Eu detestava números e sofria com eles até que o livro O Homem que Calculava caiu em minhas mãos, um office boy trabalhando no Edifício Winston Churchill, na Avenida Paulista em São Paulo. Malba Tahan mudou por um tempo a minha relação com os números.
Uma leitura viciante. Fiquei íntimo dos números e dos cálculos: bastava ver um prédio e rapidamente sabia quantas janelas ele tinha, assim como o número de rebites em um vagão do metrô ou o número aproximado de todos os rebites de todo o trem – aos meus olhos, tudo no mundo passou a ser mensurável.
Depois de um tempo, abandonei os números e os cálculos, mas agora eles voltaram para me assombrar. O professor Mariano Bartolomé, em seu trabalho La Criminalidad Organizada, un Severo Problema de Seguridad para el Hemisferio, demonstrou que os números e o poder do crime organizado superaram a minha capacidade de calcular e, talvez, até a de Beremiz Samir, o homem que calculava de Malba Tahan.
A Cocaína, que é comprada por 1 dólar por quilo na produção, é oferecida já dentro do território brasileiro próximo a Bolívia por 8.500 dólares, chega a granel na capital paulista por 12.000 dólares e é distribuído no atacado por 18.000 dólares e revendido para os donos das bocas entre 25.000 e 30.000. A cocaína chega no sul dos EUA por 15.000 dólares e nas capitais europeias por até 70.000 dólares, mas a Bartomé não esclarece se esse é o preço a granel ou entregue para o comerciante final, mas o Ministério Público de São Paulo afirma que o valor na Europa e África chega à 80.000 US$.
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Se a matemática dos preços é espantosa, as quantidades produzidas pelas organizações são ainda mais surpreendentes: pelos números divulgados pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (ONODC), podemos crer que hoje são produzidos anualmente mais de 1.000 toneladas de cocaína, oriundas de mais de 300 mil hectares de cultivo ilegal de coca.
Com essa matemática, as organizações criminosas, entre elas o Primeiro Comando da Capital, movimentam US$ 2 bilhões anuais, isto é, 3,5% de tudo que foi produzido no mundo, incluindo os bens e serviços – dados da ONODC; pior: enquanto o PIB mundial cresce 2,7%, a área de cultivo da coca aumenta entre 10% e 38% e a produção de cocaína a estratosféricos 50%.
E as drogas são apenas uma das diversas operações das facções criminosas. Segundo o relatório da Global Financial Integrity (GFI) apresentado em Davos, no Fórum Econômico Mundial (FEM), as operações econômicas ilegais geram mais de 1 trilhão de dólares, sendo 320 bilhões com as drogas ilegais, 250 bilhões com falsificação e contrabando, 31,5 bilhões com o tráfico de pessoas, e os outros 40% dividido nas outras atividades menores.
Abandonei os números, mas eles não me abandonaram e agora voltam para me assombrar. Graças ao professor Mariano Bartolomé, passo a desconfiar que Malba Tahan estivesse errado: nem tudo no mundo pode ser mensurado.