Parecia um sonho.
Era como se de fato aquilo não estivesse acontecendo com ele. As pessoas vinham lhe falar, dizer que estava tudo bem, perguntando como tudo tinha acontecido, e ele respondia, mas parecia que não era ele que estava naquele corpo.
Hoje o jornalista Josué Soares Dantas Filho se lembra de que no hospital alguém lhe disse: “Por enquanto é só, mas vai ter mais.” Ele não consegue se lembrar de quem foi essa pessoa, sua cabeça não estava funcionando direito, mas tem certeza que não foi a mesma pessoa que na noite anterior quando ele estava no Restaurante Tonilu jantando e rindo com os amigos passou pela mesa em que ele estava e disse: “Esse riso logo vai acabar”.
Dantas conta frente a frente com empresário do futebol Élio Aparecido de Oliveira que foi o mandante do atentado que matou o advogado Dr. Humberto da Silva Monteiro e quase o vitimou também, o que viu e sentiu naqueles momentos sangrentos:
Ele estava dirigindo sua caminhonete cabina dupla pela Rua Luiz Gazzola, passando ao lado da Fundição Gazzola em direção ao Centro quando uma moto passou fazendo aqueles estampidos parecidos com tiros pelo lado do passageiro. Incomodado pelo barulho, parou de falar seja lá o que estava falando e se virou para pedir ao Dr. Humberto para fechar a janela.
A partir daí tudo foi muito rápido e estranho. O tempo parece que começou a fluir de maneira diferente, e ele parecia estar vendo um filme. Ao olhar para o advogado este se virou para ele, mas não estava o fitando e pedaços de sua cabeça voaram em sua direção. Dantas acelerou e correu para o hospital que ficava a poucos quarteirões dali, falando o tempo todo: “Respira que Deus vai tirar a gente dessa”, “Humberto, fica calmo, tudo vai dar certo”…
Mas não deu, nem para o Dr. Humberto que morreu, nem para foi acusado e ameaçado por meses, e nem para os criminosos que foram presos e condenados ̶ no caso de Oliveira Júnior apenas condenado por em quanto.
Ao ficar claro que o mandante do assassinato foi Oliveira Júnior, Dantas viu o empresário debochando do amigo morto na TV em um programa que ele tinha pela TV Convenção de Itu. Não aguentando a raiva ligou para a emissora para falar com o Oliveira, mas quem atendeu foi a secretária do empresário, e nessa ocasião Dantas o ameaçou dizendo que o “sangue do Humberto não morreria em vão”, que se a justiça não fosse feita ele mesmo “mataria o Oliveira”, e que “o empresário é um vagabundo, um sacripanta, um ladrão que roubou Roberto Carlos e o Ituano Futebol Clube…”, mas o tempo passou e …
… o sangue baixou, a coragem arrefeceu. Danta acabou marcando um encontro com o empresário em São Paulo, e lá pediu perdão por qualquer coisa que tivesse dito ou feito, afirmando que esperava ser perdoado pois estava com medo, e pedia para que o político não mexesse com sua família.
Por várias vezes Dantas repetiu que Dr. Humberto disse a ele e a sua irmã que se algo lhe acontecesse era para informar a polícia que teria sido Oliveira Júnior, pois ele documentos que comprometeriam o empresário, e essa acusação influenciou de maneira decisiva a opinião dos jurados da comarca. Afinal, quando o próprio morto diz que será assassinado por alguém, bem, é algo realmente a se considerar.
Oliveira Júnior acabou sendo condenado à vinte anos de prisão, mas ainda vai recorrer em liberdade. Na plateia do Tribunal do Júri, assistindo a tudo com a mais santa e inocente face estava Brito.
Dantas não se conforma como Brito participou desse crime. Para quem não conhece Nicéias de Oliveira Brito, ele é um moreno baixinho sexagenário, uma pessoa amável, simples e de bom coração. Como alguém iria imaginar que aquele senhorzinho iria intermediar um assassinato com tamanho sangue frio? Mas Brito via naquilo apenas um trabalho. Ele mesmo declarou em depoimento que não tinha nada contra Dr. Humberto e Dantas, mas Oliveira lhe pediu para arranjar alguém para fazer o serviço e ele arranjou.
Simples assim, como se tudo na realidade não tivesse passado de um sonho ou de um filme que ele tivesse assistindo de sua tv, no aconchego do seu lar.