiquíssima técnica: a ilusão hipnótica.

Chamando a atenção para um ponto de modo a ocultar outro, deixando-o fora do alcance da capacidade sensitiva e liberando-o de vencer as barreiras racionais daquele que deve sofrer o engodo, pois as áreas de seu cérebro que deveriam processar de maneira crítica a informação sobre um ponto acaba por desconsiderá-lo em detrimento de outro.

Essa técnica quando utilizada por uma pessoa se chama hipnose e pode fazer sumir uma moeda ou um mação e fazê-las aparecer em outro ponto. Essa técnica quando utilizada por um grupo se chama política e pode fazer sumir uma etnia ou uma floresta e fazê-las aparecer em outro ponto como dinheiro.

O ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles do governo Jair Bolsonaro descreveu essa técnica como “deixar passar a boiada”: enquanto incentivavam e mudavam a legislação para facilitar a exploração ilegal de madeira e minerais na região amazônica chamavam a atenção para a perigosa presença entre os índios yanomâmis do rei da Noruega Harold V ou dos integrantes da facção paulista Primeiro Comando da Capital.

Nem mesmo quando a Polícia Federal apreendeu com 77 Kg de ouro dos garimpos ilegais em terras indígenas o tenente-coronel Marcelo Tasso, o sargento Gildsmar Canuto (ambos da Casa Militar), e alguns soldados da Polícia Militar de São Paulo, poucos meses depois do presidente Jair Bolsonaro haver entregue aos militares paulistas o controle sobre as terras yanomâmis, a imprensa e das redes sociais parecem ter acordado do transe.

Não foram poucas as vezes ao longo da última década que acompanhei os altos e baixos da facção PCC 1533 nos estados do Norte do país, mas a facção nunca chegou a assumir o poder que lhe atribuíram sendo que no artigo “Abandonados, crias do 15 entram em extinção no Acre” faço um apanhado da precária situação dos paulistas por aquelas bandas.

A plataforma de ciência ambiental e conservação Mongabay, em 2021, elaborou um mapa delimitando as áreas de atuação de cada grupo criminoso. No entanto, o projeto de pesquisa denominado “Cartografia da Violência na Amazônia” foi elaborado com dados obtidos nos anos anteriores e refletem a derrocada e o racha da facção Família do Norte (FDN).

Após esse período, parte da facção FDN se consolidou como o Cartel do Norte, que inicialmente se aliou ao PCC e posteriormente tornou-se seu inimigo. O dinamismo das guerras entre as gangues no Norte transformaram o belíssimo trabalho de compilação de dados do projeto Mongabay em um registro de um passado.

No entanto, mesmo esse quadro publicado no artigo Organized crime drives violence and deforestation in the Amazon, study shows captou o efêmero momento no qual Primeiro Comando da Capital esteve em seu ápice, mas mesmo nele podemos notar a insignificância do PCC nessa geleia geral que é a divisão das pelo menos duas dezenas de grupos criminosos nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Rondônia, Roraima, e Tocantins.

Se em tese a Ilusão Hipnótica é a capacidade de usar fortes ilusões para alterar e controlar os comportamentos e ideias dos seus alvos, na prática é apontar para o poder do rei da Noruega ou da facção paulista para desviar a atenção dos grupos paramilitares e militares envolvidos com madeireiros e garimpeiros em terras indígenas.

Autor: Ricard Wagner Rizzi

O problema do mundo online, porém, é que aqui, assim como ninguém sabe que você é um cachorro, não dá para sacar se a pessoa do outro lado é do PCC. Na rede, quase nada do que parece, é. Uma senhorinha indefesa pode ser combatente de scammers; seu fã no Facebook pode ser um robô; e, como é o caso da página em questão, um aparente editor de site de facção pode se tratar de Rícard Wagner Rizzi... (site motherboard.vice.com)

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